quinta-feira, fevereiro 05, 2009


Tieta do Agreste

Episódio nº 41



DA POLUIÇÃO E DOS OBJECTOS NÃO IDENTIFICADOS, CAPÍTULO MUITO INCREMENTADO OU A VISITA DO AREÓPAGO


Na porta da Agência dos Correios e Telégrafos, dona Carmosina estende as mãos em boas vindas:

- Entrem, meninas, estava esperando.

Comandante Dário levanta-se para cumprimentar as paulistas, logo volta à leitura da notícia da primeira página de A TARDE, comenta indignado:

- Não é possível que o governo vá permitir este absurdo. Os directores de uma fábrica igual a essa, igualzinha, para produzir dióxido de titânio, foram condenados à prisão, na Itália. O Juiz, um macho, meteu todos no xadrez.

- Fábrica de quê? Me explique, Comandante.

- Estou lendo na gazeta que acaba de ser constituída no Rio de Janeiro uma empresa para montar uma fábrica de dióxido de titânio no Brasil. Uma monstruosidade.

Por quê? Troque em miúdos.

- É a indústria mais poluidora que se conhece. Basta lhe dizer que só existem seis fábricas destas em todo o mundo. Nenhuma na América, nem do Norte, nem do Sul. Nenhum país quer essa desgraça em seus limites.

- É assim?

Dona Carmosina intervém:

- Traga o recorte do Estado para Tieta ler. O Estado de São Paulo, jornal de sua terra – ri da pilhéria – publicou um artigo contando que um juiz da Itália condenou os directores de uma fábrica dessas à cadeia por crime de poluição.

- Por crime de poluição? É o que precisa fazer em São Paulo: meter um bocado de gente no xadrez antes que a cidade acabe.

- O pior – acrescenta o Comandante – é que o jornal já adianta que as autoridades não vão permitir a instalação da fábrica no Sul do país. Querem situá-la no Nordeste. É sempre assim: o que é bom, fica no sul. Para o Norte sobra o refugo.

- É que em São Paulo, Comandante, a poluição já está de uma forma que ninguém suporta mais.

- Onde iremos parar? Felizmente, nosso pequeno paraíso privado, Agreste, está longe de tudo isso…

Leonora aproveita para o elogio:

- Mãezinha sempre me falava que aqui era bonito à Bessa mas não pensei que fosse tanto. É uma coisa!

- Você ainda não viu nada… - dona Carmosina se inflama – Agreste, em matéria de paisagem, não perde nem para a Suiça. Me fale depois de ir a Mangue Seco.

- Quando vão a Mangue Seco? Ficarão connosco na Toca da Sogra, eu e Laura fazemos questão – oferece o Comandante.

Muito obrigado. Aceito, até comprar terreno, levantar minha palhoça. Vai ser logo, logo – responde Tieta. – Tínhamos pensado ir nesse sábado, passar o Domingo. Mas Perpétua encomendou uma missa para Felipe e vai entronizar o sagrado coração de Jesus na sala.

- Tieta Trouxe um Sagrado Coração para Perpétua que é um colosso. Pode ser que na Baía tenha outro igual mas eu duvido – conta dona Carmosina.

- Verei hoje à noite, penso ir com Laura fazer nossa visita de boas vindas.

Quanto a Mangue Seco, a casinha está às ordens quando quiserem. Lá, todo o dia é dia de Domingo.

O grupo aumenta com a chegada de Aminthas e Seixas. Os olhos gulosos varam a transparência dos longos cafetãs das duas elegantes. Seixas só falta babar. Aminthas pergunta ao Comandante:

- Mestre Dário, que história é essa que está correndo por aí? Me disseram que apareceu um disco voador em Mangue Seco, todo mundo viu.

- Eu soube, os pescadores me contaram. Alguns garantem ter visto um objecto estranho e ruidoso sobrevoando a praia e o coqueiral. Pensei que fosse um avião mas eles juram que não, já viram passar muitos aviões, não iam se enganar.

- Devem ser os amigos de Barbozinha vindos do outro mundo para visitar nosso poeta. Ele diz que se comunica com todo o espaço, pela telepatia.

- Você brinca com o Barbozinha mas ele é sincero em tudo o que diz. Acredita piamente nessas coisas – atalha dona Carmosina.

- Um homem tão inteligente – lastima Seixas.

- Para mim, diverte-se Aminthas, o que os pescadores viram foi o reflexo de alguma lancha de contrabando… essa história de disco é pura tapeação.

- Não – contesta Dário, - Os pescadores não são tolos e por que haviam de querer me enganar? Estou farto de saber do contrabando e, quando acontece, é á noite. Alguma coisa eles viram ou ouviram. O quê, não sei, mas bem que podia ser um disco voador. Ou você não acredita na existência deles? Eu acredito. Não nos espíritos de Barbozinha mas em seres de outros problemas. Por que só na Terra há de se encontrar vida e civilização?

A pequena Araci chega correndo:

- Dona Antonieta, sinhá Perpétua mandou chamar vosmicê e a dona moça. Seu Modesto está lá com dona Aida, para visitar.

- Que pena, a prosa estava gostosa. Vamos, Leonora. Apareçam à noite. Até logo, Comandante. Carmô, não falte.

Descem o degrau do passeio, lá se vão rua afora. O sol poente ilumina as duas mulheres, lambe-lhes os corpos e os revela doirados e desnudos, como se a luz do crepúsculo houvesse dissolvido o vaporoso tecido dos cafetãs, fascinante moda importada das terras de sonho e fantasia onde nasceu Chalita.

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