Tieta do Agreste
EPISÓDIO Nº 127
DE COMO, PREMIDO PELAS CIRCUNSTÂNCIAS, O IMPOLUTO ASCÂNIO TRIDADE, APÓS SECRETA ENTREVISTA COM O MAGNÍFICO DOUTOR INICIA A PRÁTICA DA MENTIRA E, NA AURORA DOS NOVOS TEMPOS, ENTREGA-SE À SOBERBA, INCORRENDO DE UMA SÓ VEZ, EM DOIS PECADOS CAPITAIS
Ao término da conferência com o doutor Mirko Stefano, Ascânio Trindade sente-se outro homem. Uma hora de conversa bastara ao carismático relações-públicas para conquistar a confiança e a admiração do probo funcionário municipal. Probo e sonhador. O Magnífico exibira plantas e desenhos devidos a competentes e engenhosos arquitectos, engenheiros e urbanistas; citara números e fórmulas esotéricas; empregara termos mágicos: organograma, Know-how, insumos, mercado de trabalho, marketing, status – a prefeitura de Sant’Ana do Agreste terá status de município industrial. Ascânio deslumbrou-se.
Na porta do velho sobradão colonial, sede da municipalidade, despedindo o visitante, Ascânio Trindade assume nova condição, a de empresário. O termo é falso, correcto será dizer-se estadista. Administrador de comuna destinada a glorioso futuro de riqueza e progresso – futuro ou presente? Por ora apenas secretário da prefeitura com plenos poderes. Em breve, prefeito: os plenos poderes confirmados pelo voto do povo, unânime, segundo tudo indica.
Em determinado ponto da conversa pareceu-lhe perceber, nas discretas e sibilinas palavras do enviado da Directoria, insinuação suspeita, referência a pagamento de serviços prestados. Não entenderá bem mas, por via das dúvidas, foi logo esclarecendo que seu apoio ao grandioso projecto se devia exclusivamente aos superiores interesses do município e da pátria. Verdade cristalina: nenhum baixo sentimento, nenhuma pretensão pouco louvável na sua maneira de agir. Apenas o amor à terra natal, a seu desenvolvimento, fizera-o vibrar de entusiasmo durante a exposição do doutor Mirko Stefano, técnico, poliglota e convincente. Valia a pena ouvi-lo.
Conhecedor da natureza humana, hábil negociador, o Magnífico recuou. Sabia recuar, há tempo e ocasião para cada coisa. Por favor, caro Senhor Presidente, please, não me entenda mal. Referia-se a formas de pagamento da empresa ao município, directas e indirectas, considerando serviços remuneráveis a colaboração da prefeitura ao sucesso do projecto, ao conceder a necessária autorização para que num dos seus distritos, o de Mangue Seco, se instalasse o complexo industrial, duas grandes fábricas interligadas.
Além dos benefícios directos, arrecadação de consideráveis impostos, crescimento da renda bruta per capita, empregos para naturais do lugar, a empresa tomaria a seu cargo providenciar melhoramentos necessários e urgentes: asfaltamento da estrada, por exemplo. A empresa pressionará o Governo do Estado, o Ministério competente, se necessário, não falta prestígio aos Directores, digo-lhe em confiança, Senhor Prefeito. Construção de hotel, estabelecimento de linha de ônibus, serviço de lanchas no rio. Sem falar na área de Mangue Seco, onde se ergueriam as fábricas dando nascimento à moderna cidade operária, dezenas de residências destinadas aos trabalhadores, técnicos e funcionários. Para todo esse mundo de progresso a empresa concorrerá, graciosamente. Antes de visar lucros, os dignos Directores desejam contribuir para a construção de um Brasil poderoso, à altura da sua gloriosa missão no mundo. E viva!
Ao término da conferência com o doutor Mirko Stefano, Ascânio Trindade sente-se outro homem. Uma hora de conversa bastara ao carismático relações-públicas para conquistar a confiança e a admiração do probo funcionário municipal. Probo e sonhador. O Magnífico exibira plantas e desenhos devidos a competentes e engenhosos arquitectos, engenheiros e urbanistas; citara números e fórmulas esotéricas; empregara termos mágicos: organograma, Know-how, insumos, mercado de trabalho, marketing, status – a prefeitura de Sant’Ana do Agreste terá status de município industrial. Ascânio deslumbrou-se.
Na porta do velho sobradão colonial, sede da municipalidade, despedindo o visitante, Ascânio Trindade assume nova condição, a de empresário. O termo é falso, correcto será dizer-se estadista. Administrador de comuna destinada a glorioso futuro de riqueza e progresso – futuro ou presente? Por ora apenas secretário da prefeitura com plenos poderes. Em breve, prefeito: os plenos poderes confirmados pelo voto do povo, unânime, segundo tudo indica.
Em determinado ponto da conversa pareceu-lhe perceber, nas discretas e sibilinas palavras do enviado da Directoria, insinuação suspeita, referência a pagamento de serviços prestados. Não entenderá bem mas, por via das dúvidas, foi logo esclarecendo que seu apoio ao grandioso projecto se devia exclusivamente aos superiores interesses do município e da pátria. Verdade cristalina: nenhum baixo sentimento, nenhuma pretensão pouco louvável na sua maneira de agir. Apenas o amor à terra natal, a seu desenvolvimento, fizera-o vibrar de entusiasmo durante a exposição do doutor Mirko Stefano, técnico, poliglota e convincente. Valia a pena ouvi-lo.
Conhecedor da natureza humana, hábil negociador, o Magnífico recuou. Sabia recuar, há tempo e ocasião para cada coisa. Por favor, caro Senhor Presidente, please, não me entenda mal. Referia-se a formas de pagamento da empresa ao município, directas e indirectas, considerando serviços remuneráveis a colaboração da prefeitura ao sucesso do projecto, ao conceder a necessária autorização para que num dos seus distritos, o de Mangue Seco, se instalasse o complexo industrial, duas grandes fábricas interligadas.
Além dos benefícios directos, arrecadação de consideráveis impostos, crescimento da renda bruta per capita, empregos para naturais do lugar, a empresa tomaria a seu cargo providenciar melhoramentos necessários e urgentes: asfaltamento da estrada, por exemplo. A empresa pressionará o Governo do Estado, o Ministério competente, se necessário, não falta prestígio aos Directores, digo-lhe em confiança, Senhor Prefeito. Construção de hotel, estabelecimento de linha de ônibus, serviço de lanchas no rio. Sem falar na área de Mangue Seco, onde se ergueriam as fábricas dando nascimento à moderna cidade operária, dezenas de residências destinadas aos trabalhadores, técnicos e funcionários. Para todo esse mundo de progresso a empresa concorrerá, graciosamente. Antes de visar lucros, os dignos Directores desejam contribuir para a construção de um Brasil poderoso, à altura da sua gloriosa missão no mundo. E viva!
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