quinta-feira, maio 21, 2009


Tieta do Agreste


EPISÓDIO Nº 138







Para a declaração, Ascânio espera contar com a boa vontade da madrasta, de coração abrandado pelas homenagens que lhe serão prestadas nas festas. Um dos itens do projecto elaborado por Ascânio manda baptizar com o nome da filha pródiga a via da entrada da cidade pela qual chega e parte a marinete de Jairo e por onde ingressarão igualmente os fios do progresso, a Luz de Tieta, na consagração do povo. Denominado Caminho da Lama, desde tempo imemoráveis, será rua dona Antonieta Esteves Cantarelli (cidadã benemérita).

A placa já encomendada na Bahia, antes mesmo dos vereadores tomarem conhecimento do plano: existirá alguém tão ingrato a ponto de opor-se? Desta vez, Ascânio não esqueceu o Esteves, exigido por dona Perpétua e pelo Velho, insolente e cheio de si. Mas o dinheiro para o banquete, o baile, a música, as bandeirolas nas ruas, as faixas, os fogos? Para as pedras do calçamento? Quem poderia ajudar o financiamento da festa, concorrendo com os gastos, se por ali aparecesse, seria o doutor Mirko Stefano, empresário interessado em erguer uma grande indústria nas imediações de Mangue Seco, representante legítimo do progresso. Após a conferência expôs planos e exibiu plantas, o ilustre paredro ficara de voltar em breves dias. A esperança de Ascânio reside naquela empolgante figura: para o doutor Mirko nada parece difícil, lembra um génio das histórias de mil e uma noites, saído da lâmpada de Aladim. Ah! se ele se manifestasse de repente…

E eis que de repente ele se manifesta, génio risonho e todo -poderoso, baixando dos céus em companhia de papai Noel. A imponente nave sobrevoa a Prefeitura, a Matiz, o jardim: visão alucinante, espantoso barulho, até então desconhecidos aos olhos e ouvidos tacanhos do povo do Agreste.

Sol forte e brisa amena, vinda do mar atlântico, um dia aprazível, típico do verão sertanejo. A cidade parece adormecida quando, pelo meio da manhã, o ruído surge e cresce, insólito, e Peto atravessa a rua, os olhos postos no alto, reconhecendo e proclamando o helicóptero, máquina nunca enxergada antes em Agreste mas numerosas vezes admirada por Peto nas revistas que dona Carmosina lhe permite folhear na Agência dos Correios. Comerciantes aparecem nas portas das lojas. No bar deserto, seu Manuel suspende a desagradável tarefa da lavagem dos copos, espia e exclama: que os pariu! Ascânio surpreendido pelo barulho assustador, abandona papel, lápis e devaneio, chega à janela e assiste ao pouso do aparelho no centro da praça, entre a Prefeitura e a Matriz. Padre Mariano acolitado por beatas que se benzem apavoradas, mostra-se no alto da escada que conduz ao adro.

Do helicóptero, cujos motores continuam a trabalhar, as hélices rodando lentamente para admiração dos primeiros curiosos abobados, desembarcam o Magnífico Doutor, desportivamente vestido de calça jean e colorida camisa da praia do Havai, com mulheres sensuais e flores exóticas, e o próprio Papai Noel, o mais belo de quantos existiram pois quem porta as barbas brancas e enverga roupa vermelha não é outra senão a figura eficiente, executiva e excitante da nossa conhecida e apreciada Elizabeth Valadares, Bety para os colegas, bebé para os íntimos. Uma secretária realmente competente é para toda a obra e em vésperas de Natal se transforma, se necessário, em Papai Noel, sob a direcção do inventivo génio da lâmpada de titânio, o Magnífico Doutor.

Ascânio, ao enxergar o helicóptero, Papai Noel e o doutor Mirko indicando ao embasbacado Leôncio a carga no interior do aparelho, não contem um grito de entusiasmo, um sonoro viva! O Magnífico Doutor suspende a vista, acena com as mãos para o Secretário da Prefeitura.

Fiz questão de trazer pessoalmente os brindes de Natal para as crianças pobres – explica o mago, apertando calorosamente as mãos de Ascânio que desceu a
escada de quatro em quatro para
receber e saudar os visitantes.

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