terça-feira, setembro 01, 2009


TIETA DO AGRESTE
EPISÒDIO Nº 221





Um dia terrível. O aeroporto de São Paulo fechado, o avião só pôde sair depois das nove, ou seja na hora em que devia estar pousando aqui. Venha comigo.

Enquanto andava, o Magnífico Doutor ia apertando mãos, acenando com os dedos, dizendo uma palavra a esse e àquele. Ao chegarem à borda da piscina, três indivíduos os acompanhavam. Um deles, cego de um olho, perguntou, num sussurro de conspirador:

- Quem chegou?

- Doutor Bardi.

- Sozinho? E os outros, quem são? Vi um grupo na recepção.

Mentira, pois os viajantes não haviam parado na recepção, entraram directamente no elevador, Ascânio os acompanhara com os olhos desde a descida do automóvel. O Magnífico Doutor sorriu para o bisbilhoteiro, passou-lhe a mão no rosto, de leve, num gesto quase feminino:

- Indiscretozinho…

Todas as moças – pelo menos um certo número – em mergulhos ou exposta ao sol eram propriedade do Magnífico Doutor (ou da Brastânio, ninguém pode ser tão poderoso a ponto de possuir tão variada colecção de vedetas; uma grande empresa, talvez). Precipitaram-se para a mesa que ele ocupou. Os três aderentes contemplaram Ascânio, curiosos, à espera quem sabe de apresentação ou notícia, mas como o Doutor Mirko esqueceu ou fez-se de esquecido, logo se entregaram a tarefas bem mais agradáveis: uísque e garotas. Bebiam com valentia, namoravam com rudeza, modos grosseiros, descorteses, na opinião de Ascânio. Jornalistas, os três, soube depois pelo próprio Magnífico. Mas as moças pareciam gostar dos palavrões e das propostas realistas.

Durou pouco o encontro, o doutor levantou-se, ocupadíssimo, deixando com os três vorazes a nova garrafa quase cheia e o mulherio.

- Amanhã ou depois terei notícias para vocês. Antes, nem uma palavra. Ninguém chegou, reina a paz na City e em Wall Street.

- E se A Tarde der o furo? – reclama o zarolho.

- Melhor, assim vocês terão notícia e desmentido.

Tomou Ascânio pelo braço, arrastando-o consigo até aos elevadores. Obedecendo a um gesto seu, uma das moças os acompanhou.

- Hoje estarei reunido a tarde toda. A você posso dizer: reunião decisiva da directoria. Somente no fim da tarde, antes do jantar, poderei lhe ver e lhe falar. Mas vou-lhe deixar em boas mãos. Patrícia vai ficar às suas ordens, vai lhe servir de secretária e de chofer. Passei, divirta-se. Antes do jantar conversaremos – Da porta do elevador, dirigiu-se à moça: - Cuide dele, Pat, com carinho. Um dia você se orgulhará de tê-lo acompanhado, de ter sido sua cicerone.

Patrícia sorriu e tomou posse de Ascânio:

- Almoçaremos aqui no hotel ou quer ir a um restaurante? Vou enfiar o cafetã, volto num segundo.

Patrícia também era loura mas não se parecia com Leonora. O verso do trigal maduro não se aplica aos seus cabelos, Barbozinha não a compararia a uma síflide. Bonita, sim, porém não aquela formosura única, incomparável, aquela distinção a denotar classe e família, filha de pai milionário e comendador do Papa, nascida em berço de ouro, educada nos melhores colégios, flor da alta sociedade paulista. Elegância e finura reveladas não apenas no bom gosto dos trajes mas em cada gesto, na delicadeza, no recato, na graça infinita. Na boniteza chamativa de Patrícia há um quê de vulgaridade e em sua inegável gentileza
transparece vestígio de serviço prestado, um toque
profissional.

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