DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
EPISÓDIO Nº 105
Caiu o aniversário de dona Flor em semana de tanta pompa e fortuna, Vadinho bem forrado, a ponto de exibir e cumprir louvável intenção de fornecer algum numerário para as despesas da casa, acontecimento fausto e raro.
Dona Laura persistia em saber, ranheta:
- O que é que você vai oferecer à sua mulher?
Vadinho sorriu para a vizinha dando-lhe o troco:
- O que vou dar a Flor? Pois vou dar o que ela me pedir, seja lá o que for… o que ela quiser…
Dona Norma foi em busca da aniversariante: “minha filha, escolha o que quiser”; dona Flor veio da cozinha enxugando as mãos no avental:
- É de verdade, Vadinho, que você me dá o que eu quiser? Você não está mangando comigo?
- Pode dizer…
- Não vai dar para trás? Posso pedir?
- Quando eu prometo, você sabe que cumpro, meu bem…
- Pois o presente que eu quero é ir jantar no Pálace com você.
Dizia quase a tremer, pois ele jamais a admitira misturada àquele seu mundo, e, de toda a gente do jogo, ela só tinha relações de amizade com Mirandão, seu compadre, único a frequentar-lhe a casa amiúde. Alguns ela conhecia de tê-los visto uma vez ou outra, dos demais apenas ouvira os nomes rebarbativos. Mesmo Anacreon, tão da estima de Vadinho, aparecera no máximo umas cinco ou seis vezes naqueles sete anos e quanto a Arigof viera apenas um domingo filar o almoço. O mundo de dona Flor era o da rua, o do bairro, o de suas alunas e ex-alunas, estendendo-se pelo Rio Vermelho, pela Ladeira do Alvo, por Brotas, relações com gente bem, nada tinha a ver com a vida irregular do marido. Vadinho não admitiu jamais dona Flor nas suspeitas plagas do jogo, naquelas terras da roleta e dos dados, esposa era para o lar, que diabo viria fazer em tais ambientes?
- De malfadado basta e sobra comigo. Tu não é para esse meio.
Não adiantava ela argumentar com o facto notório de ser o Pálace hotel um centro elegante, local de encontro da mais alta sociedade. Cear em seu aparatoso salão, dançando ao ritmo da melhor orquestra do Estado; assistir à exibição de astros da rádio e do teatro, procedentes do rio e de São Paulo, era programa de muito bom tom. Ali as senhoras da Barra e da Graça exibiam os últimos modelos e algumas delas, as mais evoluídas, num requinte de desenvoltura, arriscavam fichas na roleta. A sala de jogo era como uma continuação do salão da dança: larga passagem em arco estabelecia inexistente e ruinosa fronteira.
Por que tão obstinada recusa? Por que, Vadinho? Dona Flor ia do rogo à exigência, das súplicas às broncas:
- Você não me leva para eu não descobrir suas raparigas…
- Não quero lhe ver nesses lugares…
Dona Norma não fora ao Pálace, por mais de uma vez, com seu Sampaio, quando de alguma atracção sensacional? Os argentinos da cerâmica, esses não faltavam um único sábado, apesar de Bernabó ser inimigo de qualquer espécie de jogo. Iam comer, dançar, aplaudir os artistas.
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
EPISÓDIO Nº 105
Caiu o aniversário de dona Flor em semana de tanta pompa e fortuna, Vadinho bem forrado, a ponto de exibir e cumprir louvável intenção de fornecer algum numerário para as despesas da casa, acontecimento fausto e raro.
Dona Laura persistia em saber, ranheta:
- O que é que você vai oferecer à sua mulher?
Vadinho sorriu para a vizinha dando-lhe o troco:
- O que vou dar a Flor? Pois vou dar o que ela me pedir, seja lá o que for… o que ela quiser…
Dona Norma foi em busca da aniversariante: “minha filha, escolha o que quiser”; dona Flor veio da cozinha enxugando as mãos no avental:
- É de verdade, Vadinho, que você me dá o que eu quiser? Você não está mangando comigo?
- Pode dizer…
- Não vai dar para trás? Posso pedir?
- Quando eu prometo, você sabe que cumpro, meu bem…
- Pois o presente que eu quero é ir jantar no Pálace com você.
Dizia quase a tremer, pois ele jamais a admitira misturada àquele seu mundo, e, de toda a gente do jogo, ela só tinha relações de amizade com Mirandão, seu compadre, único a frequentar-lhe a casa amiúde. Alguns ela conhecia de tê-los visto uma vez ou outra, dos demais apenas ouvira os nomes rebarbativos. Mesmo Anacreon, tão da estima de Vadinho, aparecera no máximo umas cinco ou seis vezes naqueles sete anos e quanto a Arigof viera apenas um domingo filar o almoço. O mundo de dona Flor era o da rua, o do bairro, o de suas alunas e ex-alunas, estendendo-se pelo Rio Vermelho, pela Ladeira do Alvo, por Brotas, relações com gente bem, nada tinha a ver com a vida irregular do marido. Vadinho não admitiu jamais dona Flor nas suspeitas plagas do jogo, naquelas terras da roleta e dos dados, esposa era para o lar, que diabo viria fazer em tais ambientes?
- De malfadado basta e sobra comigo. Tu não é para esse meio.
Não adiantava ela argumentar com o facto notório de ser o Pálace hotel um centro elegante, local de encontro da mais alta sociedade. Cear em seu aparatoso salão, dançando ao ritmo da melhor orquestra do Estado; assistir à exibição de astros da rádio e do teatro, procedentes do rio e de São Paulo, era programa de muito bom tom. Ali as senhoras da Barra e da Graça exibiam os últimos modelos e algumas delas, as mais evoluídas, num requinte de desenvoltura, arriscavam fichas na roleta. A sala de jogo era como uma continuação do salão da dança: larga passagem em arco estabelecia inexistente e ruinosa fronteira.
Por que tão obstinada recusa? Por que, Vadinho? Dona Flor ia do rogo à exigência, das súplicas às broncas:
- Você não me leva para eu não descobrir suas raparigas…
- Não quero lhe ver nesses lugares…
Dona Norma não fora ao Pálace, por mais de uma vez, com seu Sampaio, quando de alguma atracção sensacional? Os argentinos da cerâmica, esses não faltavam um único sábado, apesar de Bernabó ser inimigo de qualquer espécie de jogo. Iam comer, dançar, aplaudir os artistas.
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