sábado, maio 21, 2011

TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA


Episódio Nº 106





- Não é servido de almoçar com a gente, não quer comer comida de pobre? – Teodora se requebra na porta, se oferece inteira.

Em outra ocasião aceitará honrado e guloso, hoje os pais o esperam e já está atrasado; fica o trivial para outro dia, Teodora, mais tarde, noutras férias, quem sabe? Hoje vou provar manjar divino, maná do céu; adeus, direi ao capitão que te reconheci donzela e, por medo das consequências, respeitei o teu cabaço, mas o cabaço somente e mais nada, o resto comendo um regabofe de coxas, de seios de bunda.

Vazias as janelas do chalé, deserta a rua, da esquina regressa Daniel para o armazém. Tereza ao vê-lo entrar, ficou imóvel, sem voz, incapaz de palavras e gestos; nunca se sentira assim, o coração desregulado – não é medo nem repulsa, o que pode ser? Tereza não sabe.

Não trocaram uma única palavra. Ele a prendeu nos braços, encostando a face cálida na fria face de Tereza; o hálito do moço era perfume, perfume de tontear. No cabelo, na pele, nas mãos, na boca semi-aberta. O capitão fede a suor ardido, bafo de cachaça – homem macho não usa cheiro.

Sem dela se afastar, Daniel levou as duas mãos ao rosto de Tereza, emoldurando-o nos dedos, e a fitá-la nos olhos veio com a boca semi-aberta e tomou de sua boca. Por que Tereza não desvia a cabeça se tem horror a beijos, nojo da boca do capitão sobre a sua, a sugar, a morder? Maior que o nojo era o medo; então por que consente, não vira a cara, não o manda embora?

A boca de Dan, os lábios, a língua, longa, suave carícia, a boca de Tereza foi-se entregando. De repente, dentro de seu peito alguma coisa explodiu e os olhos, presos aos olhos celestes do anjo, humedeceram-se – pode-se chorar por outros motivos que não sejam dor de pancada, ódio impotente, medo incontido? Além dessas, existem outras coisas na vida? Não saberia dizer, só tinha comido da banda podre; peste, fome e guerra, a vida de Tereza Batista.

Distantes ruídos de pratos e talheres de flandres, Tereza estremece. Soltam-se do abraço e do beijo. Dan ainda pousa os lábios nos olhos molhados – evola-se na rua varrida de chuva.

Nos aguaceiros do Inverno germinam sementes, os brotos irrompem e na terra agreste, seca e bravia, explodem frutos e flores.

Quando o caixeiro Pompeu entrou no armazém, logo seguido por Papa-Moscas, Tereza continuava no mesmo lugar, parada, esquecida, fora do mundo, tão diferente e esquisita que, naquela noite de chuva, um e outro, no leito de ferro, no catre de tábuas, traindo a predilecta Teodora, no segredo mais fundo, possuíram Tereza na palma da mão. (clik na imagem )

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