terça-feira, junho 28, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA






Episódio Nº 138



Se bem que não contasse tornar a ver Januário Gereba, mestre de saveiro a quem encontrara outrora no porto de Aracaju e em cujo calor renascera seu morto coração, amor sem esperança, punhal fincado no peito, Tereza Batista guarda-lhe uma espécie de singular fidelidade, não se comprometendo em ligação ou xodó que ameace assumir carácter definitivo. Louca de hospício certamente, veneranda, mas livre para embarcar se for o caso.

G

Gracejando, Oto Espinheira a convidara a salvá-lo de noivado e casamento inevitáveis se fosse sozinho para o interior, alvo da cobiça das matronas à cata de genro – nada lhe prometendo entretanto para além de férias tranquilas.

De volta marcada para Buquim, ouvindo-a dizer estar cansada de cidades grandes, propôs-lhe vir com ele numa temporada de repouso: Buquim é a calma perfeita, a paz absoluta, nada acontece por lá, a não ser a passagem diária dos trens, um para a Bahia, um para Aracaju e Propriá.

Assim, tão bem servido de mulher, não correria perigo de se meter com moça casadoira na cidade morronhenta, vendo-se inesperadamente noivo – os médicos são cotadíssimos no escasso mercado do casamento – ou de frequentar rameiras doentes; de acabar entre o juiz e o padre ou entrevado com uma carga de sífilis. Na boniteza do rosto moreno, no palavreado fútil e agradável, o médico recordava Dan, o primeiro a quem Tereza amara e se entregara por completo; sem contudo com ele se parecer, sendo Daniel podre por dentro, cagão sem rival, mentiroso, falso como a pedra do anel em troca do qual tia Filipa a vendera ao capitão. A lembrança deprimente fizera Tereza vacilar ao receber o convite. Tirando o falatório e a fachada, porém, Oto Espinheira, natureza alegre, atitudes francas, de pouca promessa, era o contrário, o avesso de Dan; Tereza terminou por aceitar.

Pusilânime e hipócrita, Dan fizera-se passar por bom e corajoso, por honesto e correcto, jurando-lhe amor eterno, prometendo levá-la consigo para a Bahia, libertando-a da escravidão da palmatória e da taca de couro cru, em verdade pronto para largá-la no alvéu, sem ao menos se despedir. De tudo ela soubera na cadeia, não faltou quem lhe contasse a contar por Gabi. E a leitura do depoimento de Dan, não a ouvira Tereza? Incrível arrazoado, acusando-a de fio a pavio, afirmando ter sido ela, viciosa marafona, quem o arrastara para o quarto do capitão a pretexto de resguardá-lo da chuva e lá se abrira a devassa; não sendo Daniel de ferro, acontecera o inevitável, tendo a cínica lhe jurado não existir há mais de um ano qualquer tipo de relação sexual entre ela e o capitão, não passando de criada de casa, nada além disso; se a soubesse ainda amásia de Justiniano, teria repelido a insistente oferta por ser ele, Daniel, amigo do capitão e respeitador do lar e da propriedade alheia. Vivera Tereza Batista um mau pedaço naquela época; mas o pior de tudo por quanto passou em tão atroz período foi ouvir a leitura do depoimento de Dan; só conhecera até então gente ruim, Daniel superou a todos, mais asqueroso, talvez, que o próprio capitão.

Por isso, na cadeia, Tereza virara um bicho, metida num canto do cubículo, trancada em si mesma, sem confiar em ninguém. Quando Lulu Santos apareceu, mandado de Sergipe pelo doutor, ela não quisera prosa, acreditando ser o rábula mais um igual aos outros, quem presta nesse mundo de dor e de covardia? Haviam-se reunido três cabras fardados, um cabo e dois soldados da Polícia Militar, para quebrá-la no pau, apenas a tomaram presa. Nem mesmo tendo-o provisionado conseguido tirá-la do xadrez, internando-a num convento, deixando-a entregue às freiras dispostas a regenerá-la – regenerá-la de quê? – ainda assim continuara Tereza a duvidar das intenções de Lulu, tanto que fugiu sem aguardar as outras providências por ele prometidas; ademais o rábula, por discrição, não pronunciara o nome do doutor. (clik na imagem e aumente)

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