TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 146
O velho médico dirige-se ao jovem director do posto de saúde:
- O melhor é o caro colega vir comigo. Se for mais um caso de varíola, estarão constatados o surto epidémico e o primeiro óbito.
Mais um cigarro, a testa banhada de suor, a boca sem palavras, doutor Oto concorda com um gesto de cabeça, que fazer senão ir? Também a enfermeira Juraci dispõe-se a acompanhá-los, não há força capaz de mantê-la ali, na sala infectada por aquele homem horrível, de bexiga exposta no rosto. Se ela, Juraci, morrer na colheita da peste, o culpado é o director da Saúde Pública do Estado, saibam todos: perseguindo-a por mesquinhos motivos políticos, enviando-a ao desterro em Buquim por sabê-la oposicionista e donzela, não tolerando Sua Senhoria nenhuma das duas espécies.
Antes de sair, diante da total abstenção do colega, doutor Evaldo recomenda a Maxi fornecer a Zacarias solução de permanganato de para passar no corpo e comprimidos de aspirina para a febre. Quanto a você, rapaz, volte para casa, aplique o permanganato, envolva-se em folhas de bananeira, evite a claridade, deite-se e espere.
Esperar o quê, doutor? Um milagre do céu ou a morte, que mais pode ser?
N
No rumor do choro surdo da mulher de cabeça encanecida, Aurinha Pinto, depositada em cima da mesa na sala vazia de outros móveis e parentes, dorme o celebrado sono derradeiro: embarcou no primeiro sopro de febre, sem esperar o resto, nem assim descansa a maltratada carcaça.
Silenciosos, doutor Evaldo, o doutorzinho do posto de saúde e a enfermeira Juraci contemplam o cadáver da anciã.
Morreu de bexiga, é epidemia… – declara num sussurro doutor Evaldo e de nada lhe valem idade e experiência: estremece e fecha os olhos para não ver.
Nem morrendo em seguida obteve Aurinha Pinto repouso para o fatigado corpo; prossegue vivo na doença, se acabando devagar; as brotoejas crescem em bolhas, as bolhas em pústulas, a pele sobe e desce, borbulhando, papocando, abrindo-se em óleo negro e fétido, bexiga imunda e infame, defunto sem paz.
A enfermeira Juraci, de delicado estômago, vomita na sala.
O
Onde estão elas, seu Maximiano Silva das Negras, onde as guardaram tão bem guardadas que, sendo eu director do posto e responsável pela saúde da população do município, ainda não consegui por os olhos em cima dessas benditas vacinas de repente tão necessárias?
Por que não as procurei antes? Quando admiti assumir tal cargo me garantiram possuir Buquim clima privilegiado, condições ideais para descanso e perfeitas de saúde pública, eleitores à Beça dando sopa; juraram ser Buquim o paraíso, o éden perdido no sertão, a paz enfim. Fantasma de um passado sórdido, espanto dos antigos, assombração macabra, varrida pelo progresso, para sempre erradicada a bexiga; não só ela, qualquer outra epidemia, viva o nosso paternal governo!
Me enganaram, ai, me enganaram. Cadê as vacinas, seu Maxi, temos de aplicá-las imediatamente, enquanto há tempo e povo. (clik na imagem e aumente)
- O melhor é o caro colega vir comigo. Se for mais um caso de varíola, estarão constatados o surto epidémico e o primeiro óbito.
Mais um cigarro, a testa banhada de suor, a boca sem palavras, doutor Oto concorda com um gesto de cabeça, que fazer senão ir? Também a enfermeira Juraci dispõe-se a acompanhá-los, não há força capaz de mantê-la ali, na sala infectada por aquele homem horrível, de bexiga exposta no rosto. Se ela, Juraci, morrer na colheita da peste, o culpado é o director da Saúde Pública do Estado, saibam todos: perseguindo-a por mesquinhos motivos políticos, enviando-a ao desterro em Buquim por sabê-la oposicionista e donzela, não tolerando Sua Senhoria nenhuma das duas espécies.
Antes de sair, diante da total abstenção do colega, doutor Evaldo recomenda a Maxi fornecer a Zacarias solução de permanganato de para passar no corpo e comprimidos de aspirina para a febre. Quanto a você, rapaz, volte para casa, aplique o permanganato, envolva-se em folhas de bananeira, evite a claridade, deite-se e espere.
Esperar o quê, doutor? Um milagre do céu ou a morte, que mais pode ser?
N
No rumor do choro surdo da mulher de cabeça encanecida, Aurinha Pinto, depositada em cima da mesa na sala vazia de outros móveis e parentes, dorme o celebrado sono derradeiro: embarcou no primeiro sopro de febre, sem esperar o resto, nem assim descansa a maltratada carcaça.
Silenciosos, doutor Evaldo, o doutorzinho do posto de saúde e a enfermeira Juraci contemplam o cadáver da anciã.
Morreu de bexiga, é epidemia… – declara num sussurro doutor Evaldo e de nada lhe valem idade e experiência: estremece e fecha os olhos para não ver.
Nem morrendo em seguida obteve Aurinha Pinto repouso para o fatigado corpo; prossegue vivo na doença, se acabando devagar; as brotoejas crescem em bolhas, as bolhas em pústulas, a pele sobe e desce, borbulhando, papocando, abrindo-se em óleo negro e fétido, bexiga imunda e infame, defunto sem paz.
A enfermeira Juraci, de delicado estômago, vomita na sala.
O
Onde estão elas, seu Maximiano Silva das Negras, onde as guardaram tão bem guardadas que, sendo eu director do posto e responsável pela saúde da população do município, ainda não consegui por os olhos em cima dessas benditas vacinas de repente tão necessárias?
Por que não as procurei antes? Quando admiti assumir tal cargo me garantiram possuir Buquim clima privilegiado, condições ideais para descanso e perfeitas de saúde pública, eleitores à Beça dando sopa; juraram ser Buquim o paraíso, o éden perdido no sertão, a paz enfim. Fantasma de um passado sórdido, espanto dos antigos, assombração macabra, varrida pelo progresso, para sempre erradicada a bexiga; não só ela, qualquer outra epidemia, viva o nosso paternal governo!
Me enganaram, ai, me enganaram. Cadê as vacinas, seu Maxi, temos de aplicá-las imediatamente, enquanto há tempo e povo. (clik na imagem e aumente)
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