HOJE É
DOMINGO
(Na minha cidade de Santarém)
“Era uma vez, há muitos, muitos anos atrás, numa terra muito distante, um Rei que tinha três filhas….” este era o começo de uma das muitas histórias que a minha avó me contava sentada à cabeceira da minha cama, pretensamente para me adormecer e que eu ouvia cada vez mais desperto. Depois, quando acabava, eu pedia-lhe:
- “Avozinha conta-me outra e ela a rir-se respondia-me: - “mas tu julgas que isto é fole de ferreiro?” e eu insistia: - “vá lá, avozinha, conta-me outra” e ela, quase invariavelmente, contava-me mais uma porque a sua imaginação era prodigiosa tanto quanto era grande o meu prazer em ouvir as suas histórias.
A minha avó era uma contadora nata de histórias. Já na parte final da sua vida, velha, doente, muito pesada, quase incapaz de se mexer, mantinha de dia sempre aberta a porta da sua casa para que as crianças da aldeia pudessem, quando lhes apetecesse, entrarem, sentarem-se à sua volta e ouvirem as suas histórias.
Vivia em Paio Pires, na “outra banda” da cidade de Lisboa, como então se chamava ao outro lado do estuário do Tejo, onde mais tarde se construiu a Siderurgia Nacional, e todos a conheciam pela “T’i Júlia da Courela”.
- “Avozinha conta-me outra e ela a rir-se respondia-me: - “mas tu julgas que isto é fole de ferreiro?” e eu insistia: - “vá lá, avozinha, conta-me outra” e ela, quase invariavelmente, contava-me mais uma porque a sua imaginação era prodigiosa tanto quanto era grande o meu prazer em ouvir as suas histórias.
A minha avó era uma contadora nata de histórias. Já na parte final da sua vida, velha, doente, muito pesada, quase incapaz de se mexer, mantinha de dia sempre aberta a porta da sua casa para que as crianças da aldeia pudessem, quando lhes apetecesse, entrarem, sentarem-se à sua volta e ouvirem as suas histórias.
Vivia em Paio Pires, na “outra banda” da cidade de Lisboa, como então se chamava ao outro lado do estuário do Tejo, onde mais tarde se construiu a Siderurgia Nacional, e todos a conheciam pela “T’i Júlia da Courela”.
Sempre bem disposta… já no hospital, pouco tempo antes de morrer, respondia ao médico que lhe perguntava se os dentes eram dela: - “São, sim, Sr. Dr. que já os paguei...”
Gosto de a imaginar, hoje, sentada para aí em cima de uma nuvem, daquelas fofinhas, rodeada de meninos com toda a eternidade para se deliciarem ouvindo as suas histórias.
Eu, que já não irei morrer menino, mesmo assim, se então me encontrar com ela para aí em qualquer nuvem, irei pedir-lhe para me deixar ficar à sua beira e retomar o velho hábito de menino a ouvir as suas histórias.
Era assim a minha avó Júlia que preencheu o meu imaginário de criança, que me transmitiu através das suas histórias grande parte da herança dos meus antepassados, dos conceitos do bem e do mal e que de entre tantas histórias também me poderia ter contado a história do Menino Jesus:
...Era uma vez, há muitos anos atrás, numa terra longínqua, numa aldeia de gente muito pobre, Nazaré do seu nome, onde vivia uma menina chamada Maria. Então, a vida era muito difícil, a comida era pouca, não havia remédios para as doenças como há hoje e por isso a vida era muito mais curta, tudo tinha que começar mais cedo para que o ciclo da vida: nascer, crescer, procriar e morrer se pudesse concluir para que a humanidade não acabasse. Por isso, os pais de Maria, quando ela tinha 10 anos combinaram logo o seu casamento com um homem muito mais velho, viúvo, já pai de cinco filhos e que se chamava José.
O casamento deveria ter lugar uns três ou quatro anos depois, como era hábito, mas aconteceu que, entretanto, Maria engravidou e de acordo com os costumes da época e do lugar, a gravidez fora do casamento mas com este já combinado era considerado adultério e castigado com a morte por apedrejamento, também chamado de lapidação.
O marido era a única pessoa que na qualidade de ofendido lhe podia perdoar e poupar-lhe a vida mas ao fazê-lo carregaria para sempre o opróbrio, a ignomínia, a vergonha de alguém que tinha sido desonrado e que daí em diante seria apontado por todos e de todos perderia o respeito e consideração devidas a um homem de bem.
As sociedades são moldadas por regras que servem interesses, interesses de alguns, os mais poderosos já se vê, que no momento se constituem em leis e com o decorrer dos tempos convertem-se em tradições, usos, costumes como lhes quisermos chamar e têm uma força inquestionável, tanta que às vezes se lhes obedece não porque se perceba bem porquê, mas porque foi sempre assim… como se a sociedade se sentisse protegida por essa rigidez de procedimentos, por essa severidade, como se de uma máquina, naturalmente insensível, se tratasse, dando a sensação de que o homem não confia em si, na sua capacidade de julgar no caso a caso, de acordo com as circunstâncias e a natureza particular de cada um.
Mas José era um homem bom e condoeu-se daquela jovem, despertando ainda para a vida, transportando dentro de si uma outra vida e que de uma forma tão brutal iria ser apedrejada até à morte e num gesto de grande humanidade perdoou-lhe a ofensa e montando-a num burro abandonou a sua terra e restante família e foi com ela viver para outra aldeia distante onde acabaram por ser muito felizes e onde o menino nasceu, cresceu e se fez homem rodeado pelo respeito que era devido à sua família.
Mas esta é a história de um menino normal, igual a todos os outros que nasceram e viveram naquela terra e naquele tempo e a história a que eu me referia, é outra história, a de um menino diferente, chamado de Jesus e que por coincidência também era filho de uma jovem de nome Maria casada com um homem mais velho, viúvo, igualmente chamado José e que haveria de fazer história.
Uma história tão grande, complexa e simples ao mesmo tempo, que milhares de outros homens, ao longo dos séculos, a têm contado. Só a Biblioteca do Instituto Bíblico Pontifício de Roma possui mais de um milhão de obras sobre o tema e o Instituto Bíblico de Jerusalém outras tantas.
No entanto, história da sua vida, não constou de batalhas, conquistas, feitos heróicos… limitou-se a falar sobre justiça, igualdade, amor, solidariedade entre os homens, o mesmo é dizer: falou contra a injustiça, a desigualdade, a riqueza e com isso provocou a ira e o ódio dos poderosos, dos bem-instalados que vendo nele uma ameaça o assassinaram.
E a história poderia ter ficado por aqui, os seguidores do movimento que desencadeou perseguidos e mortos após o seu assassínio terem - se extinguido naturalmente… mas não foi assim. Da palavra de um homem, de protesto e de esperança, e do movimento dos seus seguidores resultaria muitos anos mais tarde uma religião de carácter universal que influenciou a história da humanidade, inspirou as leis, a arte, o pensamento e esteve na origem de muitas guerras, sofrimentos, ódios, fanatismo, intolerância, crimes, negócios obscuros, tudo aquilo que o seu inspirador não desejava.
Jesus foi assassinado em vida e traído depois de morto, nas suas idéias e na sua mensagem que, de amor, esperança e justiça, continua hoje tão válida como há dois mil anos atrás… com Deus ou sem Deus.
Gosto de a imaginar, hoje, sentada para aí em cima de uma nuvem, daquelas fofinhas, rodeada de meninos com toda a eternidade para se deliciarem ouvindo as suas histórias.
Eu, que já não irei morrer menino, mesmo assim, se então me encontrar com ela para aí em qualquer nuvem, irei pedir-lhe para me deixar ficar à sua beira e retomar o velho hábito de menino a ouvir as suas histórias.
Era assim a minha avó Júlia que preencheu o meu imaginário de criança, que me transmitiu através das suas histórias grande parte da herança dos meus antepassados, dos conceitos do bem e do mal e que de entre tantas histórias também me poderia ter contado a história do Menino Jesus:
...Era uma vez, há muitos anos atrás, numa terra longínqua, numa aldeia de gente muito pobre, Nazaré do seu nome, onde vivia uma menina chamada Maria. Então, a vida era muito difícil, a comida era pouca, não havia remédios para as doenças como há hoje e por isso a vida era muito mais curta, tudo tinha que começar mais cedo para que o ciclo da vida: nascer, crescer, procriar e morrer se pudesse concluir para que a humanidade não acabasse. Por isso, os pais de Maria, quando ela tinha 10 anos combinaram logo o seu casamento com um homem muito mais velho, viúvo, já pai de cinco filhos e que se chamava José.
O casamento deveria ter lugar uns três ou quatro anos depois, como era hábito, mas aconteceu que, entretanto, Maria engravidou e de acordo com os costumes da época e do lugar, a gravidez fora do casamento mas com este já combinado era considerado adultério e castigado com a morte por apedrejamento, também chamado de lapidação.
O marido era a única pessoa que na qualidade de ofendido lhe podia perdoar e poupar-lhe a vida mas ao fazê-lo carregaria para sempre o opróbrio, a ignomínia, a vergonha de alguém que tinha sido desonrado e que daí em diante seria apontado por todos e de todos perderia o respeito e consideração devidas a um homem de bem.
As sociedades são moldadas por regras que servem interesses, interesses de alguns, os mais poderosos já se vê, que no momento se constituem em leis e com o decorrer dos tempos convertem-se em tradições, usos, costumes como lhes quisermos chamar e têm uma força inquestionável, tanta que às vezes se lhes obedece não porque se perceba bem porquê, mas porque foi sempre assim… como se a sociedade se sentisse protegida por essa rigidez de procedimentos, por essa severidade, como se de uma máquina, naturalmente insensível, se tratasse, dando a sensação de que o homem não confia em si, na sua capacidade de julgar no caso a caso, de acordo com as circunstâncias e a natureza particular de cada um.
Mas José era um homem bom e condoeu-se daquela jovem, despertando ainda para a vida, transportando dentro de si uma outra vida e que de uma forma tão brutal iria ser apedrejada até à morte e num gesto de grande humanidade perdoou-lhe a ofensa e montando-a num burro abandonou a sua terra e restante família e foi com ela viver para outra aldeia distante onde acabaram por ser muito felizes e onde o menino nasceu, cresceu e se fez homem rodeado pelo respeito que era devido à sua família.
Mas esta é a história de um menino normal, igual a todos os outros que nasceram e viveram naquela terra e naquele tempo e a história a que eu me referia, é outra história, a de um menino diferente, chamado de Jesus e que por coincidência também era filho de uma jovem de nome Maria casada com um homem mais velho, viúvo, igualmente chamado José e que haveria de fazer história.
Uma história tão grande, complexa e simples ao mesmo tempo, que milhares de outros homens, ao longo dos séculos, a têm contado. Só a Biblioteca do Instituto Bíblico Pontifício de Roma possui mais de um milhão de obras sobre o tema e o Instituto Bíblico de Jerusalém outras tantas.
No entanto, história da sua vida, não constou de batalhas, conquistas, feitos heróicos… limitou-se a falar sobre justiça, igualdade, amor, solidariedade entre os homens, o mesmo é dizer: falou contra a injustiça, a desigualdade, a riqueza e com isso provocou a ira e o ódio dos poderosos, dos bem-instalados que vendo nele uma ameaça o assassinaram.
E a história poderia ter ficado por aqui, os seguidores do movimento que desencadeou perseguidos e mortos após o seu assassínio terem - se extinguido naturalmente… mas não foi assim. Da palavra de um homem, de protesto e de esperança, e do movimento dos seus seguidores resultaria muitos anos mais tarde uma religião de carácter universal que influenciou a história da humanidade, inspirou as leis, a arte, o pensamento e esteve na origem de muitas guerras, sofrimentos, ódios, fanatismo, intolerância, crimes, negócios obscuros, tudo aquilo que o seu inspirador não desejava.
Jesus foi assassinado em vida e traído depois de morto, nas suas idéias e na sua mensagem que, de amor, esperança e justiça, continua hoje tão válida como há dois mil anos atrás… com Deus ou sem Deus.
(carregue na imagem de uma rua antiga de Santarém)
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