sexta-feira, dezembro 28, 2012


GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 175

Mas Gabriela chorava na areia, na fímbria do mar. A lua a cobria de ouro, seu perfume de cravo no vento a passar.

Tu tá chorando, mulher.

Tocou o rosto de canela com a mão de navalha.

 - Porquê? Junto de mim mulher não chora, ri de prazer.

- Se acabou, agora se acabou.

 - O que se acabou?

 - Pensar que um dia…

 - O quê?

 - Que poderia voltar ao fogão, ao quintal, ao quarto dos fundos, ao bar. Não ia Nacib abrir restaurante? Não ia precisar de boa cozinheira. Quem melhor do que ela.

Dona Arminda dizia para ter esperança. Só mesmo Gabriela para assumir cozinha tão grande e dar conta perfeita. Em vez dela um sujeito vindo do Rio, um boneco empalhado, falando estrangeiro.

Daí a três dias, a inauguração, uma festa das grandes. Agora, nem mesmo a esperança. Queria ir-se de Ilhéus. Para o fundo do mar.

Sete Voltas era uma liberdade plantada cada dia, ao amanhecer. Era uma oferta e uma decisão. Um orgulho e uma dádiva. Feria como um raio, alimentava como a chuva, camarada do campo de batalha.

- Um portuga?

Põe-se de pé o camarada do campo de batalha. O vento arrefecia ao tocá-lo, empalidecia o luar em suas mãos, as ondas vinham lamber-lhe os pés de capoeira, criadores do ritmo.

 - Não chore, mulher. Junto de Sete Voltas nenhuma mulher chora, só faz rir de prazer.

 - Que posso fazer? – Pela primeira vez era uma pobre e triste e desgraçada, sem desejo de viver. Nem mesmo o sol, nem o luar, nem a água fria, nem seu gato arisco, nem o corpo de um homem, nem o calor de um deus de terreiro, podia fazê-la rir, sentir o gosto da vida no peito vazio.

Vazio de seu Nacib, tão bom, um moço bonito.

 - Nada tu pode fazer. Sete Voltas é que pode fazer e vai fazer.

 - Que coisa? Vejo não.

- Se o portuga sumir, quem vai cozinhar? No dia da festa, se ele sumir, que outro jeito senão te chamar? Pois vai sumir.

Por vezes era escuro como a noite sem lua e duro como a pedra do rochedo enfrentando o mar. Gabriela tremeu.

 - Que tu vai fazer? Matar ele? Quero não.

Quando ele ria era a aurora surgindo, São Jorge na Lua, terra encontrada por náufrago em desespero, uma âncora.

 - Matar o portuga? Não me fez mal. Mando ele embora um pouco depressa. Dar o fora daqui. Só maltrato um pinginho se ele teimar.


Site Meter