quinta-feira, abril 18, 2013

Escrava

O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 76

Os garotos tentaram escalar o pau-de-sebo, seduzidos por uma nota de cinco mil réis que balançava no alto. De um pote quebrado saíu um gato em disparada, louco, perseguido pelos moleques. Ricardo Braz olhava tudo aquilo com um grande tédio. Enterrara a sua vida…

 - Por que você não vai conversar com o prefeito e com o juiz? Está aí como um urso…

E Ruth admirava-se do marido.

Ricardo encaminhou-se para o grupo. Falavam sobre a formação de um tiro de guerra.

 - Aqui o dr. Promotor será o professor.

 - Obrigado. O presidente deve ser o Sr. Prefeito.

 - O Dr. Juiz o secretário.

O médico seria o tesoureiro.

 - E o Dr. Ricardo, o orador…

 - Apoiado

Seu Leocádio dos Correios aproximou-se

 - Dr. Ricardo, chegou ontem uma carta para o senhor. Está aqui.

Letra de Paulo Rigger. Invadiu-o a impaciência. Notícias dos amigos. Iria saber deles. Mas teve que esperar muito. Depois que acabou a festa houve bênção. Sermão do vigário sobre a castidade…

Trancou-se no quarto. Quando terminou a leitura da carta as lágrimas caíram-lhe dos olhos sujando a conferência escrita há dias. Morrera Pedro Ticiano… E morrera afirmando que a Felicidade é não desejar… E ele, Ricardo Braz, que tanto desejara… Viver por viver… E ele que quisera viver para o amor… Infeliz… Infeliz…

Deitou a cabeça sobre a mesa, inteiramente desanimado. Invadiu-lhe os membros uma grande lassidão…

 - A felicidade só a alcançam os imbecis e os cretinos…

 - Toda a vitória na vida é um fracasso na arte.

E a voz de Pedro Ticiano soava-lhe aos ouvidos, metálica. Revia a figura do amigo. Alto, magro, sempre de preto, muito céptico a dizer paradoxos…

 - Chegar à suprema renúncia de não desejar…

E Ricardo Braz chorou o seu fracasso.

Bateram à porta. Ele não respondeu. Bateram novamente.

 - Quem é?

 - Eu, Ruth…

 - O que há?

 - Você quer fazer esperar o Prefeito e o Juiz? Já está na hora da conferência. Vamos.

E Ricardo Braz obteve, naquela noite, um esplêndido triunfo, com a sua patriótica conferência.


Depois tédio…

A mesma coisa, sempre.

A Terra a girar em torno do Sol 365 dias.

Um dia, outro dia.

A Terá a girar sobre si mesma em 24 horas.

Dia. Noite.

Sempre a mesma coisa.

A maior tragédia: a tragédia da monotonia…

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