sábado, maio 04, 2013


JUBIABÁ

Episódio Nº 7


Os homens paravam para cumprimentar:

 - Bom dia, pai Jubiabá…

 - Nosso Senhor dê bom dia…

Ia passando e abençoando. Até o espanhol da venda baixava a cabeça e recolhia a bênção. Os garotos desapareciam da rua quando viam o vulto centenário do feiticeiro. Diziam baixinho:

 - Jubiabá vem aí…

E disparavam na carreira para se esconderem nas casas.

Jubiabá trazia sempre um ramo de folhas que o vento balançava e resmungava palavras em nagô. Vinha pela rua falando sozinho, abençoando, arrastando a calça velha de casimira em cima da qual o camisu bordado se oferecia ao capricho do vento como uma bandeira.

Quando Jubiabá entrava para rezar à velha Luísa, António Balduíno corria para a rua. Mas já sabia que a dor de cabeça da velha passaria.

António Balduíno não sabia o que pensar de Jubiabá. Respeitava-o mas com um respeito diferente do que tinha pelo padre Silvino, por sua tia Luísa, pelo Lourenço da venda, por Zé camarão ou mesmo pelas figuras lendárias de Virgulino Lampeão e Eddie Polo.

Jubiabá passava encolhido pelos becos do morro, os homens o ouviam com respeito, recebia cumprimento de todos e em sua porta paravam, de vez enquanto, automóveis de luxo. Um dia menino disse a Balduíno que Jubiabá virava lobisomem. Outro afirmou que ele tinha o diabo preso numa garrafa.

Da casa de Jubiabá vinham em certas noites sons estranhos de estranha música. António Balduíno se remexia na esteira, ficava inquieto, parecia que aquela música o chamava.

Batuque, sons de danças, vozes diferentes e misteriosas. Luísa lá estava com certeza com sua saia de chita vermelha e de anágua. António Balduíno nestas noites não dormia.

Na sua infância sadia e solta, Jubiabá era um mistério.


Eram bem gostosas as noites do Morro do Capa Negra. Nelas o moleque António Balduíno aprendeu na sua infância muita coisa e principalmente muita história.

Histórias que homens e mulheres contavam reunidos em frente à porta dos vizinhos, nas longas conversas das noites de lua. Nas noites de domingo, quando não havia macumba na casa de Jubiabá, muitos se reuniam no passeio da velha Luísa, que como era dia santificado não ia vender o seu mingau.

Nas outras portas outros grupos conversavam, tocavam viola, cantavam, bebiam um gole de cachaça que sempre havia para os vizinhos, mas nenhum era tão grande como o que se reunia em frente da porta da velha Luísa.

Até Jubiabá aparecia em certos dias e também contava velhos casos passados há muitos anos e misturava tudo com palavras em nagô, dava conselhos e dizia conceitos.

Ele era como que o patriarca daquele grupo de negros e mulatos que moravam no Morro do Capa Negra, em casas de sopapo cobertas de zinco. Quando ele falava, todos o escutavam atentamente e aplaudiam com a cabeça num respeito mudo.

Nessas noites de conversas, António Balduíno, abandonava os companheiros de corridas e de brincadeiras e se postava a ouvir. Dava a vida por uma história, e melhor ainda se essa história fosse em verso.


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