domingo, outubro 13, 2013

HOJE É 

DOMINGO

(13 de Outubro na minha cidade de Santarém)


Os meus concidadãos, especialmente os mais velhos e avisados, perceberam logo quando o primeiro-ministro José Sócrates anunciou o pedido de ajuda financeira em Abril de 2011, que vinha lá borrasca mas dois anos e meio depois desse anúncio as coisas estão ainda numa grande indefinição quanto à gravidade das consequências.

Mergulhámos numa crise com uma terapia dita de choque castigadora dos doentes que só fizeram asneiras enquanto sãos e por isso ficaram assim, como estão…

Lembram-se ainda, com certeza, daquele “especialista” que se expressava de uma maneira esquisita, imitando os sábios, chamado à última hora da Europa e à qual já regressou confessando-se falhado na sua missão, que falou até em remédios “brutais” fazendo jus à sua muita sabedoria, nesse aspecto…

Outros, para levantarem a moral do doente, disseram que não, bastava eliminar as “gorduras”… Ora, eliminar gorduras é connosco preocupados que somos com a nossa elegância… até podíamos dispensar a ida aos ginásio e fazer aí uma pequena poupança.

O pior é que poucos meses depois do novo governo entrar em funções, e ao contrário do que nos tinha dito o futuro 1º Ministro meses antes, levaram logo, à laia de gordura, metade do Subsídio de Natal e ficámos todos a perceber do que é que se tratava…

Mas deixemos por um pouco as coisas do Estado que, historicamente, neste país não é coisa pouca. Para mim, digam os nossos “médicos” o que disserem, retóricas e truques falhados de ilusionismo à parte, o último dos quais protagonizado pelo ministro Paulo Portas - useiro e vezeiro -  e a ministra das finanças, Maria de Lourdes Albuquerque, senão for o doente a curar-se a si próprio pouco mais lhe poderá valer.

Há séculos que os meus concidadãos são excelentes a improvisar, a inovar e a procurar mundo e o nosso tecido económico nestes últimos tempos tem sido um bom exemplo disso.

A nossa extraordinária flexibilidade e adaptação é a base da nossa sobrevivência e até surpreende aqueles especialistas que de fora vão acompanhando a situação.

Vejam só:

 - O nosso deficit comercial, a diferença entre o que compramos e vendemos, que no início de 2010 era de 9% do PIB atingiu o equilíbrio em meados de 2012 e tem vindo a reforçar-se;

 - A tradicional válvula de escape que é a imigração voltou a funcionar e em cada um destes dois últimos anos saíram do país cem mil pessoas;

 - Com menos dinheiro, e de uma forma quase inexplicável, a taxa de poupança dos meus concidadãos mais que duplicou, de 5,6 % do rendimento disponível em 2008 para 13,3% a meio do corrente ano.

É claro que aqueles que não acreditam em nós vêm logo dizer:

 - É pá,  isso é o resultado da crise…

É verdade que há aqui uma componente da crise mas outros países em situações idênticas não conseguiram resultados tão rápidos e não venha o governo apossar-se do mérito destes sucessos porque eles têm a ver com uma antiga e espantosa capacidade de adaptação dos portugueses.

Também é verdade que há forças de oposição cá dentro contra as quais eles têm que lutar mas a verdade é que sempre as houve pelo que já temos aqui algum treino adquirido.

E vamos ser claros, de tudo o mais grave são grandes empresas e os poderosos interesses económicos próximos do Estado - e lá vem o Estado outra vez pelas más razões, ele, que devia vir pelas boas -  que se aproveitam e distorcem a seu favor o ajustamento que estamos a fazer e, enquanto as pequenas e médias empresas ajustaram rapidamente, como já vimos nos indicadores, as grandes empresas protegem-se graças às boas relações que têm com o poder político.

Bancos, construtoras, comunicações, energia, outros serviços básicos e alguns grupos económicos mantêm artificialmente negócios e investimentos insustentáveis.

O capitalismo de compadres, enraizado entre nós, sempre teve muita força e constitui mais uma vez, nesta situação difícil, uma ameaça nacional como se o risco do negócio estivesse apenas reservado para os pequenos e médios empresários.

Vamos ver como será agora num momento em que nos despojamos dos anéis e nos preparamos para ser pouco mais do que um Condomínio Económico dos estrangeiros… mas eu não espero dessa gente, sinceramente, grande coisa.

Eles são incapazes de qualquer contributo que sirva de estímulo, de exemplo, de encorajamento aos seus concidadãos menos afortunados.

Eles são de outra raça… de outro país… de outra linhagem… de outro tipo de gente que sempre viveu afundada em privilégios, de costas voltadas para sacrifícios, para necessidades, numa espécie de corporativismo dos ricos e bem nascidos.

Vejam, por exemplo, o nosso actual Ministro dos Negócios Estrangeiros, Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete. Antes de aceitar o “patriótico” desafio de ser Ministro, em Setembro de 2013, “despediu-se” de Presidente da Assembleia Geral, Conselho Fiscal, Vogal, Director, Sócio Gerente, etc… de 33 empresas, repito, trinta e três empresas! 

 Admitindo mesmo que este senhor desempenhava gratuitamente todas estas funções, já perceberam o que elas representam em termos de prestígio, poder e influência concentrados numa única pessoa e o que isso revela sobre a permeabilidade entre o poder político e o económico?

Que fez ele pelo país, para além de se arrastar pelas cadeiras do poder há mais de trinta anos - vinte e cinco deles à frente da Fundação Luso Americana, desde a sua criação -  para merecer tantas cargos e funções e agora o lugar de Ministro dos Negócios Estrangeiros quando deveria estar a cuidar dos netos ou bisnetos?

Podíamos referir ainda a constituição do Conselho Geral e de Supervisão da EDP, recentemente vendida aos chineses e no qual, o Sr. Eduardo Catroga é Presidente, com o vencimento de 45.000 euros (ele diz, no seu ar bonacheirão, que grande parte vai para o Estado sob a forma de impostos) acompanhado de mais 20 personalidades, 20, todas do arco da governação, todos eles ex-governantes…

Os portugueses sabem de todas estas situações porque elas circulam pela Internet e toda a gente, hoje em dia, envia mails a toda a gente… e num processo de empobrecimento que sempre me pareceu inevitável, os portugueses sentem-se interiormente revoltados porque há um grupo de pessoas, a tal elite, sempre os mesmos, que circulam e acumulam lugares de poder.

Portugal é o país de mais fortes desigualdades sociais na Europa da Comunidade e é evidente que o Estado, com a sua função redistribuidora da riqueza através dos impostos, tem aqui especiais responsabilidades.

Sacrifícios, já todos percebemos que não lhes conseguimos fugir. Fomos levados numa teia de acontecimentos a uma escala que nos ultrapassou: a crise financeira do sub prime nos E.U., a contaminação à banca europeia e portuguesa, os casos de polícia do BPN e do BPP, as orientações políticas da Comunidade Europeia, o excesso de despesa geradora de dívida externa por parte do governo e dos próprios particulares atraídos e aliciados por uma banca sedenta de lucros, enfim... uma boa aventura a da nossa entrada na Comunidade Europeia e na Zona Euro num mundo globalizado mas uma aventura de riscos que os políticos, os nossos e os da Europa, se encarregaram de potenciar.

Aceitamos os sacrifícios mas este agravamento e nível de desigualdades sociais, não. As injustiças doem no espírito e não são boas conselheiras especialmente quando o estômago protesta de fome.

O governo tem que ser corajoso contra os privilégios, dar sinais e tomar medidas que levem todos a colaborar obrigatoriamente nesta difícil situação. Salvaguardar a paz social é o nosso mais precioso objectivo. Sem ela, nada se consegue, rói tudo como um castelo de cartas.

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