Largo do Seminário |
HOJE É
DOMINGO
(Na minha cidade de Santarém em 20/4/14)
Em 2014 somos um país de velhos tristes e medrosos e de jovens acossados pelo desemprego a contrastar com a explosão de juventude e alegria que sentimos no 25 de Abril que, de tanta que era, até nos dava para passar os sinais vermelhos sem parar... segundo contou Garcia Marquez que então nos visitou.
A grande diferença entre estas duas
datas está na esperança que então sentimos no futuro e que hoje deu lugar ao
desengano e ao medo pelo dia de amanhã.
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“Onde é que você estava no 25 de Abril?” – perguntava Batista Bastos em jeito
de provocação aos seus entrevistados.
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Bem... eu estava na cidade da Beira em Moçambique que, por essa altura,
começava a ficar sitiada pela Frelimo que emboscava as viaturas que iam para
Sul, Lourenço Marques, e para Manica e Sofala e Rodésia, a Leste.
Saí do meu gabinete de trabalho na
Delegação da Inspecção de Crédito e Seguros pelo meio da manhã e fui ao Largo
do Município onde se comemoravam as notícias que chegavam da metrópole com
palmas, vivas e discursos.
Não me fiz acompanhar por ninguém,
preferi estar só naqueles momentos.
Eu era contra a política do governo de
Marcelo Caetano herdada de Salazar e adepto da Frelimo cuja linha política
oficial me parecia correcta pois condenava o colonialismo e os colonialistas
isentando os portugueses, muitos deles chegados recentemente à Beira para
trabalhar como o poderiam ter feito para qualquer outro país de emigração.
Para mim, a independência e a liberdade
sempre me pareceram direitos inquestionáveis dos povos e a Frelimo lutava por
esses direitos com armas na mão já que a negociação sempre lhe esteve vedada
pelo governo de Lisboa.
Encostei-me a uma coluna das arcadas que
rodeavam a Praça e fiquei-me a olhar aquelas manifestações de alegria e entusiasmo enquanto
ia pensando que a partir daquele momento as vidas daquelas pessoas exuberantes de satisfação, não mais seria a mesma e que os motivos para os festejos, na realidade, não
existiam nem para portugueses nem para moçambicanos.
A história tem destas coisas, não gosta
de saltos bruscos: os portugueses vieram recambiados com uma mão à frente e
outra atrás e os moçambicanos iriam mergulhar numa luta fratricida pelo poder,
impensável naquele momento de hegemonia política e militar da Frelimo.
Os mais belos desígnios de liberdade e
independência festejados euforicamente naquela praça, naquele momento, iriam
traduzir-se, a relativamente breve trecho, primeiro, em fuga para uns, os
portugueses, depois, em guerra, miséria e morte para outros... os moçambicanos.
O dia 25 de Abril, para mim, foi um dia
de maus presságios e no entanto, o que estava a acontecer era o que eu esperava
e desejava que acontecesse, mas os maus pensamentos não me largaram naquela
manhã e ficaram como o mais significativo desse dia. Estava na hora errada no
sítio errado...
Colaborei, a convite do governador da
cidade da Beira, Cangela de Mendonça, (homem da confiança de Samora Machel que
viria a morrer com ele no desastre de avião que o vitimou), nos festejos do Dia
da Independência mas, qui nze meses
mais tarde, chegaria também a minha vez de fugir.
Para trás ficava um teatro de guerra em
preparação... mas aquela não era a minha terra e muito menos a minha guerra.
A situação não conseguiu ser controlada
pacificamente pela Frelimo: as ambições, as rivalidades tribais, o desejo do
poder, a sede de vingança, o ódio, acabaram por se impor.
Sobrou para mim o Quadro Geral de Adidos
e uma vida nova no meu país que tanta dificuldade tem para acertar o passo com
o seu futuro - liderado hoje pelo filho de um retornado - ontem com um império que se desmoronou de
frágil que era, hoje com uma Europa que não o compreende, nem lhe perdoa devaneios.
Quarenta anos da Revolução dos Cravos a
que não pude assistir com pena minha mas a vida, mesmo que se programe, tem
sempre mais de imprevisto do que de esperado.
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