quarta-feira, outubro 08, 2014


O Discurso do 5

de Outubro

do Presidente

 Cavaco










Todos os comentadores críticos ao governo mas afectos ao Presidente, mesmo os que não gostam dele, como Miguel Sousa Tavares, fizeram rasgados elogios ao discurso de Cavaco Silva no dia comemorativo da instalação da República em 1910.

E o que disse ele para merecer tão rasgados elogios? 

- “Bateu” nos banqueiros, nos “Espírito Santo” e outros que tais que enganaram e roubaram declaradamente os portugueses?

 -  Não!

 - “Bateu” nos partidos, nos políticos, no sistema partidário, nas guerras e disputas que impedem entendimentos mínimos para que o país possa enfrentar os desafios do presente e do futuro.

Críticas mais ou menos consensuais das que o “povinho” gosta de ouvir, feitas por um político que não gosta de ser político embora esteja há vinte anos à frente do país como Chefe do governo e Presidente da República.

Um recordista após o 25 de Abril e da instalação da democracia e da liberdade pela qual ele também sente ter lutado.

Deixarei para a Clara Ferreira Alves, no texto que a seguir transcrevo, o dissecar da personalidade de Cavaco e o “seu amor à liberdade” e à “democracia”, na certeza de que se trata de um personagem que foi conquistando votos e até maiorias absolutas com uma “receita” de si próprio que corresponde muito pouco à realidade mas que tem “pegado” e esse foi o seu segredo do qual, este discurso do 5 de Outubro, faz parte.


Clara Ferreira Alves:

Cavaco Silva na cerimónia de comemoração dos 104 anos da proclamação da República:

 «Lutámos pela democracia antes e depois do 25 de abril.»

Já homem feito, Cavaco Silva teve um comportamento ignóbil na PIDE, ao intuir que a polícia política do Estado Novo poderia não ver com bons olhos que ele se relacionasse com o sogro, por este se ter casado de novo. Com efeito, numa ficha da PIDE que fora obrigado a entregar, Cavaco não hesitou em escrever, num espaço de preenchimento facultativo, que «não priva» com a segunda mulher do sogro, dando o nome completo da senhora. 

Mais do que ter sossegado a PIDE, comunicando-lhe «não exercer qualquer actividade política» e considerar-se «integrado dentro [sic] do actual regime político», foi a atitude em relação ao sogro que revelou a têmpera, o carácter e a probidade de Cavaco Silva.

Mesmo depois do 25 de Abril, Cavaco Silva demonstrou em múltiplas situações que a sua adaptação ao regime democrático foi uma tarefa penosa, quando não mesmo inconseguida. Desde logo em relação à Constituição da República, que, enquanto Presidente da República, jurou cumprir e fazer cumprir. Num discurso proferido em 19 de Maio de 1990, o então primeiro-ministro sustentava que a Constituição submetia o país a uma «tutela colectivista imposta pelo golpe comunista e socialista do 11 de Março», que teria como propósito a «perpetuação de uma orientação marxista e socializante para a sociedade portuguesa» e que fora aprovada num processo que «não respeitou a dignidade de Portugal nem os nossos mais legítimos interesses» (artigo publicado no Jornal de Notícias, em 25.4.1994).

É este Cavaco Silva — que recusou atribuir a Salgueiro Maia uma pensão, mas que concordou com a atribuição de pensões a dois ex-inspectores da PIDE, um dos quais estivera envolvido nos disparos sobre a multidão concentrada à porta da sede daquela polícia política — que tem o desplante de se incluir entre os que lutaram pela democracia antes e depois do 25 de Abril?

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