O mundo em que eu nasci
estava muito influenciado pelo que tinha sido o ocorrido na II G. G. Mundial.
Embora aqui no extremo da Europa, poupada às atrocidades da
luta e vivendo num país cujo governante nunca escondera o seu favoritismo pelos
vencidos, não há dúvidas que para nós, o mundo estava dividido entre “bons” e “maus”
e os Americanos eram os representantes máximos dos primeiros, e os Alemães logo
substituídos pelos Russos por causa da sua ideologia comunista, ateus e
inimigos da propriedade privada, faziam parte dos maus.
Portanto, era tudo muito
fácil, não havia dúvidas na escolha, o meu mundo era o dos bons, o dos
americanos.
Dúvidas também não tinha
o Sr. Emílio, que estava hospedado na mesma casa em que, por essa altura, 1961,
o meu pai me alugara um quartinho, nos meus tempos de estudante, ali ao Príncipe
Real, em Lisboa.
O nosso bom Sr. Emílio
tinha dois amores na sua vida, a ópera e os americanos. Nascido na Suíça, no
cantão alemão, distribuíra os seus oitenta anos por vários países da
Europa, Itália, França, Espanha e finalmente Portugal, sempre a fugir à guerra,
à procura de um ambiente social em que pudesse viver em paz espraiando o seu
enorme sorriso e a permanente e contagiante alegria e boa disposição.
O Sr. Emílio não tinha dúvidas,
os bons eram os americanos. Tinham sido eles os principais responsáveis por
terem trazido a paz para a sua Europa. Que ninguém lhe dissesse mal deles
porque então ele zangava-se mesmo perante tamanha injustiça.
Para além do mais, os
americanos que tinham sido decisivos na vitória dos aliados libertando-nos
desse pesadelo chamado Hitler e ao contrário dos Russos, partilhavam dos nossos
valores quer em termos morais, religiosos e políticos.
Os meus heróis na
juventude eram quase todos americanos por causa dos filmes de guerra postos a
correr ainda na década de 40 e 50 quando o cinema era o grande veículo de
formação para além dos livros de aventuras de Emílio Salgari e de Júlio Verne.
Hoje, passados tantos
anos, uma vida pode dizer-se, está tudo muito complicado quando se trata de
escolher entre os bons e os maus que, afinal, estão por todo o lado e
misturados.
Através do Relatório da
CIA ficamos agora a saber dos actos de tortura infligidos pelos americanos
sobre os prisioneiros durante os oito anos seguintes ao ataque sobre as Torres
Gémeas, num atentado aos Direitos Humanos e desrespeito pela natureza humana.
Lembrei-me do Sr. Emílio,
há mais de meio século, e de como ele ficaria triste se soubesse deste
comportamento dos seus “queridos” americanos.
Parabéns pela divulgação
pública do Relatório. Nem tudo é mau...
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