Largo do Seminário |
HOJE É DOMINGO
(Na minha cidade de Santarém em 22/3/15)
Lisboa é uma cidade que me encanta cada
vez mais porque mais importante do que aqui lo
que se vê, são os olhos com que se vê e quase aos 76 anos o acto de ver é um
misto de imagens e emoções.
Qualquer um de nós que vá avançando na
idade vai percebendo que é assim. Os olhos da juventude preocupam-se com a
descoberta de coisas novas, nunca vistas. Os olhos dos mais velhos são mais
selectivos, não correm atrás das imagens, detêm –se nas que lhe dão prazer e os
fazem reviver.
Nasci na parte oriental da cidade de
Lisboa e os sons que recordo da minha meninice para além da mulher que
apregoava os caracóis cozidos de que fiquei fã para o resto da vida, não foram
os sinos das igrejas mas as sirenes das fábricas.
O que era feio, inestético, cheirava mal
e estragava o ambiente ia para ali. Cabo Ruivo com a sua torre de refinação que
lá ficou a assinalar uma época de industrialização já tardia, o edifício da Mitra onde
por misericórdia se guardavam os velhinhos e o primeiro e grande bairro de
lata, conhecido pelo bairro chinês que começava ao fundo da minha rua.
Em 1998 a Expo/98 permitiu a
recuperação de toda aquela zona de terrenos altamente poluídos e hoje,
transformada em Parque das Nações, é a mais linda zona marginal da cidade de
Lisboa com o teleférico, restaurantes, esplanadas e o Jardim Garcia da Horta,
aposta de árvores exóticas vindas de Goa, S. Tomé e Príncipe, Macau e ainda de
mais longe.
Naquele espaço frente ao rio foram plantadas 4.000 plantas de 400
espécies, divididas em seis talhões que contam o encontro de culturas
ocidentais e orientais.
Eu, que na minha meninice sentia vergonha do local onde tinha nascido, hoje tenho orgulho e não o trocava por nenhum outro e se tenho oportunidade de ir a Lisboa fora dos almoços mensais com os meus colegas de curso, é ao Parque das Nações que vou.
Eu, que na minha meninice sentia vergonha do local onde tinha nascido, hoje tenho orgulho e não o trocava por nenhum outro e se tenho oportunidade de ir a Lisboa fora dos almoços mensais com os meus colegas de curso, é ao Parque das Nações que vou.
Sei que
olhando toda aquela paisagem com o mar da palha em frente os meus olhos vêm aqui lo que os olhos das outras pessoas, necessariamente
se forem jovens, não vêm.
As
imagens vêm carregadas de um passado que lhes dão profundidade e as levam a um
tempo em que tudo aqui lo era sujo e
imundo.
Os outros
olhos não podem ver isso porque já não se ouvem as sirenes das fábricas a chamarem
os trabalhadores, o pregão da mulher dos caracóis cozidos e um pouco mais à
frente o esforço ritmado dos homens vergados ao peso das sacas que descarregavam
das barcaças que as tinham trazido dos barcos que ficaram ao largo naquele esplêndido
estuário.
Os olhos
dos velhos não precisam de estar abertos para verem coisas e se os abrirem
combinam as imagens do hoje com as do ontem e a dimensão da realidade é outra,
no espaço e no tempo transmitindo emoção, sentimentos.
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