Tenha dó de um pobre pau-mandado |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 363
Na pensão de raparigas, recordaria com
Xandu a graça e o dengue de Zezinha do Butiá, o xibiu aquele abismo! Perdida em
Sergipe, não dava notícias nem sequer ao sobrinho Durvalino, o Leva-e-Traz.
Se sobrasse tempo, iria a Ilhéus cavaquear
com Álvaro Faria e ver o mar que, rapazola, cruzara num lugre de imigrantes
para vir do país das tâmaras para as terras do cacau.
4
Não chegaram a empreender a projetada
viagem, não houve tempo, os acontecimentos começaram a se desenrolar logo a
seguir e se precipitaram em ritmo de tormenta e vendaval.
Acabava o capitão Natário da Fonseca de
abancar-se à mesa do almoço quando o filho Peba entrou correndo casa adentro:
não vinha pela comida.
Afobado, dirigiu-se ao pai:
- Tem dois homens lá fora atirando nos
porcos, diz-que são fiscais e já mataram...
O Capitão não esperou que Peba completasse
a frase, tomou do cinturão com o parabelo, pendurado na parede ao lado da mesa,
despenhou-se pela ladeira.
Alcançou o descampado a tempo de ver
Altamirando, também ele chamado às pressas, se atracar com um dos dois desconhecidos.
Com as armas em punho, gritando ameaças,
os dois adventícios tinham feito uma carnificina de porcos, em sua maioria da
criação do sertanejo.
Altamirando, um punhal na mão, e o tal
sujeito cujo revólver se perdera na queda, rolavam no chão. Ainda distante,
Natário nada pôde fazer senão gritar, quando o outro indivíduo visou
Altamirando e disparou o trabuco várias vezes: o criador de porcos derreou, um
rombo nas costas por onde o sangue em jorro o abandonava.
Quase no mesmo instante, o assassino caiu
morto com um único tiro do parabelo do Capitão. Chegava gente de todos os lados
e Tição Abduim prendeu nos braços o fulano que, tendo se livrado do corpo de
Altamirando, tentava se levantar.
Quando o tipo se viu cercado e recebeu os
primeiros sopapos, caiu de joelhos e implorou que não lhe tirassem a vida, pelo
amor de Deus, tinha mulher a sustentar e filhos a criar.
Ali haviam chegado ele e seu colega, com
ordens expressas a executar.
Ambos fiscais da Intendência do Município
de Itabuna com alçada na cidade, nas vilas e nos arruados: no território do
município situava-se o arraial, ou lá o que fosse, de Tocaia Grande.
Vinham para fazer valer a ordenança que
proibia animais soltos nas ruas: as determinações recebidas do Sargento
Delegado mandavam matar todos os bichos de quatro pés que se encontrassem
vadios nas artérias, pois não tinham onde os recolher e, mesmo que tivessem, era
necessário dar o exemplo.
Quem cumpre ordens, não é culpado, seu
Capitão. Tenha dó de um pobre pau-mandado.
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