(Domingos Amaral)
Episódio Nº 150
Lúcido e com sangue frio, o
príncipe mandou-a sentar num banco enquanto se afastava até à janela, colocando
alguma distância física entre eles.
Ouviu-se um grito e Chamoa
gemeu:
- É ele, conheço a sua voz! Ó meu Deus
acudi-me que fui apanhada!
Afonso Henriques tentou
serená-la.
Deixai-me ser eu a falar.
Nesse instante a porta
abriu-se de par em par, e um enfurecido Paio Soares entrou pela sala rugindo:
- O que se passa aqui ?
Levantando-se, Chamoa forçou
um sorriso espantado
- Meu marido, haveis chegado finalmente!
Paio Soares mirou-a, e depois
ao príncipe e berrou.
- O que estais a fazer sozinhos?
A rapariga fingiu-se pasmada
com aquela pergunta e, piscando as pestanas, justificou-se:
- Nada, apenas conversamos.
Atrás de Paio Soares haviam
entrado Gomes Nunes de Pombeiro e Elvira. Aliviados ao verem que nada de
anormal se passava, trocaram olhares cúmplices.
Contudo, o Mordomo-Mor deu
dois passos na direcção do príncipe. Zangado e já com a mão na espada rosnou:
- Como vos atreveis a chifrar-me?
Tranqui lo,
Afonso Henriques, retorqui u:
- Acusais o príncipe de Portugal?
Paio Soares suspendeu o seu
colérico balanço, mas manteve-se ríspido e perguntou:
- Que conversais com minha mulher?
O príncipe acalmou-se um
pouco. O marido de Chamoa recuara nas acusações e já admitia que se tratava
apenas de um diálogo.
Intrometendo-se entre eles,
Gomes Nunes de Pombeiro declarou:
- A culpa foi minha! Pedi a Chamoa que falasse
com o príncipe!
O Mordomo-Mor de Dona
Teresa, de testa franzida, qui s
conhecer o motivo daquela estranha iniciativa paternal.
- Porque temo por Toronho! –
reconheceu Gomes Nunes.
A seu lado Elvira
acrescentou, dirigindo-se a Paio Soares:
- Sabeis o que se passou em
Ricobayo! Toronho não está a salvo. Nem vós nem Dona Teresa conseguem
proteger-nos!
Após um toque irritado à
esposa de que não devia falar por ele, Gomes Nunes exclamou:
- Jamais prestarei
vassalagem a Afonso VII! Só Afonso Henriques me pode proteger da fúria do rei!
Vós não podeis!
Paio Soares, apesar de
incomodado, compreendeu e aceitou aquelas explicações. Então, o príncipe
dirigiu-se a ele:
- Prometi a vossa esposa que
protegerei Tui. E pedi-lhe em troca para deixar minha mãe.
O marido de Chamoa ficou
confundido pela inesperada proposta. Momentos depois, abanou a cabeça, chocado.
Ides fazer a guerra a vossa
mãe e a vosso primo? É uma loucura! Com que tropas ides lutar? Com a curta
guarnição de Guimarães?
Dirigindo-se de novo a Gomes
Nunes, afirmou com convicção
Afonso VII deu-nos um ano.
Confiai em mim!
Mirando a sua sogra, Elvira,
continuou:
- Confiai em vosso irmão Fernão! Chamoa é uma
Trava, como vós! Toronho não será invadido pelo rei!
Depois, olhou para o
príncipe e acrescentou:
- Um dia servir-vos-ei como
servi vosso pai. Por agora sirvo vossa mãe e não a vou trair.
Foi tal a veemência com que
falou que Gomes Nunes, Elvira e mesmo Chamoa pareceram acreditar finalmente que
o Mordomo-Mor os podia proteger da ira régia.
Ainda encostado à parede,
Afonso Henriques sorriu levemente. Então suspirou, começou a andar para a porta
e, ao passar por Gomes Nunes disse:
- Podeis contar comigo se necessitardes.
Sorriu pela última vez à sua
amada e despediu-se.
- Adeus Chamoa, estais mais bela do que nunca!
Em passada larga abandonou a
sala, deixando a rapariga corada, Paio Soares enciumado e Gomes Nunes dividido
entre duas lealdades.
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