sexta-feira, dezembro 02, 2016

MONOTEÍSMO













O grande mal indizível no centro da nossa cultura é o monoteísmo. A partir de um texto bárbaro da Idade do Bronze conhecido como Antigo Testamento, evoluíram três religiões anti-humanas – o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo. Trata-se de religiões de um deus do céu. São literalmente patriarcais – Deus é o Pai Todo-Poderoso – daí o desprezo pelas mulheres desde há 2.000 anos nos países atormentados por esse deus do céu e pelos seus representantes masculinos na terra.

Gore Vidal (escritor norte-americano nascido em 1925)


A mais velha das três religiões abraâmicas, e nítido antepassado das outras duas, é o judaísmo: originariamente era um culto tribal de um único Deus ferozmente antipático, doentiamente obcecado por restrições sexuais, pelo cheiro da carne queimada, pela sua própria superioridade relativamente aos deuses rivais e pela exclusividade da tribo do deserto que elegeu como sua.

Durante a ocupação romana da Palestina, o Cristianismo foi fundado por Paulo de Tarso enquanto facção do Judaísmo, uma facção menos implacavelmente monoteísta e também menos fechada que, levantando os olhos do meio dos judeus, os erguia para o resto do mundo.

Vários séculos mais tarde, Maomé e os seus seguidores regressaram ao monoteísmo intransigente da versão original judaica, embora sem a sua vertente exclusivista.

Fundaram, assim, o Islamismo com base num novo livro sagrado, o Corão ou Quran, ao qual acrescentaram uma poderosa ideologia de conquista militar para a propagação da fé.

Também o Cristianismo se propagou por meio da espada, brandida primeiro pelas mãos dos Romanos – depois do Imperador Constantino o ter promovido de culto excêntrico a religião oficial – posteriormente pelos cruzados e, mais tarde, pelos conquistadores espanhóis e outros invasores e colonos europeus, com o respectivo acompanhamento missionário.

Para os meus objectivos presentes, as três religiões abraâmicas podem ser, de um modo geral, tratadas como indistintas.

Salvo menção em contrário, terei sobretudo em mente o Cristianismo, mas apenas porque é versão que me é mais familiar.

Para os referidos objectivos, as diferenças têm menos importância do que as semelhanças. E não visarei minimamente outras religiões, como o Budismo e o Confucionismo. Na verdade há razões para afirmar que não se trata de religiões, mas sim, sistemas éticos ou filosofias de vida.



A simples definição da Hipótese Deus com que comecei este capítulo tem de ser substancialmente descarnada se a quisermos aplicar ao Deus abraâmico. Ele não só criou o universo, como é também um Deus “pessoal” que habita dentro desse universo, ou talvez fora dele (o que quer que isso signifique), possuindo as qualidades desagradavelmente humanas às quais já aludi.

Pelas declarações transcritas no texto anterior ficou perfeitamente claro que os Pais Fundadores da América, Jefferson, Adams, Madison, agnósticos ou ateus, eram igualmente defensores de que as opiniões religiosas de um Presidente eram exclusivamente da sua conta. Por isso, ficariam perfeitamente horrorizados com a resposta que George Bush pai deu ao jornalista Robert Sherman quando este lhe perguntou se reconhecia como iguais o patriotismo e a cidadania dos americanos ateus:

 - «Não, não acho que os ateus devam ser considerados cidadãos, nem que devam ser considerados patriotas. Esta é uma só nação, sob a protecção de Deus».

Basta substituirmos a palavra ateus por judeus, muçulmanos ou negros e teremos a medida do preconceito e da descriminação que os ateus norte-americanos têm de suportar hoje em dia.

Mas o isolamento dos ateus na América do Norte, como faz pressupor as afirmações de Bush pai é uma ilusão propositadamente cultivada pelo preconceito. Eles são nos E.U.A, em número muito maior do que as pessoas fazem ideia.

Eles são, por exemplo, mais numerosos, de longe, do que os judeus religiosos, no entanto, é notório que o lóbi judaico é um dos mais tremendamente influentes em Washington.

O que poderiam conseguir os ateus norte-americanos se estivessem devidamente organizados?

Tom Flynn, director do jornal Free Inquiry, é convincente ao afirmar: “Se os ateus se sentem sós e oprimidos só temos de nos culpar a nós próprios. Numericamente somos fortes. Vamos começar a fazer valer o nosso peso.”

No seu admirável livro Atheist Universe, David Miller conta uma história que, caso se tratasse de ficção, por certo consideraríamos uma caricatura irrealista da intolerância policial:

 - Um desses curandeiros que dizem curar pela fé um cristão que dirigia uma «cruzada milagreira» ia á cidade natal de Mills uma vez por ano.

Entre outras coisas estimulava os diabéticos a deitarem fora a insulina e as pessoas que sofriam de cancro a desistirem da quimioterapia, incentivando em vez disso, a rezar por um milagre,

Num gesto sensato Mills decidiu organizar uma manifestação pacífica para avisar as pessoas. Contudo, cometeu o erro de ir à polícia informar os agentes da sua intenção e pedir protecção policial para o caso de possíveis ataques por parte dos apoiantes do curandeiro.

Por azar, o agente, estava a pensar ir à concentração e fazia intenções de cuspir na cara de Mills quando este passasse à sua frente…

Tentou um segundo agente que lhe disse se algum dos apoiantes do curandeiro, confrontasse Mills com violência, prenderia Mills por “tentar interferir na obra de Deus”.


Regressou a casa desiludido mas decidiu telefonar para a Polícia para falar com um superior, um sargento, que lhe disse:«Vá pró inferno, amigo. Não espere que a gente aqui na polícia façamos protecção a um maldito de um ateu. Espero é que alguém dê cabo de si».

Abundam os episódios de idêntico preconceito contra os ateus e é praticamente impossível que um ateu sincero ganhe eleições nos E.U. A.

Existem 435 membros da Câmara dos 

Representantes  e 100 membros do Senado. 

Supondo que estas pessoas constituem uma 

amostra reveladora do conjunto da população, é 

absolutamente inevitável, do ponto de vista 

estatístico, que um número considerável seja ateu.

Devem ter mentido ou ocultado os seus sentimentos, para poderem ser eleitos. Dado o eleitorado que tinham de convencer quem pode culpá-los?

É universalmente reconhecido que uma admissão de ateísmo seria um suicídio político imediato para qualquer candidato presidencial.

Estes factos respeitantes ao actual ambiente político vivido no E.U. e aquilo que eles implicam teriam horrorizado Jefferson, Washington, Madison, Adams e todos os seus amigos.

Fossem eles ateus, agnósticos ou cristãos ter-se-iam encolhido de pavor perante os teocratas da cidade de Washington desde o início do Séc. XXI.

A pobreza dos Agnósticos

O padre que arengava do púlpito da capela da minha escola, permitia-se sempre uma certa consideração furtiva pelos ateus.

Pelo menos, tinham a coragem de assumir as suas transviadas convicções. Uns papa-açordas, tem-te-não-cais, lamechas, moles e enfezados.

Em parte até tinha razão, mas por um motivo totalmente diverso.

Não há de mal em ser-se agnóstico nos casos em que faltam provas de um lado ou de outro é a posição sensata.

Carl Sagan manifestou orgulho em ser agnóstico quando lhe perguntaram se existia vida em qualquer outra parte do universo.

Como se recusasse em dar uma resposta vinculativa, o seu interlocutor insistiu em que revelasse o seu “sentir visceral”, ao que Sagan respondeu de forma lapidar.

 - “Mas eu não tento pensar com as vísceras. A sério, não faz mal conter os nossos juízos até haver provas.»

A questão da vida extraterrestre está em aberto. É possível construir bons argumentos em ambos os sentidos, e faltam-nos provas para ir além de fazer pender um pouco as probabilidades mais para este ou para aquele lado.

Para um cientista estas são as palavras nobres. De tão concentrado na impossibilidade absoluta de provar ou refutar Deus, parece ter descurado a nuance da probabilidade.

O facto de não podermos provar ou refutar determinada coisa não coloca a existência e a não existência em pé de igualdade.

A existência ou não existência de Deus é um facto científico respeitante ao universo, que pode ser descoberto em teoria, se não na prática.

Se existisse, e resolvesse revelá-lo, o próprio Deus podia pôr fim à discussão de forma ruidosa e inequívoca, a seu favor.

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