quinta-feira, agosto 21, 2008



Pensar é Melhor que Rezar


Manifesto Ateísta (Sam Harris) (Parte II)



“A Natureza da Convicção”


“De acordo com várias entrevistas recentes, 22% dos americanos estão certos que Jesus voltará algum dia à Terra nos próximos 50 anos e outros 22% acreditam que, provavelmente, isso irá acontecer.

De acordo, ainda, com o resultado dessas entrevistas, 44% dos que vão uma vez ou mais por semana à Igreja, acreditam que Deus prometeu literalmente a terra de Israel aos judeus e querem deixar de ensinar às suas crianças o facto biológico da evolução.

Como o Presidente Bush revelou estar bem atento, os crentes deste tipo constituem o segmento mais aderente e activo do eleitorado americano e, por conseguinte, as suas visões podem influenciar decisões de importância nacional.

Os políticos liberais parecem ter tirado a lição errada destes desenvolvimentos e estão agora a folhear a Bíblia no desejo de conhecer como agradar melhor às legiões de homens e mulheres que no nosso país vota, em grande parte, com base no dogma religioso.

Mais de 50% dos americanos tem uma visão negativa ou muito negativa das pessoas que não acreditam em Deus e 70% pensa ser importante que os candidatos sejam mesmo muito religiosos.

A irracionalidade está em ascensão nos EUA, nas nossas escolas, Tribunais e em cada filial do governo Federal.

Só 28% dos americanos acredita na Teoria da Evolução e 68% acredita em Satanás.

Ignorância neste grau, concentrada na cabeça e na barriga de uma super potência constitui agora um problema para todo o mundo.

Embora seja bastante fácil para pessoas inteligentes criticarem o fundamentalismo religioso, algo chamado de “moderação religiosa” desfruta de imenso prestígio na nossa sociedade.

Isto é irónico porque os fundamentalistas tendem a fazer mais uso do cérebro do que aqueles que são moderados. Enquanto os fundamentalistas procuram justificar as suas convicções religiosas com evidências e argumentos extraordinariamente pobres mas, neste aspecto, fazem uma tentativa de justificação racional.

Por outro lado, geralmente quem é moderado, não faz nada além de citar as consequências boas da convicção religiosa.

Em lugar de dizerem que acreditam em Deus porque certas profecias bíblicas se tornaram realidade, o moderado dirá que acredita em Deus porque esta convicção “dá sentido às suas vidas”.

Quando o Tsunami matou 200.000 pessoas um dia depois do Natal, os fundamentalistas interpretaram este cataclismo imediatamente como uma evidência da ira de Deus.

Como se mostra, Deus estava enviando para a humanidade uma mensagem enviesada sobre os males do aborto, da homossexualidade e da idolatria.

Moralmente obscena, esta interpretação de catástrofes é determinada por absurdas convicções por parte dos fundamentalistas enquanto que, por outro lado, os moderados recusam tirar conclusões dos “trabalhos” de Deus que permanece um perfeito mistério, uma mera fonte de consolação compatível com o mal ocorrido.

Face a desastres como o tsunami asiático, homens e mulheres de benevolência preferem emitir vacuidades em vez do moralismo odioso dos crentes fundamentalistas.

Entre catástrofes, é certamente uma virtude da teologia liberal enfatizar a clemência em detrimento da ira porém, vale a pena notar, que fica à mostra a clemência humana, que não a de Deus, quando são puxados do mar os corpos inchados das vítimas.

Quando milhares de crianças são arrancadas dos braços das mães para morrerem afogadas, a teologia liberal revela-se naquilo que é: pretensiosa. Até mesmo a teologia da ira mostra, neste aspecto, mais mérito intelectual.

Nestas grandes catástrofes, a única coisa difícil de escrutinar, reside no facto de tantos homens e mulheres neurologicamente saudáveis, poderem acreditar no incrível e pensarem que isso é sabedoria moral.

É perfeitamente absurdo, que os religiosos moderados sugiram que um ser humano racional possa acreditar em Deus simplesmente porque essa convicção o faz feliz, o alivia do medo da morte ou dá significado à sua vida.

O absurdo torna-se óbvio quando trocamos a noção de Deus por uma qualquer outra proposição igualmente consoladora, por exemplo: acreditar que no quintal temos enterrado um diamante do tamanho de um frigorífico… e ninguém tem dúvidas que seria bom acreditar nisto.

Imagine então o que aconteceria se ele seguisse o exemplo do religioso moderado e mantivesse esta convicção ao longo de linhas pragmáticas: convicto de que no meu quintal está enterrado, algures, um diamante de um tamanho descomunal, essa convicção “daria sentido à minha vida” ou então, “eu e a minha família gostamos de ir ao Domingo ao quintal e cavar à procura dele” ou então, ainda, “eu não quereria viver num universo onde não houvesse um diamante de um tamanho descomunal enterrado no meu quintal”.

Claramente, estas respostas são inadequadas mas elas são piores do que isso, são respostas de um louco ou de um idiota.

A incompatibilidade entre a fé e a razão foi uma característica da cognição humana e objecto de discurso durante séculos.

Ou uma pessoa tem boas razões para aquilo em que acredita fortemente ou então não acredita. Todas as pessoas de todos os credos reconhecem o primado da razão e por isso passam toda a sua vida a argumentar e a contra argumentar sempre e onde podem mas, quando se trata de apoiar uma religião e a argumentação é fraca ou inexistente, invoca-se a fé.

A fé, que não é mais do que uma licença que as pessoas religiosas passam a si próprias para poderem continuar a acreditar quando não têm razões para isso.
(continua)

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