terça-feira, janeiro 13, 2009


Tieta do Agreste
EPISÓDIO nº 18



FIM DO CAPÍTULO DUAS VEZES INTERROMPIDO. UFA!


Tão simples a advinha, levara longo tempo a resolvê-la pela falta de dados a demora em reunir aquele mínimo de informações.

Desquite, uma das maiores provas de atraso do país, do subdesenvolvimento, indignada, dona Carmosina tem-se empenhado em discussões homéricas com o padre Mariano, com a professora Carlota Alves, com o doutor Caio Vilasboas – vejam só: médico formado, com diploma de faculdade e tão retrógrado! Uma pessoa agarrada à outra a vida toda, mesmo depois de legalmente separada – corpos e bens – sem poder casar de novo! Dona Carmosina lera uma estatística sobre o número de casais em estado de concubinato – palavrão horrível – no Brasil. Milhões. Vivendo como casados, aceitos, recebidos na sociedade, o senhor e a senhora fulano de tal, mas sem os direitos da lei. Esposa, não, concubina. Dona Carmosina encontra a solução, tão simples. Com o mínimo de pistas e o poder de decisão, chega a resposta da advinha. Antonieta vive com o ricaço como casada mas sem o ser realmente.

Admitida pela família, inclusive pelas filhas dele – referia-se mais de uma vez às enteadas e às sobrinhas do Comendador – mas impossibilitada de legitimar a união por ser ele desquitado. Conhecedora dos preconceitos de Agreste, o pai a esperá-la na escuridão, ao lado da janela aberta, de cajado em punho, a surra acordando a rua inteira, Tieta se fecha em copas, envolve marido e casamento em mistério e silêncio. Faz bem.

Certa ocasião, apareceu um fiscal de rendas em Agreste acompanhado da mulher, senhora distinta, agradável, educada por demais, mãe de um casal de gémeos. De começo muito bem recebidos, até que a senhora contou ingenuamente serem desquitados, ela e o marido, vivendo juntos e felizes há mais de dez anos, As portas se fecharam, as caras também. Tiveram de ir embora, em Agreste casamento tem que ser com juiz e padre senão não vale. Faz muito bem Antonieta em reservar-se, em manter a sua vida conjugal distante dos linguarudos da cidade, a começar por Perpétua. Dona Carmosina gostaria de ver a tromba de Perpétua, se um dia viesse a saber. Ia engolir a língua.

Para dona Carmosina, se o casal vive bem é o que importa, sendo de somenos padre e juiz, véu e grinalda. Ela própria desistiu há muito de qualquer exigência: marido ou seja lá o que seja, solteiro, viúvo desquitado, casado com mulher e filhos, desde que varão com olhos postos nela e disposto a ir em frente, dona Carmosina estará de acordo. Em colchão de plumas, ou na beira do rio, nos matos. Se lhe fosse dado a escolher, Osnar seria o felizardo. Na falta, serve outro qualquer. Infelizmente, nem Osnar nem outro qualquer.

Esquece, porém, as decepções de amor e os problemas relacionados com a demora da carta de Antonieta, ao enxergar, vindo da feira, o Comandante. Levanta-se, chega à porta, acena com o jornal. Quando ele se aproxima, ela vibra:

- Guardei para você ler. Vai-lhe interessar.

O comandante Dário toma da página, dona Carmosina indica o artigo. Começa a ler para si mas o assunto sem dúvida o empolga, eleva a voz: … as transformações políticas que marcaram a Europa ultimamente fizeram passar quase despercebido um acontecimento para os defensores do meio ambiente em todo o mundo: a condenação à prisão do presidente e de quatro directores da maior indústria química italiana, a Sociedade Montedison, acusada de poluir as águas do mar Mediterrâneo…

Abre-se largo sorriso no rosto do Comandante:

- Esse juiz é dos meus! Italiano topetudo! - prossegue na leitura: … o objecto do debate: a fábrica de dióxido de titânio de Scarlino, inaugurada com entusiasmo pelos pobres moradores desta província toscana e constantemente marcada por greves e interrupções do trabalho dos seus quinhentos empregados…

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