terça-feira, fevereiro 24, 2009



Tieta do Agreste



EPISÓDIO Nº60


DOS ALEGRES DIAS QUASE INTERTENIMENTO LIVRES DE PREOCUPAÇÃO



O programa de festejos continua e se intensifica. Dias alegres, despreocupados, felizes, dias de passeio, de prosa e rede, no trino dos passarinhos a infinita paz.

Na rede pendurada na varanda, ouvindo o gorjeio do pássaro sofrê, Leonora Cantarelli pergunta-se como a vida pode ser tão maravilhosa. Ascânio passa por um momento, para desejar bom-dia, a caminho da Prefeitura. Na cidade, conta ele, fervem as discussões sobre o problema da electricidade: Tieta obterá, através das suas relações paulistas, mandões da política, a instalação dos postos da Hidrelétrica? Uns dizem que sim, outros que não, os últimos em maioria. Ninguém duvida da riqueza, da importância social da viúva do Comendador Cantarelli, mas daí a mover graúdos da estirpe de governador e senadores vai distância. De qualquer maneira, bom assunto para as conversas para os debates, para matar o tempo longo, as lentas horas arrastadas. Ditosas ao ver de Leonora.

Após cumprimentar as senhoras e comentar a polémica da luz eléctrica, Ascânio dirige-se ao trabalho. O rosto esfogueado, a loira cabeleira, o riso de cristal, finíssimo bacará aos ouvidos do rapaz, Leonora acena adeus da porta de casa. Adeus? Até logo, até daqui a pouco, pois ele passará de novo, meio sem jeito, com receio de parecer importuno. Mas se demora a chegar, Leonora reclama, a fala doce queixume:

- Demorou, por quê?

- Medo de ser chato.

- Se repetir isso me zango.

Sempre com numerosa e alegre comitiva, subiram e desceram o rio na canoa a motor do Comandante, lerda e segura, na lancha de Elieser, no bote veloz de Pirica. No sábado finalmente irão a Mangue Seco, Tieta e Leonora serão hóspedes de dona Laura e do Comandante Dário. O Secretário da Prefeitura, restabelecido, pelo menos em aparência, da decepção da viagem a Paulo Afonso, anuncia à bela Leonora Cantarelli:

- Já tomei as necessárias providências burocráticas para encomendar um luar deslumbrante para você. Sabe que noite de lua cheia em mangue Seco é a coisa mais linda deste mundo?

- Tem de ser um luar daqueles senão não aceito.

- Deixe comigo, sou chapa de São Jorge.

Um luar para namorados, gostaria ela de dizer mas se contém, tudo é tão novo e inesperado, um sonho antigo fazendo-se de súbito realidade. Tarde demais. Também Ascânio gostaria de dizer: encomendei um luar de namorados, onde a coragem? Pobre, reles funcionário municipal como elevar os olhos para a herdeira milionária?

Nem em sonhos. Ainda assim, pensa Leonora, pensa Ascânio, são dias plenos, venturosos, benditos. O melhor é não pensar.

No meio da semana, jantaram em casa de dona Milú. Dona Carmosina anunciara espantoso cardápio, um despotismo de pratos, todos eles da mais alta qualidade, para regalar o mais fino paladar sulista. Da maioria desses quitutes, Leonora nunca ouvira falar.

Na sala repleta de bibelôs, recordações de um tempo de abastança – abastança dos Sluizer consumida pelo finado Juvenal Conceição, amigo do bom e do melhor, restaram apenas os bibelôs e o tenaz amor à vida da mãe e da filha – Leonora se informa com Ascânio:

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