quarta-feira, maio 13, 2009


Tieta do Agreste


EPISÓDIO Nº 131





Da INAUGURAÇÃO DA PRAÇS COM DISCURSOS E DANÇAS, CAPÍTULO EUFÒRICO



Exceptuando-se parte da meninada ainda na matinê, no Cine Teatro Tupi, praticamente todo o resto da população da cidade reuniu-se, às cinco da tarde do último Domingo antes do Natal, na antiga praça do Curtume, de agora em diante praça Modesto Pires. O jardim, o passeio que o circunda, o obelisco ao centro, o calçamento de pedras, benfeitorias devidas à acção de Ascânio Trindade na prefeitura, merecem o elogio geral.

- Esse Ascânio é um retado.

- Imagine-se quando ele for prefeito de verdade.

- Agreste vai virar um jardim.

Um estrado de madeira, armado para a cerimónia e para a exibição dos ternos de reis e do bumba-meu-boi; no obelisco a placa de concreto, coberta com a bandeira brasileira. Na esquina, na parede da casa de Laerte Curte Couro, de propriedade de Perpétua, placa de metal igualmente coberta. Pena a Lira Dois de Julho ter-se dissolvido haver cerca de trinta anos, com a morte do obstinado Maestro Jocafi que a dirigiu e regeu durante mais de meio século. Ascânio sonha com a reorganização da Lira cuja fama repercutira em todo o sertão da Bahia e de Sergipe. Difícil é encontrar quem empunhe a batuta, no município não há quem possa fazê-lo.

Madrinha da inauguração, cercada pela família e pelos amigos mais próximos, majestosa e sorridente, verdadeira rainha ou melhor, plagiando o vate Barbosinha, Madona transportada da Renascença para os oiteiros do Agreste, dona Antonieta Esteves Cantarelli, pelo braço do coronel Artur de Tapitanga, seguida por Ascânio Trindade, Modesto Pires, dona Aída, a filha Marta e o genro, engenheiro da Petrobrás, avança em direcção ao singelo monumento.

Silêncio e atenção, pescoços esticados. Dona Antonieta estende a mão, puxa a fita verde e amarela descerrando a placa de concreto onde se lê a data festiva e o nome do benemérito coronel Artur de Figueiredo, prefeito em exercício.

Cerimónia simples, saudada por palmas, emocionante, no entanto, pois Perpétua saca do negro lenço do bolso da saia negra e enxuga uma lágrima – lágrima negra, de luto, segundo sussurra ao ouvido de dona Carmosina o irreverente Aminthas, em dia de humor igualmente negro.

Os meninos do Grupo Escolar atacam o hino. Vivas ao coronel que acena com a mão, agradecendo. Todo satisfeito, de braço com a Tieta: a cabrita montês virou cabra de qualidade, úberes fartos e expostos. Ah!, seus tempos!

Zé Esteves, no cúmulo da satisfação com a proximidade da mudança para a nova residência, suspende o bordão e a voz:

- E viva minha filha, a senhora dona Antonieta Esteves Cantarelli!

Entusiasmo geral, nova lágrima de Perpétua, Elisa aberta em sorriso de vedeta, desperdiçando beleza, Leonora a mais animada, comandando as palmas. Por que não dão vivas a Ascânio Trindade?

Aplausos para dona Aída: a ela coube descobrir a placa na parede da esquina com o nome do logradouro reformado: praça Modesto Pires (cidadão eminente).

Viva Modesto Pires! – grita Laerte Curte Couro, da porta da casa, ao lado da mulher e dos filhos, puxando o saco do patrão.

Dona Preciosa e dona Auta Rosa, directora e secretária do Grupo Escolar, tentam conter a indisciplinada e incompleta turma, recrutada à força. Devido às férias fora difícil reunir mesmo aquele grupo de alunos, mais difícil ainda mantê-los em ordem. Vamos, o hino, seus rebeldes! A professora Auta Rosa, loura, nervosa e bonita, conta com admiradores fanáticos entre os discípulos. Dona Preciosa impõe-se a muque, a berruga no nariz, a voz de cabo de esquadra:

- Um, dois, três, agora!

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