Tieta do Agreste
EPISÓDIO Nº 133
Imagine que apareceu lá em casa, na fazenda, a dizer que vão montar fábrica aqui, construir uma cidade em Mangue Seco. Anda de juízo mole, acho que é devido à sua enteada – Muda de assunto: - Você ainda não me foi visitar na fazenda, ver minhas cabras; o rebanho dá gosto a gente olhar. Tenho um bode inteiro que é um portento, paguei um dinheirão por ele; se chama Ferro-em-Brasa.
À noite, os ternos de reis e o bumba–meu-boi exibem-se no estrado. Os ternos, em número de três, dois da cidade, o terceiro vindo de Rocinha, o mais bonito, o Sol do Oriente. Uma dúzia de pastoras, enfeitadas de papel de seda, conduzindo lanternas vermelhas e azuis, as vozes soltas, os pés na dança:
Somos pastoras
Das estrelas do céu
Chegamos do Oriente
Para saudar o Deus menino
Neste dia diferente
Tieta acompanha o canto do reisado, tomada de emoção. Menina de pés descalços, fugindo de casa para acompanhar os ternos nas ruas de Agreste.
Tanto sonhara empunhar uma lanterna, pastorear estrelas! Somente cabras e cabritas lhe couberam, vida afora. Valera a pena voltar para ver e ouvir.
Somos as pastoras
Da lua e do sol
Somos as pastoras
Do arrebol
Para assistir o bumba-meu-boi de Valdemar Coto, com o boi e a caapora, o vaqueiro em seu cavalo, dançando no tablado, espalhando a meninada pela praça. Uma única perna, um único braço, esvoaçante, branco lençol, agilíssimo, alegre fantasma, a caapora vem pedir a bênção a dona Tieta, é o moleque Sabino. Depois, o bumba-meu-boi e os ternos de reis descem a rua principal, param de porta em porta, saudando os moradores, pedindo permissão para entrar. Dançam e cantam na sala em louvor dos donos da casa. Cálices de licor, copos de cerveja, goles de cachaça são servidos ao vaqueiro, ao boi, à caapora, às pastoras do arrebol.
Improvisada orquestra, paga pela prefeitura, composta da harmónica de Claudionor das Virgens, do cavaquinho de Natalino Preciosidade, da viola de Lírio Santiago, toma lugar no estrado, ocupando cadeiras emprestadas por Laerte, ataca músicas de dança, variadas, para todos os gostos, logo surgem os pares.
- Olhem quem está dançando! – Astério aponta Osnar que comprime nos braços de macaco uma cabocla esfogueada, novinha, a saia no joelho, as pernas grossas.
- Sujeito mais sem vergonha – rosna dona Carmosina, furiosa por não ser ela a felizarda comprimida contra o peito do debochado, ai!
O assustado se anima, vários pares rodopiam no estrado. O cavaquinho chora num convite. Leonora olha para Ascânio, ele sorri, ele sorri, ela murmura, a voz rompendo cristais:
- Vamos…
Sobem ao tablado, a harmónica ataca a marchinha carnavalesca, Leonora desliza, os olhos semicerrados. Ascânio conduz o corpo leve da moça preso ao seu, os cabelos soltos tocam-lhe o rosto, sente-se o hálito cálido, noite gloriosa. A dança conquista a praça, generaliza-se. O engenheiro da Petrobrás, doutor Pedro e dona Marta, a esposa, incorporam-se aos dançarinos. Dona Edna aceita o convite de Seixas com o consentimento de Terto – e ele que se fizesse de besta e não consentisse! Dona Etna exige do marido compreensão e cortesia. Seixas a enlaça, ela adianta a coxa, mais audaciosa a cada rodopio. Quem acha, encaixa, diz Osnar e Seixas executa.
Cerimonioso e grave, o vate Barbosinha estende a ponta dos dedos a Tieta, solicitando o prazer da contradança. Diante do que, Elisa consegue decidir Astério e dona Carmosina exige de Aminthas o sacrifício:
- Me tire para dançar seu mal-educado.
- Vamos Elizabeth Taylor, mas tenha piedade dos meus pés.
- Cretino!
Os ternos de reis voltam à praça, dissolvem-se no estrado. Fidélio dança com a porta-bandeira do Sol do Oriente em busca do arrebol. O vaqueiro em seu cavalo Zaino, o boi, a caapora, correm atrás do bando de meninos chefiados por Peto. Ricardo ficou em casa, fazendo companhia à mãe. Depois do rosário, na rede espera a volta da tia.
Esgotadas as possibilidades de cachaça, Bafo de Bode retira-se da praça cada vez mais animada, a dança pegando fogo!
- Eta-ferro! Hoje vai ter movimento na beira do rio… - equilibra-se para aconselhar: - Mete os peitos, Ascânio, seja homem!
Desaparece no beco mas ainda se lhe escuta a voz podre e moralista:
- Toma cuidado, Terto, para não arrancar os fios da luz com os chifres…
Para o que diz Bafo de Bode, ninguém liga, advertência e sugestões perdem-se na música da harmonia, do cavaquinho e da viola, no júbilo da festa, na paz da noite de Agreste,
À noite, os ternos de reis e o bumba–meu-boi exibem-se no estrado. Os ternos, em número de três, dois da cidade, o terceiro vindo de Rocinha, o mais bonito, o Sol do Oriente. Uma dúzia de pastoras, enfeitadas de papel de seda, conduzindo lanternas vermelhas e azuis, as vozes soltas, os pés na dança:
Somos pastoras
Das estrelas do céu
Chegamos do Oriente
Para saudar o Deus menino
Neste dia diferente
Tieta acompanha o canto do reisado, tomada de emoção. Menina de pés descalços, fugindo de casa para acompanhar os ternos nas ruas de Agreste.
Tanto sonhara empunhar uma lanterna, pastorear estrelas! Somente cabras e cabritas lhe couberam, vida afora. Valera a pena voltar para ver e ouvir.
Somos as pastoras
Da lua e do sol
Somos as pastoras
Do arrebol
Para assistir o bumba-meu-boi de Valdemar Coto, com o boi e a caapora, o vaqueiro em seu cavalo, dançando no tablado, espalhando a meninada pela praça. Uma única perna, um único braço, esvoaçante, branco lençol, agilíssimo, alegre fantasma, a caapora vem pedir a bênção a dona Tieta, é o moleque Sabino. Depois, o bumba-meu-boi e os ternos de reis descem a rua principal, param de porta em porta, saudando os moradores, pedindo permissão para entrar. Dançam e cantam na sala em louvor dos donos da casa. Cálices de licor, copos de cerveja, goles de cachaça são servidos ao vaqueiro, ao boi, à caapora, às pastoras do arrebol.
Improvisada orquestra, paga pela prefeitura, composta da harmónica de Claudionor das Virgens, do cavaquinho de Natalino Preciosidade, da viola de Lírio Santiago, toma lugar no estrado, ocupando cadeiras emprestadas por Laerte, ataca músicas de dança, variadas, para todos os gostos, logo surgem os pares.
- Olhem quem está dançando! – Astério aponta Osnar que comprime nos braços de macaco uma cabocla esfogueada, novinha, a saia no joelho, as pernas grossas.
- Sujeito mais sem vergonha – rosna dona Carmosina, furiosa por não ser ela a felizarda comprimida contra o peito do debochado, ai!
O assustado se anima, vários pares rodopiam no estrado. O cavaquinho chora num convite. Leonora olha para Ascânio, ele sorri, ele sorri, ela murmura, a voz rompendo cristais:
- Vamos…
Sobem ao tablado, a harmónica ataca a marchinha carnavalesca, Leonora desliza, os olhos semicerrados. Ascânio conduz o corpo leve da moça preso ao seu, os cabelos soltos tocam-lhe o rosto, sente-se o hálito cálido, noite gloriosa. A dança conquista a praça, generaliza-se. O engenheiro da Petrobrás, doutor Pedro e dona Marta, a esposa, incorporam-se aos dançarinos. Dona Edna aceita o convite de Seixas com o consentimento de Terto – e ele que se fizesse de besta e não consentisse! Dona Etna exige do marido compreensão e cortesia. Seixas a enlaça, ela adianta a coxa, mais audaciosa a cada rodopio. Quem acha, encaixa, diz Osnar e Seixas executa.
Cerimonioso e grave, o vate Barbosinha estende a ponta dos dedos a Tieta, solicitando o prazer da contradança. Diante do que, Elisa consegue decidir Astério e dona Carmosina exige de Aminthas o sacrifício:
- Me tire para dançar seu mal-educado.
- Vamos Elizabeth Taylor, mas tenha piedade dos meus pés.
- Cretino!
Os ternos de reis voltam à praça, dissolvem-se no estrado. Fidélio dança com a porta-bandeira do Sol do Oriente em busca do arrebol. O vaqueiro em seu cavalo Zaino, o boi, a caapora, correm atrás do bando de meninos chefiados por Peto. Ricardo ficou em casa, fazendo companhia à mãe. Depois do rosário, na rede espera a volta da tia.
Esgotadas as possibilidades de cachaça, Bafo de Bode retira-se da praça cada vez mais animada, a dança pegando fogo!
- Eta-ferro! Hoje vai ter movimento na beira do rio… - equilibra-se para aconselhar: - Mete os peitos, Ascânio, seja homem!
Desaparece no beco mas ainda se lhe escuta a voz podre e moralista:
- Toma cuidado, Terto, para não arrancar os fios da luz com os chifres…
Para o que diz Bafo de Bode, ninguém liga, advertência e sugestões perdem-se na música da harmonia, do cavaquinho e da viola, no júbilo da festa, na paz da noite de Agreste,
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