TIETA DO AGRESTE
EPISÓDIO Nº 165
Que posição deve ele tomar, em definitivo? Se ficar provado exagero de Giovanni Guimarães, o problema será de fácil solução. Mas, se ao contrário, os entendidos vierem em seu apoio? Romperá Ascânio com o Magnífico Doutor, recusando-lhe a autorização e as facilidades prometidas para a instalação da Brastânio no município ou enfrentará o perigo da poluição, considerando mais importante para o futuro de Agreste a transformação económica da zona, a riqueza resultante da industrialização do que a escassa pescaria da reduzida colónia de Mangue Seco, a limpidez das águas, a beleza do rio? Como agir, que posição, que partido tomar?
Abrir mão de tudo, dos projectos administrativos e dos sonhos de noivado e casamento, para garantir a permanência do clima puro, da beleza clara, da modorrenta paz? A que servem o céu puro, a água clara, a beleza, a paz? Bom lugar para esperar a morte; com o correr do tempo a frase do caixeiro-viajante torna-se repetido lugar comum, verdade patente.
Antes de enfrentar o perigo, sacrificar uns poucos pescadores – e com isso pôr fim ao contrabando na barra do rio Real, que há quase um século às espaçadas incursões da polícia – sujar as águas, em troca de riqueza, do movimento, do incontido progresso. São poucos e contrabandistas os pescadores de Mangue Seco; são numerosos, sérios e trabalhadores os do arraial do Saco, do outro lado da barra, e a morte dos peixes, o envenenamento das águas atingirá toda a foz do rio, o mar em frente. Meu Deus, é de enlouquecer qualquer cristão ou marxista o contraditório universo das razões em causa. Ascânio, farto, exausto, os nervos em ponta, tenta liquidar o último argumento a perturbá-lo recordando que, localizados a praia e o arraial do Saco em terras de Sergipe, o destino dos pescadores que ali vivem não é problema dele, administrador de município baiano. Não se convenceu.
A prova de que não se convenceu foi a decisão tomada na Prefeitura, pela manhã, em relação ao indispensável calçamento do Caminho da Lama, na entrada da cidade, para as festas de inauguração da luz da Hidrelétrica. Urge dar início ao trabalho, dentro de um mês os postes chegarão às ruas de Agreste e se acenderá a luz de Tieta. Por via das dúvidas, fazendo das tripas coração, Ascânio resolve deixar de lado as mirabolantes promessas do doutor Mirko Stefano e retomar o plano anterior, modesto calçamento de pedras – pedras sobrando no rio e nas colinas, a única coisa realmente barata em Agreste além de mangas e cajus – financiados pelos apatacados da terra; correrá a lista, mendigo público, mais uma vez.
Decidido mas esmagado, desabitualmente irascível e ranheta; mantém longa e difícil conversa com mestre Esperidião, acertando prazo e preço para a empreitada. Ascânio a deseja rápida e barata, Esperidião considera inaceitáveis as magras propostas do secretário da prefeitura, levando em conta sobretudo a limitação do tempo: deverá contratar quantidade de trabalhadores, entrar pela noite adentro trabalhando, e ainda assim vai ser dureza entregar a obra na data precisa. Terminam por ir ao local examinar de perto.
Abrir mão de tudo, dos projectos administrativos e dos sonhos de noivado e casamento, para garantir a permanência do clima puro, da beleza clara, da modorrenta paz? A que servem o céu puro, a água clara, a beleza, a paz? Bom lugar para esperar a morte; com o correr do tempo a frase do caixeiro-viajante torna-se repetido lugar comum, verdade patente.
Antes de enfrentar o perigo, sacrificar uns poucos pescadores – e com isso pôr fim ao contrabando na barra do rio Real, que há quase um século às espaçadas incursões da polícia – sujar as águas, em troca de riqueza, do movimento, do incontido progresso. São poucos e contrabandistas os pescadores de Mangue Seco; são numerosos, sérios e trabalhadores os do arraial do Saco, do outro lado da barra, e a morte dos peixes, o envenenamento das águas atingirá toda a foz do rio, o mar em frente. Meu Deus, é de enlouquecer qualquer cristão ou marxista o contraditório universo das razões em causa. Ascânio, farto, exausto, os nervos em ponta, tenta liquidar o último argumento a perturbá-lo recordando que, localizados a praia e o arraial do Saco em terras de Sergipe, o destino dos pescadores que ali vivem não é problema dele, administrador de município baiano. Não se convenceu.
A prova de que não se convenceu foi a decisão tomada na Prefeitura, pela manhã, em relação ao indispensável calçamento do Caminho da Lama, na entrada da cidade, para as festas de inauguração da luz da Hidrelétrica. Urge dar início ao trabalho, dentro de um mês os postes chegarão às ruas de Agreste e se acenderá a luz de Tieta. Por via das dúvidas, fazendo das tripas coração, Ascânio resolve deixar de lado as mirabolantes promessas do doutor Mirko Stefano e retomar o plano anterior, modesto calçamento de pedras – pedras sobrando no rio e nas colinas, a única coisa realmente barata em Agreste além de mangas e cajus – financiados pelos apatacados da terra; correrá a lista, mendigo público, mais uma vez.
Decidido mas esmagado, desabitualmente irascível e ranheta; mantém longa e difícil conversa com mestre Esperidião, acertando prazo e preço para a empreitada. Ascânio a deseja rápida e barata, Esperidião considera inaceitáveis as magras propostas do secretário da prefeitura, levando em conta sobretudo a limitação do tempo: deverá contratar quantidade de trabalhadores, entrar pela noite adentro trabalhando, e ainda assim vai ser dureza entregar a obra na data precisa. Terminam por ir ao local examinar de perto.
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