domingo, julho 05, 2009


TIETA DO AGRESTE
EPISÓDIO Nº 174





Antes de entrar no assunto, relatou a Jarde e Josafá a aparição da máquina voadora, os homens de binóculos especulando os terrenos do coqueiral de Mangue Seco. Josafá ouviu atento mas não comentou, Jarde disse:

- É o pessoal da tal fábrica que acaba com os peixes. Não soube?

Mas Zé Esteves nem respondeu, ocupado em regatear o preço com Josafá, obteve pequena redução. Acertados os detalhes – ainda naquela tarde mandaria Pirica novamente a Mangue Seco com um recado para Tieta por causa do dinheiro a completar – sem poder esconder a satisfação foi com Jarde e Josafá ver as cabras no cercado. Enquanto discutiam haviam tomado uns tragos de cachaça para cortar o cansaço de Zé Esteves e desanuviar o rosto triste de Jarde.

No curral voltou a admirar o pai do rebanho, bode novo e bonito, de avantajado porte e berro forte, de nome Seu Mé. Josafá puxou o animal pelos chifres para que Zé Esteves melhor o observasse. Ao comentar-lhe as trouxas, quimbas de respeito, o novo dono abriu na gargalhada, o homem mais feliz do mundo. Tão feliz que lhe faltou a respiração; não cabendo no peito a alegria, o coração falhou sob o peso imenso.

Rindo estava, rindo arriou no chão, a mão estendida parta o bode, apontando-lhe os bagos; assim contara Jarde a Astério Simas ao lhe entregar o corpo do sogro.

Ia o velório em meio, entupida a pequena sala de Astério, gente conversando na calçada, quando, acompanhada por Ricardo, pelo Comandante Dário e por dona Laura, Tieta chegou de Mangue Seco onde a tinham ido prevenir.

- Teve o troço no meio da gaitada, nem sentiu – Astério repete à cunhada os detalhes ouvidos de Jarde e Josafá.

- Morreu de alegria… - diz Tieta.

Naquela hora não sabia ainda da participação – indirecta – da Brastânio na morte do velho Zé Esteves. Precedida pelo cunhado, anda para o caixão, se abraça com Tonha. As irmãs acorrem, alguém acorda Peto. Também Leonora se aproxima do grupo familiar e beija Mãezinha.

Para os parentes de Agreste a morte de Zé Esteves é uma carta de alforria. Tieta, porém, reencontrara o pai apenas há um mês. Durante vinte e seis anos não o vira, dele não sofreu agravo desde a surra e expulsão distantes e, nesses dias em Agreste, divertira-se com os seus repentes, alegrando-se ao vê-lo chegar mascando fumo, ranzinza e implicante, mas ainda capaz de ambição, de projectos e de alegria., sabendo rir, insolente comandante de cajado em punho. Reconhecia-se no Velho, tanto se pareciam pai e filha.

Astério enverga cara compungida, Elisa chora aos soluços, Perpétua enxuga os olhos com o lenço negro, clama aos céus a dor de filha inconsolável. Tieta não chora nem eleva a voz. Passa de leve a mão no rosto do pai, adusta face de pedra, escura. Das três irmãs, somente ela perdera bem precioso, ente querido, somente ela está órfã. Ela e Tonha a desvalida Tonha.

Morrera rindo para o bode, feliz com as suas novas cabras, em seu reconquistado pedaço de terra. Tieta se apodera do bordão abandonado a um canto da parede, anda para o passeio onde a conversa corre animada como convém a uma boa sentinela.



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