segunda-feira, agosto 17, 2009


TIETA DO AGRESTE
EPISÒDIO Nº 208



Como sempre sucede em se tratando de símbolos místicos, sobre esse reverenciado e temido totem, nada sabiam, nem sequer seu aspecto: se gasoso, líquido ou sólido. Certamente, sendo uma divindade, participa dos três estados. Gasoso, empesta o ar; líquido, envenena as águas; sólido, sua presença se impõe concreta sobre a população dominando-a. Tem razão Osnar: o dióxido de titânio fede e ferve na cidade. Que não o faça na rodinha diária do bar, na mesa de cerveja e na verde cobertura do bilhar! Sorri para Seixas, agradecido. Para Osnar a amizade é bem precioso, faz-se necessário preservá-la da poluição. Estendendo a mão comprida e magra toca o joelho do parceiro, num gesto de afecto:

- Eu lhe disse que o sargento vai completar treze anos, Seixas. Ou você não sabe que aos treze anos o cidadão brasileiro adquire a maioridade sexual? Terá sido você um retardado? Porque, além dos normais, existem os retardados e os precoces. Exemplo de precocidade, o porreta aqui presente: antes de completar os doze dei a primeira pitocada, iniciando a vitoriosa carreira de campeão de que vocês são testemunhas.

Num riso geral distende-se a atmosfera, a cordialidade reassume o comando da conversa. Fidélio reencontra a voz sossegada:

- A primeira, com quem foi? Com ela?

Seixas, superando por completo a altercação, esquece a zanga:

- E com que outra havia de ser, Fidélio? Lembras de nós os dois? Foi no mesmo dia, você primeiro, seu velhaco; me tomou a frente na surdina.

Fidélio repõe a verdade histórica:

- Conte a coisa como aconteceu. Você pediu para eu ir primeiro, estava tremendo.

Sorriem recordando. Seixas se enternece:

- É verdade eu estava me borrando de medo. Quando você saiu e me disse que era batuta, nem assim me controlei. Mas, no quarto, ela logo me pôs à vontade e tudo correu na perfeição.

Aminthas divaga:

- Quantos ela já terá iniciado? Não há nenhuma que se compare com ela para tirar o cabaço de um menino. Nos modos, na delicadeza das maneiras. Conheço alguns caras que se estrearam com umas vagabundas, saíram com péssima impressão, decepcionados. Levaram meses para se refazer e começar a usufruir. Há quem não se refaça nunca. Com ela, é logo de primeira.

- Proponho um trago em homenagem – diz Seixas novamente alegre.

- Salta quatro puras, almirante para a gente selar um trato entre nós e fazer um brinde a quem nos deu à luz pela segunda vez – ordena Osnar: o trato da amizade, o brinde da gratidão. Enquanto esperam, ele volta à iniciação de Peto: - Devemos fazer uma festa do barulho, como o sargento merece. Já tem tempo que a gente não arma um bom pagode e olhe que estamos precisando. Em Agreste agora só se fala de coisas ruins e feias: poluição e dinheiro.

Seu Manuel serve a cachaça, quer saber que mãe é essa que pariu tantos filhos e por que pela segunda vez.

- Foi a luz do entendimento que ela nos deu, Almirante – Para o bravo luso, misteriosas palavras que logo se esclarecem pois Osnar levanta o copo barato e grosso, aspira o odor da límpida cachaça, completa: - À saúde de Zuleika Cinderela e à sua estreita porta onde entramos meninos e saímos homens. E à nossa amizade que nenhum titânio há-de apodrecer.

Também Osnar tem seus lampejos, podendo, na mesma ocasião, por coincidência ou necessidade, retirar do predestinado Barbozinha os privilégios da violência e da poesia.

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