quinta-feira, agosto 27, 2009


TIETA DO AGRESTE
EPISÓDIO Nº 217






ONDE SE PRONUNCIA A PALAVRA IÁ



- A última informação que recebemos é um tanto quanto pessimista.

A voz de Ângelo Bardi não revela inquietação ou temor. Acostumada ao mando, porém afável e cordial, conserva leve acento ítalo-paulista de filho de imigrantes nascido no Brás. Têmporas grisalhas, bem posto, nem gordo nem magro, cinquentão, o ar sobranceiro, a figura de Ângelo Bardi infunde confiança. Atento às suas palavras, Rosalvo Lucena, Managerial Scinces Doctor, a quem os jornais qualificam de audaz e vitorioso empresário, parece um estudante recém-saído da universidade. Ângelo Bardi parece exactamente o que é, um magnata.

Estão sentados numa das pontas da grande mesa de reuniões, na sala à prova de som, climatizada, na sede da Indústria Brasileira de Titânio S. A. Além dos dois, o doutor Mirko Stefano e, na cabeceira a presidir, o senhor idoso de cabelo cortado à escovinha e olhos baços.

Doutor Mirko chega a abrir a boca mas não a falar, pois, pedindo licença, Bety penetra na sala, seguida pelo boi que conduz uma bandeja com café, açúcar, três outros tipos de adoçantes, xícaras e colheres. Ela mesmo serve com graça e desenvoltura, um sorriso de quem está plenamente feliz por encontrar-se diante daqueles senhores. O de cabelo cortado à escovinha descansa os olhos baços no busto altaneiro da secretária-executiva, na longa linha das pernas.

Precedida pelo boi, Bety retira-se em silêncio sentindo nas ancas o peso em ouro dos olhos baços, fecha a porta. Então o Magnífico Doutor traduz a frase. Acontece um director de relações públicas ver-se obrigado a exercer funções de tradutor. Quando a reunião é de tal monta a ponto de não admitir a presença de qualquer estranho. Apenas os quatro.

Não devemos nos impressionar demasiado – prossegue Ângelo Bardi.

- Sem dúvida as resistências a vencer são grandes, os homens vacilam. Creio no entanto que, se persistirmos, obteremos a localização desejada, a ideal. Talvez…

O dos olhos baços corta-lhe a frase com um gesto, olha para o doutor Mirko. O magnífico traduz, palavra por palavra. Assim lhe foi ordenado: palavra por palavra. Outro gesto manda o magnata continuar. Director de relações públicas, vitorioso empresário, magnata, patrão, essa a escala.

- Talvez todas essas delongas não passem de uma tentativa para nos arrancarem mais dinheiro, se bem eu pense que realmente existe quem se oponha. Sobretudo na área estadual.

Espera que a tradução seja feita antes de prosseguir: mesmo na voz blandiciosa de Mirko, parece-lhe rude o idioma, áspero a ouvidos latinos, viciados na sonora plasticidade da língua italiana.

- É preciso mais um empurrão forte, forte. Ou seja mais dinheiro. Quero querer que por fim alcançaremos nosso objectivo.

Enquanto ouve a tradução, o dos olhos baços fita os três directores em sua frente, um a um, repentina luz de aço nas pupilas. Pronuncia umas poucas palavras, o Magnífico traduz:

- É imprescindível que seja onde decidimos.

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