quinta-feira, março 04, 2010


DONA


FLOR


E SEUS


DOIS


MARIDOS



EPISÓDIO Nº 60



Vadinho, numa exigência crescente, reclamava passar uma noite inteira com ela, não mais lhe bastando tê-la a seu lado e possui-la; queria adormecer em sua respiração, dormir em seu sono. Também Flor desejava essa noite completa, essa posse mais além dos limites do relógio, da hora contada e cada vez menor para seu anseio.

- Mas… - disse-lhe uma tarde quando ele novamente reclamou - … se eu passar a noite fora não posso mais voltar para casa…

- E para que voltar? A gente se amarra e acabou-se. Tu é que ainda não quis botar tudo em pratos limpos… Não sei por quê.

- E onde é que vou ficar até ao casamento?

Fixaram-se em tia Lita e tio Porto, a casa do Rio Vermelho era um segundo lar para Flor. Tendo assim resolvido, ele, no dia seguinte, após a aula, trancou-se no quarto e arrumou seus teréns, encheu duas malas e um baú. Depois fechou a porta, pôs a chave na bolsa e saiu dizendo que ia ao mercado de Yansã, na Baixa dos Sapateiros. Ali, Vadinho a esperava com o táxi, mais uma vez Cigano os conduziu mas, dessa vez, só na manhã seguinte retornou a buscá-los.

A uma conhecida, vinda por novidades e costuras, dona Rozilda contou:

- Flor saiu para fazer compras, volta já. Felizmente não fala mais do tipo, anda menos assanhada…

- Acaba esquecendo… É sempre assim…

- Tem de esquecer, queira ou não queira…

A visita demorou-se, a conversar, dona Rozilda contando coisas de uma família recente na ladeira, uma gente de Amargosa.

- Bem, Flor está tardando, vou embora. Lembranças para ela.

Sozinha, dona Rozilda à espera. Primeiro levemente em dúvida, logo inquieta, pela noite sabendo de certeza absoluta que Flor perdera o juízo e fugira de casa. Forçou com um canivete a fechadura do quarto, viu as malas feitas, o baú repleto. A fingida estivera a enganá-la, comportando-se como se houvesse rompido com o canalha, para poder sair desatinada a desgraçar-se.

Dona Rozilda ficou de luz acesa a noite toda, a taça ao alcance da mão. Ah!, se ela tivesse a audácia de voltar…

Quando, no outro dia, antes do almoço, a irmã e o cunhado apareceram, Porto todo cheio de dedos, ela fez uma cena daquelas, arrancando os cabelos, fora de si:

- Não quero saber de nada… Aqui não entra mulher-dama, lugar de puta é em castelo…

Dona Lita subiu nos azeites:

- Faça favor de me respeitar. Flor está em minha casa e minha casa não é castelo. Se você não se importa com a felicidade de sua filha isso é com você. Eu e Thales nos importamos e muito. Vim aqui para lhe dizer que Flor vai se casar. Se você quiser, o casamento sai daqui, tudo direito e em ordem como deve ser. Se você não quiser sai de minha casa e com muito gosto.

- Rapariga não casa se ajunta…

- Escuta mulher…

De nada adiantaram a dialética de tia Lita e a silenciosa presença de tio
Porto.

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