DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
Dele não podia rir nem desconhecer a sua presença; não sendo candidato da galhofa como os demais, ficção de amigas, fuxico de comadres e, sim, realidade plantada ao pé da poste, varando sua sala com os olhos – um passo em frente e ei-lo instalado em casa da viúva e em seus braços. Atrás dela rua afora; no cinema a queimar-lhe, com o hálito e as palavras, a resolução mais firme, acendendo a brasa do desejo.
Dona Flor agora sabe por que, apesar de tanta agitação, trabalho e passatempo, sente-se inútil e vazia, esmorecida. Em torno dela dança o pretendente, “dormirás de madrugada”. Uma dança muito sua familiar, dança de baile e cabaré e não de ingénua roda de ciranda-cirandinha. Mas que dança, essa meu Deus, de onde a conhece dona Flor?
Não importa qual seja nem a música nem a dança, nem a hora nem o lugar: num ímpeto dona Flor arranca o véu do rosto, estende a mão ao noivo, rompe-se a bola de cristal: “Bela morena, não ficarei sozinha, vem, moço pálido, casamos logo, logo, meu fidalgo, meu príncipe encantado”.
E, de súbito, se recorda e sabe. Aquela música é o tango arrabalero que ela dançou mocinha em casa do Major e sete anos depois no Palace Hotel e quem está diante dela não é um rapaz pálido, um suplicante, um pretendente. Esse esvaiu-se no ar, desapareceu junto com a bola de cristal e com dona Dinorá. Quem está diante dela é o finado cuja memória ela não está sabendo honrar. Diante dela, de pé, o seu marido: levanta a mão, indignado, e a esbofeteia. Dona Flor cai sobre o leito de ferro e ele lhe arranca a roupa de viúva e lhe desfolha a grinalda e o véu de noiva, o finado seu marido. Ele a quer nuinha, em pêlo, a peladinha, onde já se viu vadiar vestida? Ah!, tirano mais tirano, tirano mais sem jeito…
Num esforço de desespero, dona flor acorda, a noite em torno e ela em pânico. Miados de gatos em cio nos tetos e quintais, ai sonho mais sem pé e sem cabeça, ai sua paz perdida!
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
EPISÓDIO Nº 140
Dele não podia rir nem desconhecer a sua presença; não sendo candidato da galhofa como os demais, ficção de amigas, fuxico de comadres e, sim, realidade plantada ao pé da poste, varando sua sala com os olhos – um passo em frente e ei-lo instalado em casa da viúva e em seus braços. Atrás dela rua afora; no cinema a queimar-lhe, com o hálito e as palavras, a resolução mais firme, acendendo a brasa do desejo.
Dona Flor agora sabe por que, apesar de tanta agitação, trabalho e passatempo, sente-se inútil e vazia, esmorecida. Em torno dela dança o pretendente, “dormirás de madrugada”. Uma dança muito sua familiar, dança de baile e cabaré e não de ingénua roda de ciranda-cirandinha. Mas que dança, essa meu Deus, de onde a conhece dona Flor?
Não importa qual seja nem a música nem a dança, nem a hora nem o lugar: num ímpeto dona Flor arranca o véu do rosto, estende a mão ao noivo, rompe-se a bola de cristal: “Bela morena, não ficarei sozinha, vem, moço pálido, casamos logo, logo, meu fidalgo, meu príncipe encantado”.
E, de súbito, se recorda e sabe. Aquela música é o tango arrabalero que ela dançou mocinha em casa do Major e sete anos depois no Palace Hotel e quem está diante dela não é um rapaz pálido, um suplicante, um pretendente. Esse esvaiu-se no ar, desapareceu junto com a bola de cristal e com dona Dinorá. Quem está diante dela é o finado cuja memória ela não está sabendo honrar. Diante dela, de pé, o seu marido: levanta a mão, indignado, e a esbofeteia. Dona Flor cai sobre o leito de ferro e ele lhe arranca a roupa de viúva e lhe desfolha a grinalda e o véu de noiva, o finado seu marido. Ele a quer nuinha, em pêlo, a peladinha, onde já se viu vadiar vestida? Ah!, tirano mais tirano, tirano mais sem jeito…
Num esforço de desespero, dona flor acorda, a noite em torno e ela em pânico. Miados de gatos em cio nos tetos e quintais, ai sonho mais sem pé e sem cabeça, ai sua paz perdida!
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