DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
Episódio Nº 135
À tarde o Príncipe retomou firme o seu posto de atalaia, sorridente, os olhos nas janelas. Por duas ou três vezes avistou dona Flor de coquete laço nos cabelos, um bom indício. Naquele dia as alunas estranharam certo nervosismo da professora, de hábito risonha e calma. Tivera uma noite ruim, com insónia, dor de cabeça, palpitações, enxaquecas das piores. Interveio com malícia, dona Dagmar, bonita aluna, turbulenta, sem papas na língua, boquirrota:
- Minha cara, enxaqueca de viúva é falta de homem na hora de dormir. Tem remédio fácil, compra-se com o casamento…
- Casamento, Deus me livre e guarde…
- Também não é obrigatório… Pode tomar o remédio sem casar, o que não falta por aí é homem, minha cara – e ria a tagarela.
Ria-se o curso inteiro, dona Flor sentiu no rosto o mesmo rubor da véspera, como ladra presa em flagrante ou mentirosa desmascarada. Será que, pensando-se em decente recato de viúva, exibia ânsia de homem, pressa de noivo, rueira, fogueteira e oferecida? Por que brincava, rindo com as comadres, em pilhérias sobre candidatos, vidências, cochicheios, a imaginariam doida por manter-se cama com marido ou com amante? Uma injustiça, viúva mais honesta não existia, isenta de culpa por completo.
Passou um dia inquieto, evitando aproximar-se das janelas onde já não se debruçava à vontade para gritar por dona Norma ou por Marilda, pois agora sabia ser ela própria o motivo da presença do indivíduo, e também porque jamais se sentira de tal forma atraída pelas janelas como se de súbito estivesse a rua cheia de novidades excitantes. Uma confusão.
Assim, quando dona Amélia veio convidá-la para ir com ela e seu Ruas assistir a um filme francês muito picante e realista, por isso mesmo de polémico sucesso, aceitou em alvoroço, temerosa de outra longa noite de insónia.
Regressava sempre do cinema a cair de sono, cochilando no bonde. Os bons vizinhos não podiam ter escolhido melhor ocasião para o convite, sem falar no filme, objecto de controvérsia e comentário nos jornais e na vizinhança. Dona Êmina adorara, doutor Ives detestara – pura pornografia! Dona Norma estalava a língua recordando trechos… “tem umas cenas, menina, junto de um lago, em que ele arranca o vestido dela e bota de fora os peitos da bichinha e os dois se agarram e fazem tudo por assim dizer na vista da gente. Eles lá enroscados, ela sem roupa, os peitinhos duros e a molecagem gritando cada coisa…” Marilda, doente por não lhe permitir a censura (nem dona Maria do Carmo) ver o filme, interdito a menores de dezoito anos. Violência fascista contra a juventude.
- Minha cara, enxaqueca de viúva é falta de homem na hora de dormir. Tem remédio fácil, compra-se com o casamento…
- Casamento, Deus me livre e guarde…
- Também não é obrigatório… Pode tomar o remédio sem casar, o que não falta por aí é homem, minha cara – e ria a tagarela.
Ria-se o curso inteiro, dona Flor sentiu no rosto o mesmo rubor da véspera, como ladra presa em flagrante ou mentirosa desmascarada. Será que, pensando-se em decente recato de viúva, exibia ânsia de homem, pressa de noivo, rueira, fogueteira e oferecida? Por que brincava, rindo com as comadres, em pilhérias sobre candidatos, vidências, cochicheios, a imaginariam doida por manter-se cama com marido ou com amante? Uma injustiça, viúva mais honesta não existia, isenta de culpa por completo.
Passou um dia inquieto, evitando aproximar-se das janelas onde já não se debruçava à vontade para gritar por dona Norma ou por Marilda, pois agora sabia ser ela própria o motivo da presença do indivíduo, e também porque jamais se sentira de tal forma atraída pelas janelas como se de súbito estivesse a rua cheia de novidades excitantes. Uma confusão.
Assim, quando dona Amélia veio convidá-la para ir com ela e seu Ruas assistir a um filme francês muito picante e realista, por isso mesmo de polémico sucesso, aceitou em alvoroço, temerosa de outra longa noite de insónia.
Regressava sempre do cinema a cair de sono, cochilando no bonde. Os bons vizinhos não podiam ter escolhido melhor ocasião para o convite, sem falar no filme, objecto de controvérsia e comentário nos jornais e na vizinhança. Dona Êmina adorara, doutor Ives detestara – pura pornografia! Dona Norma estalava a língua recordando trechos… “tem umas cenas, menina, junto de um lago, em que ele arranca o vestido dela e bota de fora os peitos da bichinha e os dois se agarram e fazem tudo por assim dizer na vista da gente. Eles lá enroscados, ela sem roupa, os peitinhos duros e a molecagem gritando cada coisa…” Marilda, doente por não lhe permitir a censura (nem dona Maria do Carmo) ver o filme, interdito a menores de dezoito anos. Violência fascista contra a juventude.
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home