DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
E SEUS
DOIS
MARIDOS
Episódio Nº 175
Por entre olhares e sorrisos doutor Teodoro teve de atravessar com seu passo medido, seu jaquetão azul ou cinzento, sua austera compostura, cruzando ante a janela onde dona Flor respondia com um sorriso breve e gentil ao respeitoso, porém apaixonado, cumprimento do pretendente. Ai!, traidor, sorna e fingido! – diziam olhares e gestos das xeretas.
Permanecendo na mesma distante casa de Itapagipe, já não se apressava ele, no entanto, a tomar o bonde e o elevador apenas cerradas as portas da drogaria: não mais o esperava em nervosa impaciência a mãe entrevada. Deu de almoçar e jantar no restaurante do português Moreira, rondando pelo Cabeça, pelo Maciel, pelo Sodré, como se não pudesse abandonar as redondezas da viúva. Fazia-lhe a corte de longe, sem lhe impor a presença, discreto. Mas como manter-se em discrição, nos limites da reserva, com o comadrio em torno, tropeçando a cada passo numa das beatas, ouvindo insinuações de dona Dinorá?
Doutor Teodoro, homem de atitudes francas, inimigo de fraudes e embuçamentos, sentia-se incómodo; a situação foi-se tornando para ele insuportável. Dona Norma deu-se conta:
- Até faz pena…
Dona Flor sorria com simpatia:
- Pobrezinho…
- Isso não pode continuar assim… Vou dar um jeito…
Dona Norma dispôs-se a uma explicação sincera com o apaixonado farmacêutico, para decidir aquilo de uma vez. A própria dona Flor não escondia estar também interessada, falando dele com afeição, firme na janela na hora do doutor cruzar a rua.
- Vou falar com ele…
- Está louca criatura? Ele vai pensar que eu mandei, que sou uma reles, uma oferecida…
- Não seja tola… Deixe comigo…
Mas não chegou dona Norma a tomar a iniciativa porque, naquela mesma tarde, dona Flor invadiu-lhe a casa, quase sem fôlego, na mão as folhas de uma carta e o envelope. Papel azul com bordas de ouro e perfume de sândalo, um primor. Declaração em regra, frases de galanteio em escorreito português, relação de bens e de qualidades postos uns e outros aos pés da dama, honestas intenções, palavras nobres, e o sopro de uma paixão verdadeira a transbordar dos rectilíneos limites da prudência, fazendo com que aquele documento de um carácter fosse também requisitório de amor, fremente e vivo.
- Supimpa… - disse dona Norma, lendo ávida e entusiasta – um colosso.
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