segunda-feira, dezembro 13, 2010

DONA FLOR
E SEUS DOIS
AMORES


Episódio Nº 292



Contou aqueles impossíveis, sentado em sua frente, Cardoso e S.ª ouviu impávido o relato de espantos. Balançava a cabeça, talvez a confirmar alguma ideia ou antever uma certeza. Por entre as finas gazes do pepineiro e por discreto rabo do olho, Cardoso e S.ª via e comovia-se com um palmo de coxa de Zulmira, atenta à dramática narrativa do rei do jogo. Tal visão carnal não perturbava S.ª, pois a beleza não perturba o sábio, não é imoral nem se opõe ao espírito. Ao demais, descansa a vista.

Vista cansada: seus olhos imateriais viam através do espaço, varavam o tempo, fitos no atrás e no adiante. Quando Pelancchi terminou seu conto de azares sem medida, Cardoso e S.ª já tudo esclarecera, os termos do problema e sua incógnita, tinha resposta e solução:

- São marcianos… - disse, categórico.

Riu em seguida seu riso colossal, como se tudo aquilo não passasse de divertida brincadeira, como senão estivesse custando uma fortuna diária aos cofres de Pelancchi.

Marcianos? Que marcianos?...Seu Cardoso, não me venha com balelas… Confio em você, não me deixe na mão. O que é que os marcianos têm a ver com isso? São meus inimigos, isso sim. É coisa feita. Marciano quem é que já viu, ninguém sabe se existe. Mas feitiço existe, e os espíritos ruins e mau olhado…

Você nunca viu porque é um peso de carne… Os marcianos, já lhe disse… Nem inimigo nem coisa feita… Os marcianos são muito curiosos, vivem bolindo em tudo quanto é máquina, querem tirar a limpo cada coisa, e para eles, mentalidades superiores, não existe nem sorte nem azar…

- Marcianos? – quis saber Zulmira, sempre ávida de aprender – Na terra? Desde quando?

Sobretudo não vamos confundir e comparar Cardoso e S.ª com cartomante ou ocultista desses por aí, aos montes, curvados sobre bolas de cristal, ou com videntes de óptica reduzida, ou com adivinhos de meia pataca, quiromantes chinfrins. Cardoso e S.ª era professor do mistério, um sábio do obscuro, um cientista já muito além da astrofísica e da relatividade.

Faz muito tempo que os primeiros marcianos desembarcaram na terra. Apenas três humanos assistiram ao desembarque…

- O senhor era um dos três?

Sorriu modesto, continuou:

- Um dia desses, eles vão-se mostrar, e aí a humanidade vai levar um choque… - riu sua gargalhada, achando uma graça infinita no susto da humanidade – Por ora são invisíveis… só alguns eleitos…

Zulmira, curiosa de saber:

- O senhor, que pode ver, me diga como eles são. São bonitos?

- Junto a eles nós somos uns bicharocos hediondos.

Ficou absorta a cabrocha, cismarenta, num devaneio.

- Quer dizer, seu Cardoso, que foram os marcianos que me passaram a mão e me beliscaram? Ai, e eles também são disso?

- Disso, o quê? – Solícito, Cardoso pediu detalhes. Que mão, que beliscões e em que pontos da sua anatomia?

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