sexta-feira, janeiro 28, 2011

TEREZA

BATISTA


CANSADA


DE


GUERRA





Episódio Nº 16




Os quatro satisfizeram-se com os tapas, não querendo perder mais tempo; tendo exemplado o larápio, contentes, foram-se embora. Libório também considerou o assunto encerrado e com lucro evidente: em troca de uns tabefes ficar isento do pagamento das dívidas: quem disse!... Pé-de-Mula, ao contrário dos outros tinha todo o tempo livre e, estando em representação da velhinha, não lhe cabia dar quitação ao falso banqueiro.

Que Libório apanhasse, ele estava de acordo, mas que apanhasse e pagasse. Ali mesmo Libório pagou um pedaço, pouco mais de metade, ficando o resto para o dia seguinte. A velhinha não abriu mão do resto, muito ofendida – onde já se viu banqueiro de bicho se recusar a pagar? – exigia o seu dinheiro e com a máxima urgência.

Libório sumiu de novo, de novo vemos o bom Pé-de-Mula à sua procura; uma semana após, por acaso o encontrou em plena Rua do Meio, ou seja, no coração da cidade. Vinha bem do seu, como se não devesse nada a ninguém, a cochichar muito animado ao ouvido de um tabaréu – uma vigarice de pedras falsas – quando deu de caras com o Pé-de-Mula; perdeu a animação e dando-se por vencido, pagou o resto da dívida da tia Milú. A velhinha recebeu até ao último real e com isso deve ter Pé-de-Mula ganho o reino dos céus, pois alguns dias mais tarde morreu num desastre de caminhão em que viajavam para Penedo o time titular e alguns reservas para a disputa de uma partida amistosa.

O caminhão virou no caminho, morreram três, um deles foi Pé-de-Mula, nunca mais no futebol de Sergipe surgiu craque de tão potente tiro nem circulou nas ruas de Aracajú vagabundo de tão mole coração.

Esse estouro da banca do bicho foi a estreia de Libório no mundo dos negócios. Meteu-se depois em quanta falcatrua realizou-se por ali nos últimos vinte anos. Por duas vezes, ante juízes togados, Lulu Santos representara clientes a quem Libório furtara. Um dos casos teve a ver com pedras falsas. Por muito tempo Libório comerciou com diamantes, rubis, esmeraldas, uma pedra verdadeira entre cinquenta imitações e cópias. Lulu perdera o caso por falta de provas. Libório fez-se rico, importante no sub-mundo, na zona, relacionado na polícia, dando propinas a secretas e a guardas, agindo sobretudo entre a gente pobre. Principal fonte de renda: agiotagem, emprestando a juros escorchantes, recebendo em pagamento de dívidas não remidas o que a pessoa possuísse.

Além de agiota metia-se em mil negócios suspeitos. Diziam-no sócio de seu Andrade, proprietário do Vaticano, na exploração de quartos alugados às prostitutas por uma noite ou uma hora; do meio para o fim do mês comprava a baixo preço os ordenados dos funcionários públicos em apertos de dinheiro. Num caso desses, novamente em defesa de um pobre-diabo, Lulu Santos fora segunda vez derrotado por Libório.

Financiador de covis de jogo, de trampolinagens com dados truncados, baralhos marcados, roletas viciadas, Libório comprara por ninharia três meses de ordenado de um funcionário da Prefeitura, bom sujeito mas inveterado jogador, de quem recebera procuração para a devida cobrança. Na ânsia do dinheiro para a roleta, o descuidado solicitante, em vez de escrever de próprio punho a procuração, assinou folha de papel em branco, na qual o escroque dactilografou o que bem quis: ou seja, em lugar de três meses escreveu seis. Não houve como provar a vigarice, pois no documento estava, devidamente reconhecida em cartório, a assinatura do fulano.

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