TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 172
Anteontem ele me disse que aqui, em Estância restaurava as forças, repunha-se das chateações. Não achou que ele estava diferente?
- Para mim, o doutor foi sempre o mesmo desde o primeiro dia.
- Diz para cortar a conversa mas não se contem:
Só posso dizer-lhe que igual a ele não existe outro. Não me pergunte mais.
Reinou silêncio por um instante. Doutor Amarílio suspira, Tereza está com razão, de nada adianta futucar na vida do doutor, dessa vez nem a paz de Estância nem a presença da amiga conseguiram dar-lhe alento ao coração.
- Minha filha, eu entendo o que se passa com você, o que está sentindo. Se dependesse de mim ele ficaria aqui até à hora do enterro e nós, você, eu, mestre João, que realmente lhe quisemos bem, o levaríamos ao cemitério. Só que não depende de mim.
- Eu sei, sempre me coube pouco tempo, não me queixo, não houve um só minuto que não fosse bom.
- Vou tentar me comunicar com os parentes, a filha e o genro estarão em Aracaju. Se o telefone não funcionar, tem que se enviar um próprio com um recado. – Antes de sair informa-se: - É preciso mandar uma pessoa para lavar e vestir o corpo ou Lulu e Nina dão conta?
- Eu cuido dele, por ora ainda é meu.
_ Quando voltar trago o atestado médico e o padre.
Padre para quê se o doutor não tinha fé em Deus? Nem por isso, é bem verdade, deixava de concorrer para as festas da paróquia, nem de levar padre à usina para dizer missa na festa da Senhora Sant’ Ana. Padre Vinícius, tendo estudado Teologia em Roma, aprendera a beber vinho, bom conviva na mesa de jantar.
10
Sob a garrida presidência de Tereza Batista, vestida no capricho com panos trazida da Bahia, o doutor tinha real prazer em reunir em torno da mesa de jantar, além do médico, o amigo Nascimento Filho, seu contemporâneo na Faculdade de Direito, o padre Vinícius e Lulu Santos, vindo especialmente de Aracaju.
Conversavam de um tudo, discutindo política e culinária, literatura, religião e arte, os acontecimentos mundiais e brasileiros, as últimas ideias em debate e a moda cada dia mais escandalosa, a assustadora mudança de costumes e o avanço da ciência.
Sobre certos temas – literatura, arte, culinária – só quase o doutor e João Nascimento opinavam, tendo o clínico horror à arte moderna, garranchos sem arte nem sentido, sendo o padre alérgico à maioria dos escritores contemporâneos, mestres de pornografia e impiedade, afirmando Lulu Santos não existir no mundo prato capaz de comparar à carne-de-sol com pirão de leite, afirmação, aliás, não de todo indefensável.
Em troca, inveterado leitor, frustrado literato, velho bonachão, havendo largado ao meio o curso de Direito para curar-se em Estância de fraqueza do peito, ali se fixando para não mais sair, vivendo de rendas bem administradas, ensinando português e francês no ginásio só para encher o tempo, João Nascimento Filho sabia do último livro e do último quadro e sonhava comer pato laqueado de Pequim. (clik na imagem e aumente)
- Para mim, o doutor foi sempre o mesmo desde o primeiro dia.
- Diz para cortar a conversa mas não se contem:
Só posso dizer-lhe que igual a ele não existe outro. Não me pergunte mais.
Reinou silêncio por um instante. Doutor Amarílio suspira, Tereza está com razão, de nada adianta futucar na vida do doutor, dessa vez nem a paz de Estância nem a presença da amiga conseguiram dar-lhe alento ao coração.
- Minha filha, eu entendo o que se passa com você, o que está sentindo. Se dependesse de mim ele ficaria aqui até à hora do enterro e nós, você, eu, mestre João, que realmente lhe quisemos bem, o levaríamos ao cemitério. Só que não depende de mim.
- Eu sei, sempre me coube pouco tempo, não me queixo, não houve um só minuto que não fosse bom.
- Vou tentar me comunicar com os parentes, a filha e o genro estarão em Aracaju. Se o telefone não funcionar, tem que se enviar um próprio com um recado. – Antes de sair informa-se: - É preciso mandar uma pessoa para lavar e vestir o corpo ou Lulu e Nina dão conta?
- Eu cuido dele, por ora ainda é meu.
_ Quando voltar trago o atestado médico e o padre.
Padre para quê se o doutor não tinha fé em Deus? Nem por isso, é bem verdade, deixava de concorrer para as festas da paróquia, nem de levar padre à usina para dizer missa na festa da Senhora Sant’ Ana. Padre Vinícius, tendo estudado Teologia em Roma, aprendera a beber vinho, bom conviva na mesa de jantar.
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Sob a garrida presidência de Tereza Batista, vestida no capricho com panos trazida da Bahia, o doutor tinha real prazer em reunir em torno da mesa de jantar, além do médico, o amigo Nascimento Filho, seu contemporâneo na Faculdade de Direito, o padre Vinícius e Lulu Santos, vindo especialmente de Aracaju.
Conversavam de um tudo, discutindo política e culinária, literatura, religião e arte, os acontecimentos mundiais e brasileiros, as últimas ideias em debate e a moda cada dia mais escandalosa, a assustadora mudança de costumes e o avanço da ciência.
Sobre certos temas – literatura, arte, culinária – só quase o doutor e João Nascimento opinavam, tendo o clínico horror à arte moderna, garranchos sem arte nem sentido, sendo o padre alérgico à maioria dos escritores contemporâneos, mestres de pornografia e impiedade, afirmando Lulu Santos não existir no mundo prato capaz de comparar à carne-de-sol com pirão de leite, afirmação, aliás, não de todo indefensável.
Em troca, inveterado leitor, frustrado literato, velho bonachão, havendo largado ao meio o curso de Direito para curar-se em Estância de fraqueza do peito, ali se fixando para não mais sair, vivendo de rendas bem administradas, ensinando português e francês no ginásio só para encher o tempo, João Nascimento Filho sabia do último livro e do último quadro e sonhava comer pato laqueado de Pequim. (clik na imagem e aumente)
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