sexta-feira, fevereiro 10, 2012

GABRIELA
CRAVO
E
CANELA



Episódio Nº 19


Ela não tirava os olhos das manchas de batom. Nacib sobressaltou-se: seria que as tinha também no rosto? Provável, muito provável.

- Pois é o que eu sempre digo: homem trabalhador como seu Nacib há poucos em Ilhéus… Até de madrugada…

- E logo hoje – lastimou-se Nacib – com um jantar para trinta pessoas encomendado no bar para amanhã de noite…

Eu nem senti quando o senhor entrou, e olhe que fui dormir tarde, mais de duas da manhã…

Nacib rosnou qualquer coisa, essa Dª. Arminda era a curiosidade em pessoa:

- Por aí… agora quem vai preparar o jantar?

- Um caso sério. Comigo o senhor não pode contar. Dª Elisabeth está esperando a qualquer momento, até já passou o dia. Foi por isso que fiquei acordada, seu Paulo podia aparecer de repente. Além do mais, essa coisa de comida fina não sei fazer…

Dª. Arminda, viúva, espírita, mãe de Chico Moleza, rapazola empregado no bar de Nacib, era parteira afamada: inúmeros ilheenses, nos últimos vinte anos, tinham nascido em suas mãos e as primeiras sensações do mundo a sentirem foram seu activo cheiro de alho e sua face avermelhada de sarará.

- E Dª. Clorinda já teve menino? O Dr. Raul não apareceu no bar ontem…

- Já ontem de tarde. Mas chamaram o médico, esse tal de Dr. Demóstenes. Essas novidades de agora. O senhor não acha uma indecência médico pegar criança? Ver mulher dos outros toda nua? Sem vergonhice…

Para Arminda aquele era um assunto vital. Os médicos começavam a fazer-lhe concorrência, onde já se vira tal descaração, médico a espiar mulher dos outros nua nas dores do parto… Mas Nacib preocupava-se com o jantar do dia seguinte e com os doces e salgados para o bar, problemas sérios criados pela viagem de Filomena:

- É o progresso, Dª. Arminda. Essa velha pintou o diabo comigo…

- Progresso? Descaração é o que é…

- Onde vou arranjar cozinheira?

- O jeito é encomendar às irmãs Dos reis…

- Careiras, arrancam a pele da gente… E eu que já tinha arrumado duas cabrochas para ajudar Filomena…

- O mundo é assim seu Nacib. Quando a gente menos espera é que sucede. Eu, felizmente, tenho o finado 1que me avisa. Ainda outro dia, o senhor nem pode imaginar… Foi uma sessão em casa do compadre Deodoro…

Mas Nacib não estava disposto a ouvir as repetidas histórias de espiritismo, especialidade da parteira.

- Chico já acordou?

- Qual o quê, seu Nacib. O pobre chegou mais de meia-noite.

- Por favor, acorde ele. Preciso tomar providências. A senhora compreende: um jantar para trinta pessoas, tudo gente importante, comemorando a linha de marinetes…

(Na Imagem uma praia de Ilhéus)

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