sábado, maio 19, 2012


GABRIELA
CRAVO
CANELA

Episódio Nº 102


Parêntesis da Advertência

Logo que o coronel trouxera e instalara Glória na cidade – contou João Fulgêncio verdadeiro repositório de sucessos e de histórias de Ilhéus – na melhor de suas casas, aquela onde, antes de mudar-se para a capital, habitava sua família, escandalizando as solteironas, Antoninho Bastos, tabelião, marido de mulher ciumenta e pai de duas lindas crianças, rapaz tão elegante que aos domingos usava colete, o Don Juan da terra, o filho bem-amado do coronel Ramiro Bastos, andara botando olhos compridos na mulata.

Não se tratava da repetição do idílio de Juca Viana e Chiquinha. Já ouvira Josué falar nessa antiga história? Mais tristes do que cómicos era um tanto macabro esse humor ilheense.

No caso recente, não houvera passeios pela praia, nem mãos dadas nas pontes do porto, não se arriscara ainda Tonico a empurrar a porta nocturna de glória. Apenas dera de aparecer pelas tardes, frequentemente em casa da rapariga, com presentinhos de bom-bons comprados no bar do Nacib, a perguntar-lhe pela saúde ou se de algo necessitava. E olhares caídos e palavras açucaradas. Daí não passara ainda mestre Tonico.

Tradicional amizade ligava o coronel Coreolano á família Bastos. Ramiro Bastos baptizara-lhe um filho, eram parceiros políticos, viam-se sempre. Disso aproveitava-se Tonico para explicar à esposa, a gordíssima e ciumentíssima D. Olga, ser obrigado pelos laços de afeição e de interesse político que o ligavam ao coronel, aquelas suspeitas visitas, após o almoço, à casa mal habitada. D. Olga arfava o peito monumental, ameaçava:

 - Se você é obrigado a ir, Tonico, se o coronel lhe pede, vá, por mim não se acanhe. Mas tome sentido! Se eu souber de alguma coisa, ah!,  se eu souber…

_ Nesse caso, filha, pra ficar desconfiada, é melhor eu não ir. Só que prometi a Coreolano…

Língua de mel, esse Tonico como dizia o Capitão. Para D. Olga não havia homem mais puro, pobre dela! Perseguido pelas mulheres todas da cidade, raparigas, moças solteiras, mulheres casadas, marafonas todas elas, sem excepção.

No entanto, por via das dúvidas, para evitar que ele caísse na tentação, trazia-o sob controle. Mal sabia ela…

Assim, com paciência bombons, ia Tonico “preparando a cama onde deitar-se”, como já se murmurava na Papelaria e no bar. Mas antes de suceder o que certamente sucederia, o coronel Coriolano soube das visitas, dos caramelos, dos olhares mortos. Apareceu inesperadamente em Ilhéus, num meio de semana, entrou pela porta da casa de Tonico – onde também estava instalado do cartório, cheio de gente àquela hora.

Antoninho Bastos acolheu o amigo com expressões ruidosas e palmadinhas nas costas, sendo, como era, homem extremamente cordial e simpático. Coriolano deixou agradar-se, aceitou a cadeira, sentou-se, batia com o rebenque nas botas sujas de lama, disse sem elevar a voz:

  - Seu Tonico, chegou aos meus ouvidos que vosmicê está-se bandeando prós lados da casa da minha afilhada. Eu prezo muito a sua amizade, seu Tonico. Lhe vi menino em casa de compadre Ramiro. Por isso vou dar um conselho a vosmicê, conselho de amigo velho: não apareça mais por lá. Eu apreciava também muito Juca Viana, filho do finado Viana, meu companheiro de pocker, vi Juca pequenino também. Vosmicê se lembra do que sucedeu com ele? Coisa de lastimar, coitado, ele foi-se meter com mulher dos outros…

Havia um silêncio aflito no escritório, Tonico gaguejou:

 - Mas, coronel…

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