quinta-feira, maio 10, 2012



GABRIELA

 CRAVO
 E
 CANELA
Episódio Nº 94


Sinhàzinha e Osmundo não veriam os rebocadores e dragas no porto, cavando a barra. Não veriam esses dias de tanto progresso sobre os quais Mundinho falava. Esse mundo é assim, feito de alegrias e tristezas.

Contornou a Igreja, continuou a subir vagarosamente a ladeira. Será mesmo que Tonico Bastos havia dormido com Sinhàzinha? Ou era conversa para impressionar?

Nhô-Galo afirmava que ele mentia descaradamente. Em geral ele não se metia com mulher casada. Rapariga, isso sim, não respeitava dono. Sujeito de sorte. Também com aquela elegância, cabelo prateado, a voz sussurrante. Bem que Nacib gostava de ser como ele, olhado com desejo pelas mulheres, merecendo ciúmes violentos. Ser amado com loucura assim como Lídia, rapariga do coronel Nicodemos, amava Tonico.

Mandava-lhe recados, atravessava ruas para vê-lo, suspirava por ele que nem mais a ligava, farto de tanta devoção. Por ele, Lídia arriscava todos os dias a sua situação, por um olhar, uma palavra sua.

Rapariga, Tonico não respeitava de ninguém, a não ser Glória, todos sabiam porquê. Mas com mulher casada não sabia que ele se metesse.

Enfiou a chave na fechadura, arfando da subida, a sala estava iluminada. Seria ladrão? Ou bem a nova empregada esquecera de fechar a luz?

Entrou de mansinho e a viu dormida numa cadeira, os cabelos longos espalhados nos ombros. Depois de lavados e penteados, tinham-se transformado em cabeleira solta, negra, encaracolada. Vestia trapos, mas limpos, certamente os da trouxa. Um rasgão na saia mostrava um pedaço da coxa cor de canela, os seios desciam ou subiam lentamente ao ritmo do sono, o rosto sorridente.

 - Meu Deus! – Nacib ficou parado sem acreditar. A espiá-la num espanto sem limites, como tanta boniteza se escondera sob a poeira dos caminhos?

Caído o braço roliço, o rosto moreno sorrindo no sono, ali, adormecida na cadeira, parecia um quadro. Quantos anos teria? Corpo de mulher jovem, feições de menina.

 - Meu Deus, que coisa! – murmurou o árabe quase devotamente.

Ao som de sua voz, ela despertou, amedrontada, mas logo sorriu e toda a sala pareceu sorrir com ela. Pôs-se de pé, as mãos ajeitando os trapos que vestia, humilde e clara como um pouco de luar.

 - Porque não deitou, não foi dormir? – tudo o Nacib acertou dizer.

 - O moço não disse nada…

 - Que moço?

 - O senhor… Já lavei roupa, arrumei a casa. Depois fiquei esperando, peguei no sono – uma voz cantada de nordestina.

Dela vinha um perfume de cravo, dos cabelos, talvez, quem sabe do cangote.

 - Você sabe mesmo cozinhar?

Luz e sombra em seu cabelo, os olhos baixos, o pé direito alisando o soalho como se fosse sair a dançar.

 - Sei, sim senhor Trabalhei em casa de gente rica, me ensinaram. Até gosto de cozinhar… - Sorriu e tudo sorriu com ela, até o árabe Nacib deixando-se cair numa cadeira.


( Click na Imagem do Nacib que parece não acreditar na sorte que lhe saiu)

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