GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 158
Onde foi buscar o direito de
mandar aqui ? Nosso direito a gente
conqui stou.
- Tá certo, coronel. Tudo isso tá certo mas é
de outro tempo. A gente vive penando no trabalho, não se dá conta, o tempo vai
passando, as coisas vão mudando. De repente, a gente abre os olhos e tudo tá
diferente.
Tonico, silencioso e
alarmado, escutava. Quase arrependido de ter vindo à sala. No corredor, Jerusa,
dava ordens às empregadas.
- Qual é a diferença? Não tou lhe entendendo…
- Vou dizer a vosmicê. Dantes, era fácil
mandar. Bastava ter força. Governar era fácil. Hoje tudo mudou.
A gente ganhou o mando,
vosmicê já disse, derramando sangue. Ganhou pra garantir a posse das terras,
era preciso. Mas a gente já fez o que tinha que fazer. Tudo cresceu. Itabuna
está tão grande como Ilhéus, Pirangi, Água Preta, Macuco, Guaraci, tão virando
cidades. Tá tudo entupido de doutor, de agrónomo, de médico, de advogado. Tudo
reclamando. Será que a gente ainda sabe mandar, ainda pode mandar?
- E porque está assim, tanto doutor, tanto
progresso? Quem fez? Foi o senhor, coronel, e foi esse seu criado. Não foi
nenhum forasteiro. E agora, que está feito, com que direito se voltam contra
quem fez?
- A gente planta pé de cacau, cuida pra
crescer, colhe os cocos, parte, mete os grãos no cocho, seca nas barcaças, nas
estufas, bota no lombo dos burros, manda pra Ilhéus, vende prós exportadores. O
cacau está seco, cheirando, o melhor do mundo, foi a gente quem fez. Mas será
que a gente pode fazer chocolate, a gente sabe fazer? Foi preciso vir seu Hugo
Kaufmann lá das Europas. E assim mesmo só faz cacau em pó. Vosmicê , coronel,
fez tudo isso. O que Ilhéus tem, o que Ilhéus vale, deve a vosmicê. Deus me
livre de negar, sou o primeiro a reconhecer. Mas vosmicê já fez tudo que sabe,
tudo que pode fazer.
- E o que é que Ilhéus está pedindo além do
que estamos fazendo? O que é que é preciso fazer? Pra falar a verdade, não vejo
essas necessidades. Só o senhor botando dedo em cima para eu enxergar.
- Vosmicê vai enxergar. Ilhéus está bonito que
nem um jardim. Mas Pirangi, Rio do Braço, Água Preta? O povo tá reclamando, tá
exigindo. A gente abriu os caminhos com os trabalhadores, os jagunços. Agora se
precisa de estradas, jagunços não pode fazer.
O pior de tudo é a barra,
essa história do porto. Porque vosmicê ficou contra, coronel Ramiro Bastos?
Porque o Governador pediu? O povo tá todo querendo, é uma grandeza pra terra: o
cacau saindo daqui para o mundo
inteiro. E a gente deixando de pagar transporte para Baía. Quem paga? Os
exportadores e os fazendeiros.
- A gente tem compromissos. Cada um cumpre os
seus. Porque se não cumprir se termina o respeito. Sempre cumpri, o senhor sabe
disso. O governador me pediu, me explicou. Os filhos da gente depois faz o porto,
fora da barra, no Malhado. Tudo tem seu tempo.
- O tempo chegou, vosmicê não quer se dar
conta. No tempo da gente não tinha cinema, os costumes eram outros. Tão mudando
também, é tanta novidade que a gente nem sabe para onde virar.
(Click na imagem e nem peço a atenção para a colocação estratégica da flor...)
(Click na imagem e nem peço a atenção para a colocação estratégica da flor...)
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