CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 186
Quando faltavam apenas
quatro dias para o domingo das eleições, por volta das três horas da tarde, o
navio sueco, cargueiro de tamanho jamais visto naquelas paragens, apitou
majestoso no mar de Ilhéus.
O negrinho Tuísca saíu a
correr com a notícia e a distribuía de graça nas ruas do centro. A população
juntou-se na avenida da praia.
Nem a chegada do bispo foi
assim animada. Os foguetes subiam, estouravam no céu. Apitavam dois baianos no
porto, os búzios das barcaças e lanchas saudavam o cargueiro. Saveiros e canoas
saíram fora da barra, afrontando o mar alto para comboiar o barco sueco.
Atravessou lentamente a
barra, dos seus mastros pendiam bandeiras de todos os países, numa festa de
cores. O povo corria pelas ruas, reunia-se no cais. Formigavam as pontes,
repletas de gente. Veio a Euterpe 13 de Maio tocando a dobrados, Joaqui m no bombo a bater. Fechara o comércio as suas
portas. Feriaram os colégios particulares, o Grupo Escolar, o Ginásio de Enoch.
A meninada aplaudia no
porto, as moças do Colégio das Freiras namoravam nas pontes. Buzinavam
automóveis, caminhões, marinetes. Num grupo, rindo alto, Glória entre Josué e
Ribeirinho afrontando as senhoras.
Tonico Bastos, a
serenidade em pessoa, de braço dado com Dª Olga. Jerusa de luto fechado,
cumprimentava Mundinho. Nilo com seu apito, comandava Terêncio. Traíra, o moço
Baptista. O padre Basílio com seus afilhados. O perneta do Bate Fundo olhando
com inveja Nacib e Plínio Araça. Persignavam-se solteironas, sorriam saltitantes
as irmãs Dos Reis.
No próximo presépio
figuraria o cargueiro. Senhoras da alta-roda, moças casadoiras, mulheres da
vida. Maria Machadão, generala das ruas de canto e dos cabarés. O Doutor
preparando a garganta, as palavras difíceis. Como introduzir Ofenísia em
discurso para navio sueco?
O negrinho Tuísca trepado
no mastro de um veleiro. As pastoras de Dora do terno de reis, Gabriela o
conduzia em passo de dança trouxeram o estandarte. Os coronéis do cacau sacavam
os revólveres, atiravam para o ar. A cidade inteira de Ilhéus no cais.
Numa cerimónia simbólica,
ideia risonha de João Fulgêncio, Mundinho Falcão e Steveson, exportadores,
Amâncio Leal e Ribeirinho, fazendeiros, carregaram um saco de cacau a ser
embarcado directamente de Ilhéus para o estrangeiro. O empolgante discurso do
Doutor, foi respondido pelo Vice-cônsul da Suécia, o comprido agente de
navegação.
À noite, desembarcados os
marinheiros a animação cresceu na cidade. Pagavam-lhes bebidas nos bares.
Levaram o comandante e os oficiais para os cabarés. O comandante quase
carregado em triunfo. Era
um bebedor de trago forte, de experimentada aguardente nos portos dos sete
mares do mundo. Foi conduzido como morto do Bataclan para o navio, nos braços
dos Ilheenses.
No dia seguinte, depois do
almoço, os marinheiros tiveram outra vez folga, espalharam-se pelas ruas. «Como
gostavam de cachaça Ilheense!», comprovavam com orgulho os grapiúnas. Vendiam
cigarros estrangeiros, peças de fazenda, frascos de perfume, bugigangas
douradas. Gastavam o dinheiro em cachaça, enfiavam-se nas casas de
mulheres-damas, caíam bêbados na rua.
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