quarta-feira, janeiro 09, 2013

Gabriela e o gato...

GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 185


Do navio sueco com sereia de amor.

Agora, sim, era completamente feliz. O tempo correra. No próximo domingo realizar-se-iam as eleições. Ninguém duvidava dos resultados, nem mesmo o Dr. Victor Melo aflito em seu consultório no Rio de Janeiro.

Altino Brandão e Ribeirinho já haviam encomendado um jantar monumental ao restaurante do Comércio para uma semana depois, com champanhe e foguetes. Anunciavam-se comemorações grandiosas. Fizera-se uma subscrição, aberta por Mundinho, para comprar e oferecer ao Capitão a casa onde ele nascera e onde habitara Cazuzinha Oliveira, de saudosa memória.

Mas o futuro Intendente teve um gesto magnânimo. Doou o dinheiro ao dispensário para crianças pobres aberto no morro da Conquista pelo Dr. Alfredo Bastos. Nacib pretendia, após as eleições, visitar com Ribeirinho aquelas faladas terras mais além da serra do Baforé. Adquirir um pedaço, contratar a plantação de uma roça de cacau.

Jogava sua partida de gamão, conversava com os amigos, contava histórias da Síria. «Na terra de meu pai é ainda pior!...». Fazia a sesta, a barriga farta, roncando tranquilo.

Ia ao cabaré com Nhô-Galo, dormia com Mara, com outras também. Com Gabriela: todas as vezes que não tinha mulher e chegava a casa sem cansaço e sem sono.

Mais com ela, talvez, do que com as outras. Porque nenhuma se lhe comparava, tão formosa e húmida, tão louca na cama, tão doce no amor, tão nascida para aquilo. Chão onde estava plantado. Adormecia Nacib com a perna passada sobre a sua anca redonda. Como antigamente. Com uma diferença, porém: agora não vivia no ciúme dos outros, no medo de perdê-la, na ânsia de mudá-la.

Na hora da sesta, antes de adormecer, pensava consigo: agora não era senão para a cama, sentia por ela o mesmo que por todas as outras, Mara, Raquel, a ruiva Natacha, sem mais nada a juntar, sem a ternura de outrora.

Assim era bom. Ela ia a casa de Dora, dançava e cantava, combinavam festas para o mês de Maria. Nacib sabia, encolhia os ombros, até projectava assistir. Era sua cozinheira com quem dormia quando lhe dava vontade. E que cozinheira!, melhor não havia. Boa também na cama, mais do que boa, uma perdição de mulher.

Na casa de Dora, Gabriela ria e folgava, a cantar e a dançar. No terno de reis levaria o estandarte. Pularia fogueira na noite santa de São João. Folgava Gabriela, viver era bom. Batia onze horas, voltava para casa a esperar seu Nacib. Talvez fosse noite de ele vir a seu quarto, o cosquento bigode no seu cangaço, a perna pesada sobre a sua anca, o peito macio como um travesseiro.

Em casa apertava o gato contra o rosto, ele miava baixinho. Ouvia Dª Arminda falar dos espíritos e de meninos nascendo. Esquentava o sol nas manhãs sem chuva, mordia goiabas, vermelhas pitangas.

Conversava horas perdidas com seu amigo Tuísca, agora estudante para carpina. Corria descalça na praia, os pés na água fria. Dançava roda com as crianças na praça, de tarde. Esperava o luar esperando Nacib. Viver era bom.

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