Já não teria 18 anos mas ainda era um jovem... |
Jorge Amado
Nasceu em 1912, em Itabuna, no Sul do
Estado da Baía e, como dizia sua mãe, «com a estrela»: um homem afortunado. O
seu pai queria que ele fosse doutor e ser doutor, naqueles tempos, era
formar-se em Medicina, Engenharia ou Direito.
Jorge Amado, que desde os catorze anos
participava em movimentos culturais e políticos, optou por Direito, fazendo a
vontade ao pai mas nunca foi buscar o diploma nem exerceu a advocacia.
Em compensação, no ano da sua
licenciatura, em 1935, já era um escritor conhecido, autor de quatro livros, um
dos quais, o primeiro, «O País do Carnaval» que escolhi agora para transcrever
no Memórias Futuras.
Tem o aliciante de ser o primeiro e revelar
o escritor aos dezoito anos de idade e a sociedade brasileira no início da década
de 30.
Augusto Frederico Schmidt, poeta
brasileiro, que fundou em 1930
A Livraria Católica e posteriormente Livraria Schmidt
Editora, ponto de encontro dos intelectuais modernistas da época e responsável
por ter dado a conhecer ao mundo escritores de peso, tais como, Vinícius de
Morais, Gilberto Freyre, entre outros… e, claro, Jorge Amado, escreveu-lhe uma carta após ter recebido o manuscrito, queixando-se de o ter lido
rapidamente embora o pouco tempo passado com os seus personagens tivesse sido
suficiente para reconhecê-los todos, um por um.
E disse mais nessa carta de muito revelador:
- "Seu livro é um forte documento daqui lo que somos hoje, nós, mocidade brasileira,
mocidade sem solução, fechada em si mesma, perdida numa terra que nos dá a todo
o momento a impressão de que sobramos, de que somos demais.
Seu livro acordou em mim
velhas revoltas já sufocadas e recalcadas contra a vida e a terra em que
vivemos. Paulo Rigger, seu personagem, não é um cerebral, não é um filho do
ocidente saturado e exasperado de cultura, é apenas um pobre moço brasileiro,
como eu, como você, como todos nós.
… Eu, um pouco mais velho que
você, já me sinto muito distante de tudo, num desinteresse sempre crescente,
pelo que alimentou o meu gosto pela vida. Não temos frescura, nem nos podemos
repousar nos bons silêncios. Viemos para gritar que existimos, diante de uma
nação adormecida e indiferente. Cansamos porém logo e assistimos com melancolia
à vinda dos que ainda acreditam que é possível gritar, que é útil gritar.
… O país em que nascemos pesa
sobre nós. Basta olhar para o Brasil de hoje, no seu aspecto político, por
exemplo, para termos uma ideia do drama que se está passando aos nossos olhos.
O caos de todos os lados. A mocidade não tem um sentido, não tem uma direcção,
não tem uma causa. A única aspiração da nossa mocidade é a velhice.
… Seu livro tem grande
importância porque como você mesmo diz os seus defeitos constituem o seu maior
motivo de orgulho. Não sei de outro romance nosso que trouxesse à tona como o
seu, na indecisão das suas linhas de composição, tal complexidade de problemas.
Seus personagens estão. E
procuram. Não procuram apenas o sentido da pátria, da terra, mas procuram o
sentido de si próprios. No geral, todos os romances brasileiros são cenários
por vezes belos e verdadeiros mas sempre cenários. E será exactamente
deficiência de cenário que verificamos n’ «O País do Carnaval». Qualidade e
defeito do seu livro. Qualidade que eu amo.
….
Um abraço do
Augusto Frederico Schmid
Amanhã transcreveremos uma
EXPLICAÇÃO prévia de Jorge Amado para o livro que acabara de escrever e que me
pareceu também muito interessante. Depois, como sempre temos feito, episódio após
episódio, para termos tempo de digerir a história e conhecermos bem os seus
personagens, ponto forte dos romances de Jorge Amado, dar-vos-emos a conhecer
«O País do Carnaval», primeiro romance de Jorge Amado escrito aos 18 anos de
idade… o que nos permite concluir que os génios da literatura, ou de qualquer
outra forma de arte, nascem, não se fazem, quando muito afinam e refinam ao
longo das suas vidas como a própria vida.
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