BAIANA |
O PAÍS
DO
CARNAVAL
Episódio Nº 13
Pedro Ticiano tinha dessas
maldades, às vezes. Antes de o conhecer, Jerónimo vivia sereno, sem problemas,
a paz dos que não pensam nem se esforçam por pensar. Mas Ticiano, que se lhe
afigurava um deus, tirara-lhe a calma.
Jerónimo, hoje, tornara-se
insatisfeito, cheio de dúvidas, sem encontrar a sua estrada na vida. Ticiano
tirou-lhe a ideia de Deus e burlava do seu patriotismo. Jerónimo chegou a ser
um joguete em suas mãos. E ele brincava com aquela alma, moldando-a à sua
vontade.
E sorria ao imaginar que a
felicidade ou infelicidade daquele homem dependia dele. O mais estranho de
todos esses rapazes era, entretanto, José Lopes. Formado há muito pouco tempo,
já o consideravam grande talento.
Ao contrário de Ricardo Vaz
não fazia a literatura de frases de espírito e de paradoxos. Estava
inteiramente integrado no espírito de seriedade da geração que aparecia.
Discutia muito com Ricardo
que afirmava ser a cultura prejudicial. Ninguém devia ler para fazer cultura.
Eu – esganava-se – leio por prazer de espírito. Leio hoje uma obra de Anatole.
Agrada-me. Amanhã tenho duas obras a escolher, uma de Anatole, outra de Unamuno.
Lerei Anatole que eu sei irá me dar prazer.
Eu leria Unamuno –
contestava José Lopes.
- E você, Ticiano?
- Eu hoje só leio humorismo… É o género mais
trágico da literatura. Como também só vou ao cinema quando passam filmes de
Carlitos. São os únicos que me comovem.
José Lopes irritava-se às
vezes com as blagues dos amigos. Achava que era preciso combater a literatura
de frases, de endeusamento do cepticismo. Fazer obra séria. Realizar qualquer
coisa. Encontrar um caminho na vida.
- É preciso uma filosofia… – dizia ao Gomes,
andando pelas ruas da cidade.
Ricardo Braz, de quem o
sofrimento fizera um materialista, ironizava.
- Por que você não adere ao tomismo?
- Quem sabe? Eu sou um ateu místico… Um
dissociado mas um insatisfeito.
José Lopes sentia que não
realizaria coisa alguma. Terrivelmente sentimental, não podia apartar-se dos
amigos que haviam substituído a família que ele não possuía. Não conseguira a
libertação que era preciso para a procura da felicidade.
- Você é o tipo do bom esposo – dizia-lhe
Ricardo.
- Pode ser, mas não me casarei. Se me casasse
tenho a certeza, minha mulher me enganaria. Nasci para esposo traído…
E no canto dos lábios,
apertava um sorriso cheio de amargura.
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