segunda-feira, fevereiro 04, 2013

BAIANA

O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 13


Pedro Ticiano tinha dessas maldades, às vezes. Antes de o conhecer, Jerónimo vivia sereno, sem problemas, a paz dos que não pensam nem se esforçam por pensar. Mas Ticiano, que se lhe afigurava um deus, tirara-lhe a calma.

Jerónimo, hoje, tornara-se insatisfeito, cheio de dúvidas, sem encontrar a sua estrada na vida. Ticiano tirou-lhe a ideia de Deus e burlava do seu patriotismo. Jerónimo chegou a ser um joguete em suas mãos. E ele brincava com aquela alma, moldando-a à sua vontade.

E sorria ao imaginar que a felicidade ou infelicidade daquele homem dependia dele. O mais estranho de todos esses rapazes era, entretanto, José Lopes. Formado há muito pouco tempo, já o consideravam grande talento.

Ao contrário de Ricardo Vaz não fazia a literatura de frases de espírito e de paradoxos. Estava inteiramente integrado no espírito de seriedade da geração que aparecia.

Discutia muito com Ricardo que afirmava ser a cultura prejudicial. Ninguém devia ler para fazer cultura. Eu – esganava-se – leio por prazer de espírito. Leio hoje uma obra de Anatole. Agrada-me. Amanhã tenho duas obras a escolher, uma de Anatole, outra de Unamuno. Lerei Anatole que eu sei irá me dar prazer.

Eu leria Unamuno – contestava José Lopes.

 - E você, Ticiano?

 - Eu hoje só leio humorismo… É o género mais trágico da literatura. Como também só vou ao cinema quando passam filmes de Carlitos. São os únicos que me comovem.

José Lopes irritava-se às vezes com as blagues dos amigos. Achava que era preciso combater a literatura de frases, de endeusamento do cepticismo. Fazer obra séria. Realizar qualquer coisa. Encontrar um caminho na vida.

 - É preciso uma filosofia… – dizia ao Gomes, andando pelas ruas da cidade.

Ricardo Braz, de quem o sofrimento fizera um materialista, ironizava.

 - Por que você não adere ao tomismo?

 - Quem sabe? Eu sou um ateu místico… Um dissociado mas um insatisfeito.

José Lopes sentia que não realizaria coisa alguma. Terrivelmente sentimental, não podia apartar-se dos amigos que haviam substituído a família que ele não possuía. Não conseguira a libertação que era preciso para a procura da felicidade.

 - Você é o tipo do bom esposo – dizia-lhe Ricardo.

 - Pode ser, mas não me casarei. Se me casasse tenho a certeza, minha mulher me enganaria. Nasci para esposo traído…

E no canto dos lábios, apertava um sorriso cheio de amargura.


Paulo Rigger ligara-se a eles. Aparecia agora todas as noites para a conversa. O “jornal falado” como chamava Ticiano. Interessava-se pelo movimento literário da cidade. Fizera dos inimigos de Ticiano seus inimigos e dos amigos, seus amigos.

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