DO
CARNAVAL
Episódio Nº 81
Lia os jornais. Rapazes
fundavam legiões fascistas, o partido comunista tomava vulto. Materialistas e
católicos discutiam decretos do Governo, tocantes ao ensino.
A insatisfação notava-se
nas colunas dos jornais, a dúvida pesava na face dos moços.
- Acho que vai haver uma grande desgraça…
Os diários noticiavam que
o povo corria ao interior de Minas gerais onde uma Santa curava. Minúcias.
Detalhes voluptuosamente lidos.
Paulo Rigger tinha vontade
de esganar a todos. Por que não se tornavam felizes. Não esqueciam problemas?
Não esqueciam tudo? Não ficavam muito bons? Ele qui sera
ser bom. Ajudar a todos. Não podia. Odiava os semelhantes. Não lhes perdoava a
imbecilidade…
Eu fui o aventureiro da
Felicidade… Pobre D. Quixote!
- Que dia o Senhor escolheu para viajar,
patrão… Domingo de Carnaval…
E o preto carregador
lamentava. Ele não ouvia, ensimesmado, soturno. Desceu. Chamou um táxi.
- Leve-me ao porto.
- A que horas quer estar lá, senhor?
- Dentro de quarenta minutos.
-Impossível -
declara o chofer. Em dia de carnaval leva-se horas e horas a atravessar
a Avenida.
- Leve-me até onde puder. Irei a pé o resto do
caminho…
Saltou do automóvel e
começou a evitar a multidão alucinada. Sambava-se nas ruas. Paulo Rigger com o
chapéu amassado nas mãos, cabelo revolto, olhos abertos, enraivecido, ia
abrindo caminho a socos e cotoveladas.
- Sai, diabo!
- Eh, meu branco, vamos sambá…
A mulata puxou-o. Os
umbigos uniram-se. Ela dobrou-se, voluptuosa.
- Deixe-me, negra!
- Arrancou dali, a romper a massa.
Afinal, talvez este povo
esteja com razão. No carnaval talvez esteja tudo…
- Com que roupa?...
E a mocinha histérica
jogava-lhe lança-perfumes.
- Vá para o diabo que a carregue!
E notava-se ainda mais infeliz.
Quando chegara da Europa, todo instinto, sabia sentir a carne. Hoje, era dúvida
unicamente…
Alcançou o navio no último
momento. Poucos passageiros, ingleses e argentinos a admirar a cidade que se
vestia de treva.
A noite se apossara do Rio
de Janeiro. Paulo Rigger no tombadilho, comparava a cidade carnavalesca,
envolta em trevas, à sua alma.
De repente, fez-se luz na
cidade, que apareceu brilhante, livre das trevas. O navio afastava-se
vagarosamente…
Paulo Rigger, nervoso,
lábios apertados, olhou. No Corcovado, Cristo, braços abertos, parecia abençoar
a cidade pagã.
Tornou-se maior a tristeza
nos olhos de Paulo Rigger. Levantou os braços num gesto de supremo desespero e
murmurou fitando a imagem gigantesca:
- Senhor, eu quero ser bom! Senhor, eu quero
ser sereno…
Lá longe, desaparecia
lentamente o País do Carnaval
FIM
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