quarta-feira, abril 24, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 81

Lia os jornais. Rapazes fundavam legiões fascistas, o partido comunista tomava vulto. Materialistas e católicos discutiam decretos do Governo, tocantes ao ensino.

A insatisfação notava-se nas colunas dos jornais, a dúvida pesava na face dos moços.

 - Acho que vai haver uma grande desgraça…

Os diários noticiavam que o povo corria ao interior de Minas gerais onde uma Santa curava. Minúcias. Detalhes voluptuosamente lidos.

Paulo Rigger tinha vontade de esganar a todos. Por que não se tornavam felizes. Não esqueciam problemas? Não esqueciam tudo? Não ficavam muito bons? Ele quisera ser bom. Ajudar a todos. Não podia. Odiava os semelhantes. Não lhes perdoava a imbecilidade…

Eu fui o aventureiro da Felicidade… Pobre D. Quixote!


 - Que dia o Senhor escolheu para viajar, patrão… Domingo de Carnaval…

E o preto carregador lamentava. Ele não ouvia, ensimesmado, soturno. Desceu. Chamou um táxi.

 - Leve-me ao porto.

 - A que horas quer estar lá, senhor?

 - Dentro de quarenta minutos.

 -Impossível -  declara o chofer. Em dia de carnaval leva-se horas e horas a atravessar a Avenida.

 - Leve-me até onde puder. Irei a pé o resto do caminho…



Saltou do automóvel e começou a evitar a multidão alucinada. Sambava-se nas ruas. Paulo Rigger com o chapéu amassado nas mãos, cabelo revolto, olhos abertos, enraivecido, ia abrindo caminho a socos e cotoveladas.

 - Sai, diabo!

 - Eh, meu branco, vamos sambá…

A mulata puxou-o. Os umbigos uniram-se. Ela dobrou-se, voluptuosa.

 - Deixe-me, negra!

 - Arrancou dali, a romper a massa.

Afinal, talvez este povo esteja com razão. No carnaval talvez esteja tudo…

 - Com que roupa?...

E a mocinha histérica jogava-lhe lança-perfumes.

 - Vá para o diabo que a carregue!

E notava-se ainda mais infeliz. Quando chegara da Europa, todo instinto, sabia sentir a carne. Hoje, era dúvida unicamente…

Alcançou o navio no último momento. Poucos passageiros, ingleses e argentinos a admirar a cidade que se vestia de treva.

A noite se apossara do Rio de Janeiro. Paulo Rigger no tombadilho, comparava a cidade carnavalesca, envolta em trevas, à sua alma.

De repente, fez-se luz na cidade, que apareceu brilhante, livre das trevas. O navio afastava-se vagarosamente…

Paulo Rigger, nervoso, lábios apertados, olhou. No Corcovado, Cristo, braços abertos, parecia abençoar a cidade pagã.

Tornou-se maior a tristeza nos olhos de Paulo Rigger. Levantou os braços num gesto de supremo desespero e murmurou fitando a imagem gigantesca:

 - Senhor, eu quero ser bom! Senhor, eu quero ser sereno…

 Lá longe, desaparecia lentamente o País do Carnaval


FIM



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