quinta-feira, maio 16, 2013


JUBIABÁ

Episódio Nº 17


E continuava a tirar linhas invisíveis. Mas se lhe perguntavam alguma coisa sobre quem teria sido aquele espírito, Augusta nada dizia. Ficava olhando ao longe, o seu sorriso triste E as mulheres diziam:

 - Augusta é pancada que sofreu muito… Vida triste a dela…

- Mas o que foi que ela teve?

 - Cala a boca… Cada qual sabe da sua vida…


Foi Augusta das Rendas quem primeiro viu o lobisomem que apareceu no morro. Era por uma noite sem lua, quando a escuridão dominava nos becos enlameados do morro e só raros fifós brilhavam nas casas.

Noite assombrada, noite para ladrões e assassinos. Augusta vinha pela ladeira quando ouviu no mato um ronco de estremecer. Olhou e viu os olhos de fogo do lobisomem.

Até nem acreditava muito em histórias de lobisomens e mulas e mulas de padre. Mas daquela vez, ela tinha visto com os seus olhos. Largou o cesto onde levava as rendas e disparou numa carreira até a casa de Luísa.

Contou a novidade com grandes gestos de espanto, a voz ainda engasgada, os olhos desta vez esbugalhados, as pernas tremendo da carreira.

- Beba um gole de água – ofereceu Luísa.

 - É bom para passar o susto… – agradecido.

António Balduíno ouviu e tratou de espalhar a notícia.

Dentro em pouco todo o morro sabia que tinha aparecido um lobisomem e na noite seguinte mais três pessoas viram o monstro: uma cozinheira que voltava do trabalho, Ricardo tamanqueiro e Zé Camarão que jogara o punhal no bicho que deu uma grande gargalhada e se meteu nos matos.

E nas noites que se seguiram os demais moradores do morro foram vendo a assombração que ria e fugia. E o medo tomou conta do morro, fechavam-se cedo as portas, as pessoas não saíam à noite.

Zé Camarão propôs que fizessem uma batida para pegar o bicho, porém poucas pessoas tiveram coragem. Só mesmo o negrinho António Balduíno exultou com a proposta e escolheu pedras pontiagudas para o seu bodoque.

As notícias do lobisomem continuavam. Luísa viu a sua sombra num dia em que voltava mais tarde. Pedro levara uma carreira do bicho.

O morro vivia inquieto e só falava naquilo. Até um homem do jornal apareceu e tirou fotografias. De tarde saiu a notícia dizendo que não tinha lobisomem nenhum, que era invenção do pessoal do morro do capa Negro.

Seu Lourenço da venda comprou o jornal mas ninguém acreditou no que ele dizia porque tinham visto o lobisomem e lobisomem foi coisa que sempre existiu. Os meninos comentavam o caso no intervalo das carreiras:

 - Mamãe me disse que é menino ruim que vira lobisomem… menino que faz maldade.

 - É sim. Cresce as unhas e depois vira lobisomem numa noite de lua grande.

António Balduíno se entusiasmou:

 - Vamos virar lobisomem?

 - Vire você que quer ir para o inferno...

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