sábado, maio 25, 2013


JUBIABÁ

Episódio Nº 25



Tão velha como a negra anciã que morava na casa mais negra e dava aos moleques, com gestos maternais, tostões para comprar cocada, e passava o dia pitando um cachimbo de barro, murmurando palavras que ninguém entendia.

A rua encurvava e as casas ruiriam breve. O silêncio é de morte. Desce do morro, sobe das pedras.

A Travessa Zumbi dos Palmares agonizava! Uma vez um casal de noivos veio ver uma casa para alugar. Casa confortável e quieta. A noiva disse, porém:

 - Não, não quero. Essa rua parece um cemitério…


Dois sobrados na esquina, um defronte do outro. O resto da rua era formada por casinhas baixas, escuras, e um ou outro sobrado que já tinha perdido a cor e nos quais morava uma legião de homens trabalhadores.

Os sobrados da esquina, se bem antigos, eram, no entanto grandes e formosos. No da direita morava uma família que tinha um desgosto muito grande, a perda de um filho, que morrera assassinado.

Viviam recolhidos, não apareciam nunca nas janelas que estavam eternamente trancadas, e traziam sempre luto fechado.

Quando, por acaso uma janela se abria, podia se ver na sala de visitas, um quadro enorme que era o retrato de um jovem louro, fardado de tenente.

Tinha um sorriso provocador nos lábios finos e uma flor na mão alva. O sobrado tinha uma varanda e nesta varanda uma moça loira vestida de preto. Lia um livro de capa amarela e jogava níqueis para António Balduíno.

Todas as tardes vinha um moço bonito e passeava em toda a extensão da rua. Assobiava baixinho até que a moça o via. Então ela se levantava e vinha para o gradeado da varanda onde ficava sorrindo.

O rapaz, elegante, passava várias vezes, cumprimentava, sorria e antes de ir embora tirava um cravo da botoeira e, após beijá-lo, jogava-o na varanda.

A moça o apanhava rápida, um sorriso nos lábios, o rosto escondido na mão livre. Metia o cravo vermelho no livro de versos e dava um adeusinho com a mão.

O moço ia embora e voltava no outro dia.

 Ela jogava um níquel para o negrinho que estava lá em baixo e era a única testemunha desse amor.

Defronte ficava o sobrado do Comendador. Gansos passeavam no jardim florido e mangueiras cresciam na alameda que ficava ao lado da casa.

O Comendador comprara aquilo barato nos bons tempos, “uma verdadeira pechincha”, como dizia aos domingos depois que dava uma volta no jardim e ia deitar no quintal ao fundo.

Morava ali há muitos anos, desde que começara a enricar, e talvez gostasse daquela casa velha de tantos quartos na travessa sem movimento.

António Balduíno é que ficou espantado com o tamanho da casa. Nunca vira coisa igual. No Morro do Capa Negro as casas eram pequenas, de barro batido, portas de caixão, cobertas de zinco.

Tinham duas divisões apenas: a sala de jantar e o lugar onde dormiam. Mas o sobrado do Comendador, não. Como era grande, quantos quartos tinha, alguns até fechados, um quarto de hóspedes sempre mobilado esperando alguém que nunca vinha, salas enormes, cozinha bonita, a latrina melhor que qualquer casa do morro!

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