Jubiabá era o líder de todos os negrinho de rua da Baía. |
JUBIABÁ
Episódio nº 32
Só ele é dono da cidade
porque só ele a conhece toda, sabe de todos os seus segredos, vagabundeou em
todas as suas ruas, se meteu em quanto barulho houve, em quanto desastre
aconteceu em sua cidade.
Ele fiscaliza a vida da
cidade que lhe pertence. Esse é seu emprego. Olha todos os seus movimentos,
conhece todos os valentes da cidade, vai às festas líricas, recebe e embarca os
viajantes de todos os navios.
Sabe o nome de todos os
saveiros e é amigo dos canoeiros que pousam no Porto da Lenha. Come a comida
dos restaurantes mais caros, anda nos automóveis mais luxuosos, mora nos mais
novos arranha-céus. E pode se mudar a qualquer momento. E como é dono da cidade
não paga a comida, nem o automóvel, nem o apartamento.
Solto na cidade dos
sobrados enormes, ele a dominou e se tornou seu dono. Os homens que passam não
sabem disso com certeza. Nem olham para o negrinho esfarrapado que fuma um
cigarro barato e traz um boné em cima dos olhos.
As mulheres elegantes lhe
dão um níquel, o evitam para não se sujarem ao seu contacto.
Mas na verdade o negro
António Balduíno é o Imperador da cidade negra da Baía. Um Imperador de qui nze anos, risonho e vagabundo. Talvez nem o
próprio António Balduíno o saiba.
Traz um boné em cima dos
olhos e fuma um cigarro barato. Uma calça de casimira preta, rasgada e cheia de
manchas, e um paletó enorme, herdado de alguém muito mais alto do que ele,
paletó que no inverno é transferido a sobretudo, tal é a vestimenta do
Imperador da cidade.
E aqueles outros negros
que o rodeiam são seus súbitos mais queridos, a sua guarda de honra. Guarda que
não tem farda especial, veste trapos, calça chinelos abandonados nas latas de
lixo, mas que sabe lutar como nenhuma outra guarda do mundo.
O Imperador tem uma grande
figa amarrada ao pescoço. E ele e os moleques da sua guarda trazem escondido no
cós da calça, navalhas, punhais e canivetes.
António Balduíno se
adianta:
- Uma esmola por amor de Deus…
O homem gordo mede o negro
de cima a baixo com os olhos ávidos de um homem de negócios, abotoa o paletó,
abana a cabeça ironicamente:
- Um pedaço de homem desses a pedir esmola!
Vai trabalhar, vagabundo… Não tem vergonha… Vá trabalhar…
António Balduíno primeiro
passa os olhos pela rua. Está muito movimentada. Então diz:
- Eu cheguei de fora, meu senhor… Vim me
batendo por este sertão de Deus que está seco, sem um pingo de chuva. Estou aqui sem trabalho… Mas estou procurando… Quero um
níquel para tomar café… Tá se vendo que o senhor é um homem direito…
Espia o efeito do homem.
Mas o homem vai andando:
- Já estou acostumado com essas mentiradas… Vá
trabalhar…
- Juro pelo sol que nos está alumiando que não
é mentira. Vim debaixo de um solão de fazer medo… Se o senhor tem um trabalho
eu pego. Não tenho medo do trabalho… Mas desde ontem que não como… Estou aqui caindo de fome. O senhor é um homem direito…
O homem faz um gesto
aborrecido, mete a mão no bolso e joga um níquel.
- Não me aborreça mais…
Vá embora…
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