quinta-feira, julho 18, 2013

JUBIABÁ

Episódio Nº 62


Mas o Gordo foi logo embora, pois o Gordo morava longe com a sua avó, uma velha octogenária, de cavanhaque, que há muito tempo perdera a noção da realidade e vivia num mundo diferente, contando casos que atrapalhava com outros, misturando as figuras, sem chegar jamais ao fim da história.

Em verdade ela não era avó do Gordo coisa nenhuma. O Gordo é que tinha inventado aquilo com vergonha de ter recolhido e sustentado aquela velha que antes andava solta na cidade.

Mas fazia como se ela fosse sua avó, levando-lhe comida, conversando horas e horas com ela, se recolhendo cedo para que a velha não ficasse sozinha.

Às vezes encontrava o Gordo com um corte de fazenda e pensavam que ele ia levar para alguma cabrocha faceira.

 - É pra minha avó, coitadinha… Ela gasta muita roupa porque se deita no chão sujo. Já está caduca…

 - Ela é sua avó por parte de mãe ou de pai, Gordo?

O Gordo se atrapalhava. Os outros bem sabiam que o Gordo nunca conhecera pai e mãe. Mas o Gordo tinha uma avó e muitos o invejavam.


Depois que o Gordo se despediu, António Balduíno e Joaquim vieram descendo a Ladeira da Montanha, assobiando um samba.

A ladeira estava deserta e silenciosa. Unicamente numa janela pobre, iluminada por um fifó, uma mulher estendia fraldas de recém-nascido. E ouviam a voz de um homem que falava dentro
do quarto:

 - Filhinho… Filhinho…

Joaquim disse:

 - Aquele amanhã vai dormir no trabalho… Tá fazendo de ama seca.

António Balduíno não respondeu nada. Joaquim continuou.

 - Não adiante… Pra quê?

 - O quê?

 - Nada… nada…

António Balduíno perguntou:

 - Você já reparou como o Gordo é bom?

 - Bom? – Joaquim não tinha reparado…

 - Bom, sim. É um sujeito bom. Ele tem o olho da piedade bem aberto. – Chegou a vez de Joaquim ficar calado. Logo após soltou uma gargalhada:

 - E de que você está rindo?

 - Nada. É que eu vi agora que o Gordo é um sujeito bom.

Continuaram a descida calados. António Balduíno revia a cena da macumba, o homem calvo que viajara o mundo todo.


O homem tinha ido embora, a verdade é que o homem tinha fugido. António Balduíno pensava que aquele homem fosse Pedro Malazarte. Mas ele tinha fugido quando vira que os negros estavam envergonhados.

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