«Lanterna dos Afogados» |
JUBIABÁ
Episódio Nº 77
Mas não via nada porque
voltou a claridade perturbadora da lua e os sons morriam nas ladeiras, nos
becos sem iluminação, nas ruas calçadas de pedra.
Com os últimos sons de
batuque e o brilho atordoante do luar ele se achou diante do rosto sardento de
Lindinalva.
Estava linda e sorria.
Fazia desaparecer o batuque e o ódio.
António Balduíno passou a
mão pelo rosto para afastar a visão que o acordava e olhou fixo para o outro
lado. Enxergou novamente as luzes dos saveiros e Mestre Manuel que andava pelo
cais.
Mas no meio das luzes
estava Lindinalva bailando. Tudo porque ele perdera a luta e estava
desmoralizado.
Fechou os olhos e quando
os abriu só conseguiu ver a luz da triste, da pequena lâmpada da “Lanterna dos
Afogados”.
UMA TOADA TRISTE QUE VEM
DO MAR
A luz da “Lanterna dos
Afogados” brilha como um convite. António Balduíno deixa o cais, levanta-se da
areia que o acaricia e se dirige em grandes passadas para o botequi m.
A lâmpada de poucas velas
mal ilumina a tabuleta que traz o desenho de uma mulher bonita com corpo de
peixe e seios duros. Por cima uma estrela pintada com tinta vermelha, derrama
sobre o corpo virgem da seria uma luz clara que a torna misteriosa e difusa.
Ela retira da água um
suicida. E por baixo o nome:
«LANTERNA DOS AFOGADOS»
De dentro vem um grito:
- É você, Baldo?
- Sou eu mesmo, Joaqui m!
Lá estão numa das mesas
sebentas o Gordo e o Joaqui m. Joaqui m grita da mesa, as mãos postas em cima dos olhos
para ver melhor à luz vacilante do poste:
- Entra, Jubiabá está aqui …
Na sala pequena, quase
envolta na escuridão, cinco ou seis mesas onde canoeiros, mestres de saveiros,
e marinheiros bebem. Copos grossos cheios de cachaça. Um cego toca um violão
mas ninguém o ouve.
Numa mesa, marinheiros
alvos e louros, alemães de um cargueiro que carrega no porto, bebem cerveja e
cantam embriagados. Duas ou três mulheres que nesta noite desceram da Ladeira
do Taboão para a «Lanterna dos Afogados» estão com eles.
Riem muito mas têm um ar
espantado pois não entendem a canção. Os marinheiros estão abraçados e beijam
as mulheres. Em baixo da mesa inúmeras garrafas de cerveja vazias.
António Balduíno passa por
junto deles e cospe. Um marinheiro levanta um copo. António Balduíno se prepara
para brigar. Num canto, o cego geme no violão e ninguém o escuta.
António Balduíno se lembra
que Jubiabá está no botequi m, baixa
o braço e vai se sentar junto do Gordo e de Joaqui m.
- Cadê Jubiabá?
- Está lá dentro com seu António rezando à
mulher dele. Seu António é um português velho, amigado com uma mulata com cara
furada de bexiga. Um garoto pálido serve as mesas, correndo.
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